29 de setembro de 2020
13:09
João Paulo Guimarães – Da Revista Cenarium*
PANTANAL, MT – O fim da humanidade começa no Pantanal. Ao entrar em Poconé (a 103 quilômetros de Cuiabá, no Mato Grosso) novamente, depois de um mês afastado, eu comemoro a falta de fumaça. Ela existe ainda, mas é leve e fraca assim como o cheiro. Uma melhora desde a ultima vez que estive aqui.
Dessa vez chego pela manhã e posso ver a miséria da cidade. Esganiçada. Empoeirada. Esfomeada e sem vida a cidade que mora na entrada do Pantanal. Desesperançosa.
O Pantanal fica no fundo dos biomas. É alimentado por uma junção
da vida natural do Brasil com a Amazônia e os Andes. Tudo desagua no Pantanal. Ele precisa dos outros. No meu retorno a esse Ecótone eu me deparo com a tristeza que lembra uma região de ressaca. Sonolenta.
Passando pela transpantaneira de carro eu vejo os animais cabisbaixos e sem forças.
A transpantaneira com seus 150 quilometros respira com dificuldade. O fogo é voraz e continua. Debaixo de uma das pontes da estrada violentada, a carcaça de um jacaré. Se morreu de sede ou assassinado pela fome não se sabe. Fede debaixo da ponte e nela o pedido de socorro. SOS.
Um gavião à beira da estrada parece não ter vontade de voar com a chegada do nosso carro. É como se o animal tivesse desistido. Um grupo de capivaras descansa no meio da terra seca e ao fundo vemos fumaça.
Muita fumaça. Jacarés reunidos à beira de um rio quase seco não se movem nem quando chego perto demais pra fotografar. Os animais não são perigo. O calor de 44° sim. Não para nós que podemos beber de nossas geladeiras.
Uma ponte sobre um rio seco e quebradiço. Andamos mais alguns quilômetros, mas está ficando tarde e precisamos voltar. No caminho de volta um foco de queimada a três quilômetros. É grande o fogo distante.
Logo atrás de nós vem o Corpo de Bombeiros.
Fazemos sinal pra pararem. Eles descem do caminhão pipa e apontamos para a luz amarela que se destaca na noite seca da transpantaneira. Não há nada a fazer. É tarde e perigoso para entrar no terreno a essa hora da noite.
Enquanto eu fotografo o foco de luz faminto, percebo a estátua de São Francisco de Assis com os dizeres: “Senhor. Fazei de mim um instrumento da tua paz.” Perdoa São Francisco. Perdoa o povo que não sabe o que eles, os Salles da vida, fazem, porque ele, o ministro, sabe muito bem.
(*) Correspondente especial