Mico munduruku: novo macaco é descoberto no arco do desmatamento

O sagui-dos-Munduruku ocupa uma área desde a margem esquerda do rio Jamanxim até a direita do rio Tapajós Ilustração:Stephen Nash)

24 de outubro de 2020

07:10

Michelle Portela – Da Revista Cenarium

BRASÍLIA – O sonho de todo biólogo é realizar uma grande descoberta sobre a vida selvagem, mas imagine descobrir uma nova espécie desconhecida da ciência e pela sociedade. E depois, realize a ideia de que os animais desta espécie que você acaba de identificar em meio à natureza está ameaçada pelas chamas dos incêndios florestais que ocorrem no seu habitat natural neste exato momento. Mico munduruku: novo macaco é descoberto no arco do desmatamento

Ao pesquisador Rodrigo Costa Araújo, que descobriu o Mico munduruku no sul da Amazônia, só restou torcer por chuvas fortes na região nesta última estação seca da Amazônia. “É trágico e triste ver a biodiversidade em chamas, de espécies ainda por serem descobertas que poderiam somar à ciência brasileira e ao patrimônio ambiental do país”.

Não é fácil ser um cientista da conservação num país em que há forte negacionismo da crise de extinção da biodiversidade quando, por exemplo, governantes dizem que a Amazônia não está queimando. “Você sabe que a situação dos cientistas no Brasil é precária também no que diz respeito ao financiamento de pesquisas básicas em biodiversidade”, me disse ele.

O estudo foi realizado no território indígena Munduruku, no lado paraense daquela fronteira com o Amazonas, em uma área de 55 mil quilômetros quadrados de mata. Ao caminhar pela floresta, com um amplificador que emite sons de outros saguis para atraí-los, Araújo avistou saguis de cauda branca que viria a batizar de Mico munduruku, em homenagem ao povo indígena homônimo. “Aquele foi o momento em que percebi que poderia ter uma nova espécie em mãos. Então, começamos a estudar a genética e a pelagem dos saguis de cauda branca e confirmarmos a descoberta da nova espécie”, explica.

Além da descoberta, o estudo de Araújo revelou que o sagui-dos-Munduruku ocupa uma área desde a margem esquerda do rio Jamanxim até a direita do rio Tapajós, ultrapassando os limites do território indígena Munduruku. “Metade da distribuição geográfica dos saguis-dos-Munduruku está dentro das terras indígenas do povo Munduruku, o que traz esperança da sobrevivência da nova espécie, já que os povos indígenas são sabidamente guardiões das florestas e da biodiversidade” em suas terras.

A descoberta do pesquisador, então doutorando pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), ambos sediados em Manaus, capital do Estado do Amazonas, foi possível graças ao financiamento federal – então disponível em 2015 através da CAPES – além de apoio e financiamento fundamentais do Conservation Leadership Program (CLP).

“Se quisermos garantir a qualidade de vida e o desenvolvimento econômico em nossas sociedades, precisamos proteger os primatas, as florestas e toda a biodiversidade da Amazônia. E, para que isso aconteça, é fundamental que sejam feitos investimentos substanciais em pesquisa e conservação da biodiversidade, além de manter e garantir o cumprimento da legislação ambiental”, finaliza o biólogo.