No Pará, exploração ilegal de madeira já atingiu 50 mil hectares

O perímetro assolado é quase a metade do tamanho da capital do Estado, Belém. (Reprodução/Agência Pará)

14 de setembro de 2021

19:09

Iury Lima – Da Cenarium

VILHENA (RO) – O Pará é o Estado integrante da Amazônia Legal frequentemente listado em rankings de desmatamento e acumulou no período entre agosto de 2019 e julho de 2020, cerca de 50.139 mil hectares tomados pela exploração madeireira. Os 55% da devastação ocorreu sem autorização de órgãos ambientais, portanto, de maneira ilegal.

O perímetro assolado é quase a metade do tamanho de Belém, capital do Estado. Com isso foram 27.595 hectares derrubados à revelia da lei, resultando em um aumento de 20% em relação ao período anterior, entre 2018 e 2019, quando a extração ilegal de madeira atingiu 38% do total explorado, com 22.906 hectares.

Os dados são do mapeamento feito com imagens de satélite por pesquisadores de quatro instituições voltadas à conservação ambiental: o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), o Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam), o Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) e o Instituto Centro de Vida (ICV). Juntos, eles integram a rede do Sistema de Monitoramento da Exploração Madeireira (Simex).

Maior apreensão de madeira nativa do Brasil, feita na divisa do Pará com o Amazonas, em 2020 (Reprodução/Exército Brasileiro)

Transparência

A rede é a mesma que fez o mapeamento de todo o território da Amazônia Legal e, agora, lança os estudos detalhados sobre cada Unidade da Federação integrante do território da maior floresta tropical do mundo. No caso do Pará, a transparência das informações por meio de dados relativos à extração de madeira, cedidos pelo governo estadual e órgãos de controle ambiental, facilitaram a composição do mapeamento.

O pesquisador do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, Dalton Cardoso, explicou detalhes sobre dados que possibilitaram também a diferenciação das áreas onde a madeira foi explorada de forma não autorizada daquelas onde houve o manejo. Pará e Mato Grosso foram os únicos Estados que cederam tais informações.

“No Pará, só foi possível porque conseguimos acesso a informações e dados oficiais de planos de manejo e outros documentos de outras instituições, também. Com isso, cruzamos com os dados de satélite e verificamos, de fato, a consistência dessas autorizações para conseguir separar o que está autorizado do que não está autorizado [a derrubar] no Estado”, disse.

O pesquisador do Imazon Dalton Cardoso em entrevista online para a Cenarium (Reprodução/Imazon)

A décima parte de toda a degradação

“Hoje, o Pará consegue fazer isso assim como o Estado de Mato Grosso, então os colocaria como os dois bons exemplos de Estados que têm um nível de transparência interessante para permitir uma análise desse tipo”, pontuou o pesquisador. 

Enquanto mais da metade da derrubada ocorreu ilegalmente no último ano, no Pará, os outros 45% foram identificados em locais onde a atividade foi permitida, sendo equivalente a 22.544 hectares.

O Pará concentra 10,8% do total de área explorada pela extração de madeira, seja ela legal ou ilegal. O Estado ainda ocupou a quarta posição entre os demais integrantes da Amazônia Legal, perdendo apenas para Rondônia, Amazonas e Mato Grosso.

Somando todos os Estados (com exceção do Maranhão e Tocantins), a floresta amazônica perdeu quase 500 mil campos de futebol em igual período, de agosto de 2019 a julho de 2020.

PosiçãoEstadoCorrespondência da área total atingida na Amazônia (em %)Área atingida em hectares (ha)
Mato Grosso 50,8%236.691
Amazonas15,3%71.092
Rondônia15,0%69.794
Pará10,8%50.139
Acre5,9%27.455
Roraima2,0%9.458
Amapá0,2%730

Fonte: Rede Simex

Locais mais afetados

O sudeste paraense é a região do Estado mais explorada de forma ilegal, onde de 2019 a 2020, foram 15.349 hectares, ou seja, 56% de toda a extração de matéria-prima sem autorização no território do estadual.

Além disso, os municípios de Paragominas, Juruti e Goianésia do Pará foram elencados como aqueles que mais foram tomados pela extração não permitida: 

  •  Paragominas: 8.073 hectares (29%);
  • Juruti: 3.954 hectares (14%), e 
  • Goianésia do Pará: 3.271 (12%)

“Essa região é crítica porque possui uma zona madeireira antiga e conseguimos observar ainda uma intensa atividade nesta área. Isso devido à expansão de estradas e até mesmo a existência de estoques florestais remanescentes”, avaliou Dalton Cardoso.

Atividade fiscal

Já o coordenador de inteligência territorial do Instituto Centro de Vida (ICV), Vinicius Silgueiro, avalia que é preciso intensificar a atividade fiscal, mesmo onde a extração é permitida. “É preciso direcionar esforços de fiscalização para os empreendimentos e indústrias processadoras de madeira nos municípios críticos, que já são conhecidos através dos monitoramentos realizados”, destacou Silgueiro.

Vinicius Silgueiro defende que municípios críticos situados na Amazônia devem contar com monitoramento mais efetivo de empresas e processadoras de madeira. (Reprodução/Acervo pessoal)

Entre as categorias fundiárias, a maior parte da exploração de madeira praticada de forma irregular ocorreu em imóveis rurais cadastrados, o que correspondeu a 64,2% ou a 17.726 hectares. O restante, 5.434 hectares (19,7%), foi dentro de assentamentos rurais.

Já nos vazios cartográficos, foram 2.635 hectares (8,7%) tomados pela prática criminosa. Em terras não destinadas, 1.858 hectares (6,8%). “Essa exploração de madeira que ocorre fora da lei acarreta numa série de prejuízos ambientais, como a redução dos estoques de madeira, a degradação florestal que causa a perda da biodiversidade e a emissão de gases de efeito estufa, que acabam por agravar ainda mais a crise climática”, alertou Vinicius Silgueiro. 

Redução

O mapeamento também identificou que a extração madeireira ilegal ainda ocorreu dentro dos limites de uma das Terras Indígenas (TIs) paraenses: a TI Baú, do povo Kayapó, onde a derrubada de árvores foi equivalente a uma área de 158 campos de futebol somados. Apesar de expressivo, o indicador representa um avanço: houve redução da atividade não autorizada dentro de terras protegidas, especialmente sobre os territórios de povos originários.

Estudos detalhados

Assim como o Pará, os demais Estados inseridos na Amazônia também vão ganhar mapeamento detalhado, mesmo diante da dificuldade de acesso a dados encontrada pelos pesquisadores junto aos órgãos estaduais e secretarias de meio ambiente na maioria dos de seus territórios. 

“Acreditamos que essas informações são superimportantes não apenas para termos um diagnóstico da floresta – considerando outros distúrbios também, como desmatamento e a própria degradação florestal -, mas também para contribuir em debates mais qualificados, além de levar subsídios para elaboração de políticas públicas que combatam a atividade não autorizada e ao fomento do manejo florestal na região”, detalhou o pesquisador do Imazon.

“[A derrubada ilegal] acaba desmotivando o manejo sustentável. Além disso, geralmente não respeita alguns aspectos preconizados no manejo florestal, como o respeito às comunidades e povos tradicionais, a utilização de técnicas que mantenham e respeitem a sustentabilidade da floresta e a biodiversidade dela. Além disso, se a atividade madeireira não autorizada ocorre de forma intensa ou recorrente na mesma área, isso pode ocasionar a degradação florestal e, com isso, ser um caminho aberto para o desmatamento”, concluiu Cardoso.