Missionários tentam entrar em terras indígenas isoladas do AM mas são barrados pela Justiça

Os missionários religiosos estão proibidos de entrar em terras indigenas isoladas - foto: AFP

20 de abril de 2020

07:04

MANAUS – Em decisão favorável às comunidades indígenas do Vale do Javari, a Justiça Federal da comarca de Tabatinga (AM), proibiu a entrada de missionários da organização religiosa ‘Missão Novas Tribos no Brasil’ (MNTB), nas terras indígenas localizadas no extremo oeste do Estado do Amazonas.

Nesse sentido, na sentença, anunciada na quinta-feira, 16, o juiz Fabiano Verli ainda determinou uma multa de R$1 mil por dia e ocasião, por cada ato de descumprimento.

Os réus da ação, Thomas Andrew Tonkin, Josiah Mcintyre, Wilson de Benjamin pertencem a MNTB, e estão proibidos de entrar no local sem autorização da Fundação Nacional do Índio (Funai). A organização religiosa já foi acusada de forçar o contato e tentar evangelizar grupos indígenas que decidiram viver em isolamento.

Na fundamentação, o magistrado citou o livro “Armas, germes e aço”, do biólogo norte-americano Jared Diamond, para iniciar a deliberação, movida pela União dos Povos Indigenas do Vale do Javari (Unijava). A justificativa, se baseou na condição biológica da transmissão de anticorpos e germes por contato físico. Ele também leva em consideração a pandemia da Covid-19, para argumentar a falta de importância constitucional da doutrinação religiosa para os indígenas.

“(O livro) descreve bem as características bem peculiares de seres humanos que vivem em pequenas comunidades há vários séculos sem grandes interações e/ou não estando em grandes aglomerações [que é o caso dos índios e não dos eurasianos, por exemplo]. Eles simplesmente não têm um patrimônio de anticorpos e germes [adquirido por eurasianos ao longo de séculos] capaz de reagir bem a diversos tipos de exposição a germes que nós, descendentes ou não de índios, carregamos de modo inócuo para nós, não para eles”, interpelou Verli.

O juiz ainda intimou a Funai a cumprir as obrigações legais, para elaborar em 15 dias um relatório do caso, e que a organização se posicione sobre a Comunidade Indígena Vida Nova. O juiz federal ainda autorizou o uso de força policial, inclusive militar de qualquer espécie para apoiar o cumprimento da decisão.

Resposta da MNTB

A MNTB emitiu nota sobre as acusações, explicando que a “saída dos missionários das terras Marubo ocorreu 17 dias antes da primeira reportagem da O Globo. E que a MNTB conscientemente pediu a saída dos missionários da aldeia, quando a região Norte não estava no auge da pandemia, como foi afirmado”.

A MNTB também diz que o “a área de atuação da Novas Tribos no Vale do Javari não é de isolados, mas uma comunidade conhecida e, inclusive, de grande trânsito de indígenas para as cidades e vilarejos próximos”, finaliza.

Missionário na Funai

A MNTB possui ligação com Ricardo Lopes Dias, recém nomeado pelo presidente da República Jair Bolsonaro, como o coordenador-geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Funai (CGIIRC).

A nomeação controversa do missionário, que declarou à imprensa trabalhar mais de dez anos na MNTB; foi contestada por várias ONG’s ligadas à causa indígena, incluindo a Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). Na ocasião, a ONG afirmou que a nomeação de Dias, seria responsável pelo genocídio e etnocídio das etnias do Vale do Javari.