Eraquário: o artista misterioso que expressa arte nas ruas de Manaus

Inspirado na técnica lambe-lambe, o artista se comunica com o público a cada desenho produzido (Reprodução/Eraquária)

10 de abril de 2021

07:04

Priscilla Peixoto

MANAUS – “Prefiro não revelar minha identidade por trabalhar com arte de rua e também para separar o artista da obra Eraquário”, assim diz o artista de 29 anos que espalha cores e mensagens em forma de arte nas ruas de Manaus. Há seis anos, o artista que desenha e pinta desde a infância, tendo como público-alvo a comunidade LGBTQIA+, trabalha de forma à la ‘lambe-lambe’ exercendo sua atividade e deixando sua marca nos espaços públicos.

O artista “misterioso” é formado em administração e atualmente estuda computação gráfica, mas não conseguiu sair do mundo das artes, tanto que, em 2018, cursou pintura no Centro de Artes da Ufam- CAU.

O público-alvo é LGBTQIA+ (Reprodução/Eraquário)

“Já estou na rua brincando com a cidade há 6 anos. Eu digo que fazer arte de rua é uma brincadeira por ser uma grande diversão, a rua para mim é como um playground. Eu gosto de como as pessoas reagem ao meu trabalho, como fotografam, como amam e até mesmo como odeiam”, conta Eraquário.

Segundo o pintor, o nome adotado para expressar as artes produzidas vem da Era de Aquário, uma “era cósmica”, conceituada por preceitos astronômicos e astrológicos, onde o movimento da terra teria ligação com as constelações zodiacais. Em meados dos anos 60, se popularizou a crença de que essa “nova era” traria uma nova fase para a humanidade.

(Reprodução/Eraquário)

Arte para todos e referências

Apesar do trabalho do jovem de 29 anos ter como um dos principais focos as comunidades LGBTQIA+, a arte de Eraquário conversa com todos os públicos.

“O meu público-alvo é jovem e LGBTQ+, mas isso não impede que pessoas de fora desses grupos não possam admirar meu trabalho. Eu sou muito eclético e tento transparecer isso no meu trabalho, pois quero que todos se sintam tocados de alguma forma”.

Sobre as inspirações para criar, ele conta que possui algumas referências como Bueno Caos com o Pelé Beijoqueiro, HomoRiot, um artista anarquista homossexual que espalha arte e sadomasoquismo pelo mundo, mas a principal inspiração, segundo Eraquário, é Andy Warhol e Banksy, este último foi quem inspirou a escolha pelo anonimato do jovem artista.  

“Gosto de me manter no anonimato, pois acredito que o sucesso de Banksy é exatamente devido a isso: ninguém sabe quem ele é, mas sabem e conhecem o trabalho”, pontua  ele.

O artista gosta de observar a reação do público (Reprodução/Eraquário)

Dificuldades

“Trabalhar com arte nunca foi fácil, assim que me formei na faculdade de administração, fiquei procurando emprego e até agora nada, foi aí que o meu hobby de arte virou minha principal ocupação e fonte de renda”, revela.

Porém, a falta de incentivo para com os artistas locais é um dos problemas presentes para Eraquário que tem feito do próprio talento uma ocupação cotidiana.

“O lado negativo de trabalhar com arte é que falta apoio e incentivo financeiro, pois o artista não faz arte apenas porque é hobby, mas sim porque é uma ocupação e o artista também come, bebe, veste e tem boletos para pagar”, lamenta o artista.

Escolha do lambe-lambe

Com o objetivo de ser uma peça publicitária, a técnica do lambe-lambe (colagem onde o papel é “lambido” pelo pincel ou rolinho com cola) tem origem há mais ou menos 200 anos e acabou virando arte adotada por cartazistas da época.

A técnica resiste até hoje nas ruas das grandes cidades do mundo e é o método preferido por Eraquário para expressar suas criações.

Após desistir da faculdade de biologia e passar por alguns problemas de saúde, ele conta que começou a fazer colagens em casa, na porta do quarto, foi quando ele começou a planejar como poderia levar as colagens para a rua. Daí surgiu a brincadeira de “você viu meu unicórnio?”.

“Saí colando unicórnios por alguns locais que passava e foi um sucesso, pois amigos começaram a me marcar e as pessoas começaram a procurar pelas colagens dos unicórnios na rua. Depois dos unicórnios sugiram alguns beijos lésbicos com as meninas de ‘Azul é a Cor Mais Quente’, e não parei mais”, conta o jovem.

Gravura intitulada de “você viu meu unicórnio?” (Reprodução/ Eraquário)

Arte de rua e preconceitos

 A arte considerada de rua envolve o grafismo, lambe-lambe e muitas outras formas de expressão. Logo, há quem goste e também os que não se agradem tanto.  No caso da arte de Era, além da questão do não gostar, (que é direito de qualquer pessoa) há também o incomodo pelo fato das gravuras expressarem mensagens voltadas ao público LGTBQIA+, comunidade que naturalmente já sofre preconceito por serem quem são.

“Geralmente eu fico de longe vendo a reação das pessoas, há aquelas que contemplam e entendem as mensagens contidas no cartaz, mas há também as que não aceitam, criticam, e chegam até mesmo a rasgar o trabalho colado na parede. Principalmente sobre temas LGBTs”, conta o pintor.

 Ele aproveita e ressalta. “Arte de rua, apesar de estar na rua de graça, ela teve um custo, valorizem. Não é fácil. A arte é tudo para mim, a arte salvou a minha vida e eu tenho certeza que a arte pode salvar muitas outras vidas também, pode dar nova perspectivas e visões de mundo completamente diferentes, pode ser terapêutica e divertida, e também pode ser uma ocupação digna sim”, finaliza o artista.

(Reprodução/Eraquario)