Mulheres indígenas organizam associação para reivindicar direitos em Manaus

Cacica Lutana (à esquerda) organiza associação de mulheres indígenas no Parque das Tribos e comunidade Cristo Rei (Reprodução/Arquivo pessoal)

30 de março de 2021

12:03

Marcela Leiros – Da Revista Cenarium

MANAUS – Mulheres indígenas que moram no Parque das Tribos e na comunidade Cristo Rei, ambos localizados no bairro Tarumã, zona Oeste de Manaus, estão se organizando para criar uma associação e reivindicar direitos para os moradores das localidades. A Associação Indígena Cristo Rei vai reunir cerca de 40 mulheres de várias etnias, como Baré, Kokama, Tukano, Miranha.

De acordo com a chefe indígena do Parque das Tribos, cacica Lutana, o principal objetivo da associação das mulheres é discutir e elaborar ações para reivindicar direitos básicos de todo cidadão como território, moradia, educação e saúde. “Para nós, mulheres indígenas, é muito importante porque nós, indígenas, necessitamos além do social, que são alimentos, projetos de moradia, urbanização, educação, saúde, tudo isso”, expressou a indígena da etnia Kokama, que também é uma das idealizadoras e fundadoras do Parque das Tribos.

Cacica Lutana, que tem 47 anos e assumiu a responsabilidade de liderar o Parque das Tribos há duas semanas, destacou ainda a importância da representatividade das mulheres indígenas na luta pelos direitos de toda a comunidade. “Nós, mulheres, já temos responsabilidades naturalmente impostas e agora temos uma equipe que vai lutar pelo que é importante para nós”, afirmou.

A criação da Associação Indígena Cristo Rei tem como inspiração a Federação Kokama, formada apenas por mulheres, que também atua no Parque das Tribos e comunidade Cristo Rei, mas que tem apenas indígenas da etnia Kokama. O principal trabalho dos dois grupos, segundo a cacica Lutana, é a “arrecadação e distribuição de alimentos não perecíveis para os moradores das comunidades”.

Desafios

Como mulher e, principalmente, indígena, Lutana contou que enfrenta desafios para liderar o Parque das Tribos. Um desses obstáculos é a tentativa de terceiros de invalidarem seu direito de ser a chefe da comunidade, já que há famílias, dentro da localidade, que não reconhecem sua liderança.

Ela alega que vê “machismo” na atitude, mas o que importa é que foi escolhida em uma eleição reconhecida pelo Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas (TRE-AM) e a Fundação Nacional do Índio (Funai). “Eu tenho o documento”, disse ela. “Os órgãos públicos reconhecem a minha representatividade dentro da comunidade”.

Parque das Tribos e Cristo Rei

A comunidade Cristo Rei surgiu antes do Parque das Tribos, quando os pais da cacica Lutana, João Diniz Albuquerque, do povo Baré, e Raimunda da Cruz Ribeiro, da etnia Kokama, saíram da região do Médio Rio Solimões, próximo ao município de Tefé, no oeste do Estado, e se abrigaram em Manaus. Com os filhos e sem local para morar, o casal ocupou uma área no Tarumã-Açu, na zona Oeste da capital amazonense. Esta terra se consolidou como a comunidade Cristo Rei.

A partir de 2012 a família começou a ocupar o antigo roçado da comunidade. Nesta área, em 2014, foi fundada a comunidade Parque das Tribos, onde vivem em torno de 700 famílias, sendo 80% indígenas de 35 etnias. Considerado o primeiro bairro indígena de Manaus, o Parque das Tribos abriga indígenas de etnias como Apurinã, Baré, Mura, Kokama, Tikuna, Wanano, Sateré-Mawé e Tukano. 

O bairro indígena atualmente enfrenta as dificuldades causadas pela pandemia do coronavírus. Os moradores da localidade foram atingidos pelo desemprego, pelo vírus e até mesmo com a perda do antigo cacique Messias Kokama, vítima da doença.

Indígenas na Amazônia

Pelo Censo do IBGE, Manaus tinha, em 2010, uma população de 7.894 indígenas autodeclarados. O Censo Demográfico daquele ano foi a primeira pesquisa que registrou a quantidade de etnias e de línguas indígenas existentes no Brasil. Foram contados 896,9 mil indígenas, de 305 etnias ou povos, e falantes de 274 línguas indígenas em todo o País.

Das cinco regiões do Brasil, é no Norte onde se concentra o maior número de indígenas: são 305.873 mil, aproximadamente 37,4% do total. Em toda a região, o Estado com o maior número de remanescentes dos povos originários é o Amazonas, representando 55% do total. O município de São Gabriel da Cachoeira, na fronteira com a Colômbia e a Venezuela, é a cidade mais indígena do País.