24 de agosto de 2021
08:08
Iury Lima – Da Cenarium
VILHENA (RO) – A nova pesquisa da série MapBiomas, em formato inédito, divulgada nesta segunda-feira, 23, escancarou quão preocupante é a situação hídrica do Brasil. Os dados apontam que o País, considerado a maior reserva hidrológica do mundo (com 5,661 bilhões de metros cúbicos), secou 15,7% desde o início dos anos 1990 e que a tendência é perder cada vez mais água.
O levantamento sobre a situação da água teve apoio do WWF-Brasil e, segundo os dados revelados, é como se todas as áreas de água que desapareceram do País, somadas, fossem o equivalente a quatro vezes o Estado do Rio de Janeiro, ou a uma vez todo o território do Acre, sendo que a redução dos recursos hídricos tem sido significativa em todos os biomas.
A pesquisa considera as mudanças ocorridas desde 1985 até 2020, assim como ocorreu o estudo sobre o fogo, divulgado na semana passada, indicando que quase 20% do território brasileiro foi tragado pelas chamas, pelo menos uma vez, no mesmo período.
O Brasil está secando
O País possui 12% de todas as reservas de água do planeta e constitui 53% do total de recursos hídricos da América Latina, mas perdeu, nos últimos 29 anos, 3,1 milhões de hectares de cobertura hídrica. Assim, o Brasil saiu de 19,7 milhões de hectares em 1991, para 16,6 milhões de hectares em 2020.
“O que a gente consegue perceber é que de fato há uma tendência da diminuição das superfícies de água. O cenário que vem se desenhando nesses últimos 30 anos, de fato, é de uma menor disponibilidade hídrica e é algo que tem uma correlação evidente com o aumento do desmatamento, principalmente na Amazônia, que tem a função de regulação da precipitação (das chuvas) no Sul e Sudeste do Brasil e, também, com as mudanças climáticas e a aceleração desse fenômeno que tem ocorrido pela ação humana”, explicou em entrevista à CENARIUM, o coordenador de projetos do WWF-Brasil Cássio Bernadino.
A situação mais crítica é do estado de Mato Grosso do Sul, integrante do Pantanal. Foi onde ocorreu a maior perda absoluta e proporcional de superfície de água nesta série histórica: 57%, ou seja, redução de 780 mil hectares de água. De 1,3 milhão de hectares de recursos hídricos em 1985, restam, agora, 589 mil hectares.
Na vice-liderança, aparece o Mato Grosso, que perdeu 530 mil hectares e, Minas Gerais, com saldo negativo entre a água que saiu e a que se esvaiu de quase 120 mil hectares.
Vai pesar no bolso
O coordenador de projetos do WWF-Brasil avalia ainda os efeitos da redução dos recursos hídricos como catastróficos não só para a saúde do homem e do meio ambiente, mas também para a economia do País.
“As mudanças climáticas tendem a alterar esse regime de chuvas, ficando mais concentradas e com a água menos disponível no sistema. Tendem, também, a fazer com que algumas regiões fiquem mais secas e com menos umidade no solo e, por outro lado, o desmatamento afeta a transpiração da floresta”, destacou Cássio Bernadino.
“As projeções mostram que sim, a gente deve se preocupar com a disponibilidade hídrica no próximo século. A tendência é que a gente tenha mais secas e isso vai encarecer a produção agrícola brasileira, afetando nosso PIB e o preço dos alimentos. E, como a gente já tem visto, afeta também a nossa conta de água, dado que nossa matriz energética é majoritariamente hidráulica”, lamentou.
Atual situação dos biomas
A Amazônia é o bioma com mais área coberta por água em todo o mundo: são mais de 10 milhões de hectares. Apesar da redução que todos eles sofreram nas últimas décadas, a situação segue da seguinte forma, no Brasil:
Posição | Bioma | Superfície d’água em hectares (ha) |
1º | Amazônia | 10.638.976 ha |
2º | Mata Atlântica | 2.134.950 ha |
3º | Pampa | 1.807.627 ha |
4º | Cerrado | 1.449.245 ha |
5º | Pantanal | 1.031.380 ha |
6º | Caatinga | 922.431 ha |
Fonte: MapBiomas/Água
Rio Negro em risco
O levantamento do MapBiomas também fez uma alarmante revelação para a Amazônia: o Rio Negro está perdendo seu vigor. Ele perdeu 360 mil hectares da superfície de água em 36 anos, representando uma diferença de 22% em seus níveis entre o início e o final da série histórica, ou seja, de 1985 a 2020.
Além disso, as imagens de satélites apontaram para um decréscimo generalizado da superfície em sua sub-bacia hidrográfica.
“Acho que o Rio Negro é um bom exemplo do que tem ocorrido com a Amazônia em geral. Algumas pesquisas indicam que se não nos aproximamos do ‘ponto de ruptura’, talvez a gente já tenha até passado dele, que é o momento em que a Amazônia já foi tão devastada pela ação humana, que o sistema fica tão desequilibrado, que começa a se degradar por si só”, afirmou Bernadino.
“A Amazônia deixa de ser uma floresta e começa a se tornar uma savana, ou seja, uma região com vegetação mais rala e mais seca, então o prospecto para a Amazônia, nesse cenário de mudanças climáticas e aceleração do desmatamento é muito alarmante. É o momento de parar com isso e, de fato, começar a recuperar a floresta”, finalizou o coordenador.