Líderes de matrizes africanas dividem opiniões sobre preconceito em discurso de vereador de Manaus
21 de abril de 2021
15:04
Priscilla Peixoto
MANAUS – Religiosos de matrizes africanas entrevistados nesta quarta-feira, 21, dividem opiniões sobre o discurso do vereador Sandro Maia (DEM), feito nessa terça feira, 20. Em sessão na Câmara Municipal de Manaus (CMM), o político comentava dificuldades enfrentadas no transporte público, alegando que aparentemente a única solução seria recorrer à “macumbaria”.
Em avaliação ao discurso do vereador, o coordenador-geral da Articulação Amazônica dos Povos e Comunidades de Tradicionais de Matriz Africana (Aratrama), Pai Alberto Jorge, classificou a fala como irônica e com tom de preconceito.
“Todos sabem da pouca vergonha que está por trás da situação do transporte público em Manaus. Ele usou o exemplo de forma irônica, nunca nenhum macumbeiro ou macumbeira, como ele falou aí, foi chamado para a Câmara Municipal de Manaus para resolver absolutamente nada e uma fala dessa vinda de um vereador, evidentemente, não é fruto de um credo ou fé”, pontua Pai Alberto Jorge.
Ele completa: “Se os vereadores quiserem resolver a problemática do transporte público, é muito simples. A melhor ‘macumba ou feitiçaria’ é criarem vergonha e agirem com lisura, dignidade, respeito e eficiência contra qualquer perversidade cometida por políticos e empresários contra a economia popular e contra o povo de Manaus”, advertiu o coordenador da Aratrama.
“Há contextos e contextos”
Questionado se o termo macumbeiro seria considerado um termo pejorativo aos praticantes de religiões matrizes africanas, Pai Alberto explica que depende muito do contexto em que se coloca.
“Entre nós, o termo é normal. Depende muito da maneira, do contexto e do tom em que se fala. No geral, para a sociedade, é considerado como um termo pejorativo, porque a própria sociedade não nos enxerga como amigos e associa de forma negativa a palavra”, explica Alberto.
Contraponto
Se para o Pai Alberto Jorge a fala do vereador em questão teve ironia e nuances de intolerância religiosa, já para o também praticante da religião de matriz africana, Ronald ty Oxóssi, a fala de Sandro Maia não demonstrou algum tipo de ironia ou preconceito.
“Apenas notei a dificuldade dele em trabalhar e desenvolver o transporte público de Manaus e, na minha visão dele, a macumba resolveria sim. E quando a situação é para o bem do povo, a macumba ajuda sim. Não entendo como intolerância”, avaliou Ronald.
Sobre o discurso
Na ocasião, Sandro Maia falou sobre o transporte executivo não receber o vale-transporte e tão pouco a meia-passagem, mesmo anos após o modelo servir ao público como alternativa de deslocamento. O vereador também frisou a não renovação de contrato pela gestão anterior. Ele ressalta que este seria um dos motivos por não haver novos ônibus executivos transitando em Manaus.
E disparou a seguinte fala “Chegamos ao ponto em que as empresas pagam para as empresas coletivas para receber o valor dos vales (transporte e estudantil). Infelizmente, uma macumbeira muito conhecida do Alvorada morreu. Eu ia pedir para desatar esse nó do transporte coletivo. Ela acabava com o casamento e reconstruía. Como a Chiquinha morreu, vai ficar na mão dos vereadores e prefeitos”, discursou o político.
Posicionamento
Procurado pela Revista Cenarium para falar sobre o discurso em questão, o vereador Sandro Maia afirmou que a fala não teve intuito ofensivo ou preconceituoso e disse, inclusive, frequentar centros religiosos de matrizes africanas.
“De forma nenhuma quis ser preconceituoso, pelo contrário, tenho vários amigos e amigas que frequentam centros religiosos, eu também respeito muito, de forma nenhuma quis ofender, estou lutando pelo melhor transporte em nossa cidade”, declarou o vereador.