Número de mortes de indígenas no AM por Covid-19 ultrapassa 100 casos, afirma Apib

Somente da etnia Kokama, 52 indígenas morreram até esta quarta-feira, 27, em decorrência da doença, segundo a vice-presidente da Federação do Povo Kokama, Milena Kokama. (Divulgação)

28 de maio de 2020

18:05

MANAUS – O Amazonas chegou a 101 óbitos causados pela pandemia do novo Coronavírus nesta quinta-feira, 28, sendo o primeiro estado do País a ultrapassar a marca dos três dígitos. Em todo o Brasil, são 149 mortes e um total de 1.471 indígenas infectados pela doença. Os dados são da Articulação dos Povos Indígenas (APIB), em parceria com o Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena, que apontam, ainda, 75 povos afetados.

O Pará segue como o segundo Estado com mais óbitos de indígenas por Covid-19, com 19 casos. Pernambuco (8), Roraima (8), Ceará (5), Amapá (1), Alagoas (1), Bahia (1), Mato Grosso (1), Paraíba (1), Rio Grande do Norte (1), Rondônia (1) e São Paulo (1), completam a lista.

Segundo a vice-presidente da Federação do Povo Kokama, Milena Kokama, até esta quinta-feira, 28, o total de 52 indígenas da etnia morreram, em decorrência da doença.

Nessa quarta-feira, 27, o caso mais recente é o de Cláudia Paima Rodrigues, 44, que morreu no Hospital Delphina Aziz, na capital amazonense. Natural do município de Tabatinga (a 1.111 quilômetros de Manaus), Cláudia era uma das líderes indígenas do povo Kokama.

“Nós não somos só números, meu povo não é só mais uma estatística, somos pessoas, seres humanos, povos originários desse Brasil, Cláudia era uma jovem que morreu ontem [quarta, 27] e vai ser enterrada hoje [quinta, 28]”, disse Milena, ao chamar a atenção do poder público quanto ao atendimento aos indígenas.

Medicina Tropical no combate à pandemia

Considerado pandemia pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no dia 11 de março deste ano, até o momento, a Covid-19 ainda não tem vacinas ou medicamentos específicos que possam ser usados como cura. Apesar disso, segundo Milena, o povo Kokama tem buscado na medicina tropical uma forma de combater o vírus.

“Hoje os nossos pajés, nossos pais, estão fazendo a nossa própria medicina, porque são 52 mortes (por Covid-19) de um único povo”, pontuou.

O tratamento também vem sendo adotado pelo líder Kokama, Edney da Cunha Samyas, 38, que contou à REVISTA CENARIUM sobre a perda de 11 familiares para a Covid-19 e o uso da medicina tradicional.

Situação alarmante

Segundo Milena, os casos de Covid-19 têm uma situação mais alarmante em Tabatinga (AM), devido a falta de estrutura do hospital local, administrado pelo Exército Brasileiro.

“Meu povo está morrendo e nós continuamos pedindo socorro, porque eles deixam para transferir o paciente quando ele não tem mais chances”, alertou.

Para o procurador da Federação Kokama e presidente da Comissão da Agricultura Familiar da Ordem dos Advogados do Brasil seccional Amazonas (OAB/AM), advogado Serafim Taveira, tanto os povos indígenas que vivem nas aldeias quanto os que vivem na zona urbana precisam ter suas carências supridas, com um atendimento à saúde de uma forma mais completa.

Advogado Serafim Taveira (Divulgação/Redes Sociais)

“Um questionamento que é constante, diz respeito ao atendimento insuficiente e sem estrutura adequada ao tratamento dos índios aldeados, e o completo abandono daqueles que vivem em um contexto urbano”, disse.

Segundo ele, o governo federal apoiou a criação da ala indígena no Hospital Nilton Lins em Manaus e agora editou a PORTARIA Nº 1.429, DE 27 DE MAIO DE 2020, que possibilita a habilitação de estabelecimento de saúde ao recebimento do Incentivo para a Atenção Especializada aos Povos Indígenas – IAE-PI e estabelece recurso do Bloco de Manutenção das Ações e Serviços Públicos de Saúde – Grupo de Atenção Especializada, a ser incorporado ao limite financeiro de Média e Alta Complexidade – MAC do Estado do Amazonas e Municípios, que, para Taveira, é um avanço necessário.

“Esperamos que o governo do Estado e Municípios façam algo que seja efetivo a partir de agora em relação a saúde de todos os seus cidadãos e ao que nos compete pedir, uma melhoria efetiva e real na questão da saúde dos povos indígenas ainda durante a pandemia e que seja algo continuado”, enfatizou o advogado.