Gigantes na arte de periferia, rappers cariocas Bnegão e Shackal se rendem à toada de boi-bumbá

Os rappers posam junto a equipe de produção da nova música (Reprodução/Assessoria)

10 de setembro de 2021

19:09

Mencius Melo – Especial para Cenarium

MANAUS – Impactados pelo resultado positivo de fazer uma releitura de toada do boi-bumbá amazônico, os rappers cariocas Bnegão e Shackal falaram com exclusividade à CENARIUM, nesta sexta-feira, 10, sobre a experiência de se descobrir brasileiro em plena Amazônia, de se conectar com algo muito mais importante e de redescobrir raízes humanas. BNegão é filho de pai amazonense. “Manauara da gema”, declarou ele. Já o rapper Shackal se sente parte da Amazônia como “de corpo e alma”. Acompanhe a entrevista.

Revista CENARIUM – 1 – BNegão e Shackal, como você chegaram ao Garantido e à toada “Um Mundo Novo?”

BNegão & Shackal – Tudo começou com uma “pilha” do Daniel Castro, jornalista ligado à atual gestão do Boi Garantido, junto o Jorge Gonzaga, produtor carioca. Aí entramos em contato com o presidente do Garantido, Antonio Andrade, e aí começou a parceria. O Daniel mandou uma playlist gigantesca de toadas e foi aí que escolhemos “Um Mundo Novo”.

2 – Dois rappers cariocas chegam ao coração de uma manifestação amazônica e regravam uma toada. De certa forma o Brasil começa a se descobrir na Amazônia?

Shackal – A Amazônia é um chamado. Eu não sou um ser humano que vive uma experiência espiritual, eu sou ser espiritual que vive uma experiência humana. Por isso estou conectado a esse mundo.

BNegão – Minha raízes são profundas com a Amazônia e o Amazonas. Meu pai é amazonense, a família dele toda! Sou fruto do êxodo econômico dos anos 1960 em que o Norte e o Nordeste buscaram no Sudeste uma saída para melhoria de vida. Sou carioca com forte DNA amazonense.

3 – A toada “Um Mundo Novo” tem fortes recortes críticos sobre o atual momento por qual passa o País no que tange a pandemia e a situação ambiental. A versão de BNegão & Shackal acentua ainda mais o tom crítico. Num Brasil bolsonarista, a patrulha ideológica não preocupa?

BNegão – Não me preocupo com patrulha, sou filho de quem eu sou. Meu pai lutou contra a ditadura. Aprendi a fazer música assim. Tenho zero preocupação com patrulha, aliás, eu fui um dos primeiros artistas a bater nesse desgoverno que hoje responde pelo Brasil. Desde os 5 anos de idade sei o que é política. Nasci e cresci assim, por isso faço música de combate.

Shackal – O que me preocupa são as pessoas morrendo sem ter o que comer. O que me preocupa são as queimadas na Amazônia. O homem não poder respirar, isso me preocupa. O que me preocupa é o caminho vergonhoso que o Brasil vem tomando. Isso sim me preocupa.

4 – Vocês pretendem regravar ou até mesmo fazer novas versões de toadas do Boi Garantido?

BNegão & Shackal – Sim, pretendemos. Estamos conversando com o pessoal envolvido na produção de “Um Mundo Novo” para avançarmos. Claro que vamos pedir licença do Boi Garantido, dos compositores e de todos os envolvidos para experimentarmos até porque o resultado da versão de “Um Mundo Novo” nos deixou muito felizes não só a nós como também o JG, o Gilbertô, Gabriel Morelo, Marcelinho da Lua e toda a galera envolvida. Essa música ficou linda. É um chamado!

5 – Dezenas de lideranças indígenas sucumbiram ao novo coronavírus e a Floresta Amazônica sofre gravemente sob a pressão das queimadas. Como artista e cidadão, como BNegão pode contribuir para estancar esse desastre?

BNegão – Estou ligado no que está acontecendo, tenho muita ligação com a causa indígena até porque estamos vivendo uma sabotagem ao País travestida de patriotismo. É na verdade um desgoverno. São gafanhotos humanos que vieram para destruir. O que posso dizer é que minha voz e minha arte e minha ação estão a serviço das causas indígenas e não só delas, mas de tudo o que eu considero importante.

Shackal – Dedico minha arte, meu posicionamento e minha solidariedade a esses povos e suas lideranças. São pessoas sofridas, em comunidades distantes que sofrem com a violência. A elas dedico meu posicionamento não como político, mas como homem. Como ser humano que depende da terra. Estou junto desse grito pela Amazônia, pelos povos indígenas, pelos quilombolas e por nós.

6 – Podemos contar com BNegão e Shackal em um possível Festival Folclórico de Parintins, em 2022? Compositores do Boi Garantido, quem sabe?

Shackal – Pode contar com o “Baile do Shackal”, em Parintins 2022. Vamos levar uma galera para Parintins e fazer o chão tremer!

BNegão – Para mim será uma honra brutal estar nessa terra que está no meu DNA. Como compositor do Garantido quem sabe daqui há uns 20 anos (risos) quando o “preto velho” aqui estiver mais cascudão. Mas só de estar aí já vai ser uma experiência maravilhosa.

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