21 de agosto de 2021
20:08
Iury Lima – Da Cenarium
VILHENA (RO) – Um debate online realizado, neste sábado, 21, entre 18 jornalistas da Amazônia responsáveis pela cobertura de temas relacionados à preservação e defesa da maior floresta tropical do mundo – e seus respectivos povos tradicionais – e especialistas em áreas ligadas ao clima e meio ambiente, trouxe como tema a relação entre as emissões de dióxido de carbono na atmosfera ( CO²) e a celeridade com que ocorre o ‘superaquecimento’ global.
A discussão partiu da análise de pesquisas apresentadas durante a primeira etapa de um curso sobre as mudanças climáticas e sustentabilidade, promovido pelo Instituto ClimaInfo, que combate a desinformação e disseminação de fake news sobre a chamada ‘emergência climática’, por meio da divulgação de dados, estudos e avaliações científicas.
Esta iniciativa, da qual também participou a CENARIUM, terá mais uma edição em 28 de agosto, sendo o estágio final.
O Superaquecimento
O físico, ambientalista e professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece) Alexandre Costa apresentou dados alarmantes sobre a situação crítica do clima pela qual o mundo passa. “O planeta está superaquecendo. Aquecendo muito além dos padrões dos últimos 2,8 milhões de anos”, afirmou com preocupação o cientista.
A data de referência citada por Alexandre parte da época do surgimento do gênero Homo na biodiversidade do planeta, ou seja: as mudanças climáticas estão intrinsecamente ligadas às ações humanas. Um triste fato, tendo em vista que o Homo Sapiens – a espécie humana como conhecemos -, mal ultrapassou 300 mil anos de caminhada sobre a Terra. Indicativos de que esta, talvez, seja uma breve (e trágica) passagem pelo único planeta conhecido pela ciência em todo o Universo observável com a capacidade de abrigar vida.
Para o cientista, a alta concentração de moléculas de CO² na atmosfera, por meio do aumento gradual das emissões no mundo inteiro, aceleram o ritmo do aquecimento do planeta. Ele garante que nosso futuro é incerto em um mundo que pode se tornar inóspito em razão do agravamento deste cenário.
O CO² é o principal gás causador do efeito estufa porque suas moléculas atuam prendendo calor na atmosfera. Em 2020, o aumento de concentração do dióxido de carbono em todo o mundo foi de 2,31 partes por milhão (ppm), de acordo com a Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA (NOAA, em inglês), ultrapassando o nível mínimo necessário de segurança em ppm na atmosfera para evitar um colapso climático, que é de 350. Sendo assim, a cada um milhão de moléculas de ar no planeta, havia 414,24 de CO².
Segundo Costa, as concentrações são inéditas em 800 mil anos e o planeta pode ultrapassar todos os índices desde o início da Era Cenozóica, que ocorreu há mais de 65 milhões de anos, se entendendo até hoje.
De acordo com a NOAA, o nível ainda é semelhante ao de 15 milhões de anos atrás, com crescimento considerado sem precedentes. A diferença é que desta vez o processo está acontecendo, pelo menos, 30 vezes mais rápido.
“Tenham total noção disso: a pandemia vai parecer uma brincadeira de criança. Nós estamos enfrentando um problema muito sério. Todos precisam entender a gravidade disso e ter condições de enfrentá-la. Mas é preciso informar a população e queremos encontrar uma saída”, ressaltou.
Troféu da vergonha
A Região Norte do País é campeã no lançamento de gases de efeito estufa na atmosfera. De acordo com o Sistema de Estimativa de Emissão de Gases (SEEG), do Observatório do Clima, em 2018, o norte brasileiro foi responsável por mais de 600 milhões de toneladas de dióxido de carbono concentradas no ar, correspondendo a 31,5% do total nacional. É no Norte, também, onde se localizam os sete municípios que mais emitem CO² no Brasil inteiro.
Naquele ano, o Brasil emitiu 1,22 bilhão de toneladas de dióxido de carbono. Já em 2019, último ano do levantamento, o total foi de 2,33 bilhões de toneladas.
“Nós temos, hoje, uma situação de emergência. Nós (toda a humanidade) emitimos mais de 40 bilhões de toneladas por ano, atualmente. Nós devemos cortar para 20 bilhões de toneladas por ano até 2030, mas entendo que é impossível diante das atuais necessidades da sociedade. Um mundo fora do acordo de Paris é um mundo, em larga escala, inabitável”, lamentou Alexandre Costa.
Amazônia mais quente
Não por acaso, o País encara cada vez mais fenômenos de um clima descontrolado. Friagens mais severas em localidades naturalmente quentes, temperaturas abaixo de zero no Sul e Sudeste – com cada vez mais incidência-, e ondas de calor tão velozes quão intensas.
Para se ter uma ideia, de 1961 a 2020, a temperatura média no Brasil subiu 1,70ºC. Nesses últimos 60 anos, o maior impacto foi sentido no Maranhão, dentro da Amazônia Legal: elevação de 2,22ºC. Os dados são da Berkeley Earth, uma organização norte-americana sem fins lucrativos.
Elevação da temperatura na Amazônia Leal – 1961-2020
Posição | Estado | Elevação (em ºC) |
1º | Maranhão | 2,22 |
2º | Tocantins | 2,13 |
3º | Amapá | 1,92 |
4º | Pará | 1,87 |
5º | Mato Grosso | 1,51 |
6º | Roraima | 1,50 |
7º | Amazonas | 1,19 |
8º | Rondônia | 0,92 |
9º | Acre | 0,78 |
Além disso, a estimativa é que a temperatura global aumente em 1,5ºC até 2040. Para os pesquisadores, a última vez em que a Terra esteve tão quente foi há 100 mil anos.
Como virar o jogo
Apesar de consideradas cientificamente inequívocas, sem precedentes e irreversíveis, as mudanças climáticas podem ser amenizadas com ações conjuntas em prol da preservação da natureza, mesmo não sendo ações pautadas como prioridades de agendas político-ambientais das esferas estaduais e federal – isso quando existentes.
Uma delas é o combate ao negacionismo por meio da informação. “Eu acredito no jornalismo, nas pessoas que trabalham com a comunicação, como organismos fundamentais para enfrentar a desinformação e o negacionismo. O que posso oferecer como cientista é uma conexão para poder traduzir e dar acesso a essas informações”, declarou o físico e professor Alexandre Costa.
“É muito importante comunicarmos a emergência climática de forma adequada e em busca de soluções. Para isso, o papel dos jornalistas é muito importante para que se possa fazer uma cobertura que leve aspectos científico, social, político e econômico da temática – tornando-se fundamental investir na formação destes profissionais”, declarou à CENARIUM a jornalista do ClimaInfo Tatiane Matheus.
“O ClimaInfo tem em sua trajetória a divulgação da ciência para combater os efeitos das mudanças climáticas. Buscamos colaborar trazendo informações, dando acesso aos cientistas e especialistas para que cada vez mais os jornalistas possam ter ferramentas para uma melhor cobertura ambiental e poder ver a transversalidade do tema até mesmo nas pautas de outras editoriais”, finalizou Tatiane.