Pesquisadores afirmam que Manaus pode atingir imunidade coletiva da Covid-19 antes do previsto

Casos confirmados de Covid-19 ultrapassam 130 mil casos nesta sexta-feira, diz FVS-AM (Reprodução/Internet)

06 de agosto de 2020

16:08

Da Revista Cenarium*

MANAUS – Um estudo da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) divulgado nesta quinta-feira, 6, reforça que dados da Fundação de Vigilância em Saúde (FVS-AM) demonstram que a hipótese da imunidade coletiva ao novo Coronavírus em Manaus pode estar mais próxima do que o previsto.

O grupo coordenado pela biomatemática portuguesa Gabriela Gomes que também inclui pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), foi um dos primeiros a apontar nessa direção, com base em projeções feitas por um modelo matemático que leva em conta o fato de que os indivíduos de uma população têm diferentes graus de suscetibilidade e de exposição ao vírus.

“Chegamos à conclusão de que essa heterogeneidade pode alterar muito os resultados e em um sentido positivo. A epidemia deve ser menor do que o previsto pelos modelos homogêneos [que não consideram os diferentes níveis de suscetibilidade e exposição entre os indivíduos] e o limiar da imunidade coletiva também deverá ser menor do que aquele que os modelos clássicos indicam”, afirmou a especialista.

Gabriela ressaltou, no entanto, que alcançar o limiar de imunidade coletiva não significa o fim imediato da epidemia. Como as cadeias de transmissão já estão instaladas na população, é esperado que o número de casos acumulados continue a crescer, ainda que de forma mais lenta, podendo chegar ao dobro do que foi registrado no pico da curva epidêmica.

“Com uma mitigação cuidadosa podemos fazer com que a diferença entre o número de infecções existentes quando o limiar de imunidade coletiva foi atingido e o tamanho final da epidemia seja menor. Para isso é preciso controlar os surtos que vão surgindo de forma localizada e adotar medidas como o rastreamento de contato”, disse.

Mais definições

Para o infectologista Júlio Croda, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), somente a imunidade coletiva poderia explicar por que os Estados do Norte, Nordeste e a capital fluminense – mesmo sem um distanciamento social efetivo – apresentam hoje uma taxa de contágio inferior a 1. Ele ressalta, no entanto, que a imunidade de rebanho não deve ser adotada como política pública, pois nenhum sistema de saúde é capaz de ofertar a quantidade de leitos de terapia intensiva necessária para enfrentar a primeira onda da doença sem medidas de mitigação.

“Manaus teve o maior excesso de óbitos entre todas as cidades do Brasil, chegou a 500%. Foram registradas em 2020 cinco vezes mais mortes que nos anos anteriores – 90% delas por causas respiratórias. O caso do Amazonas nos permite entender como seria a história natural da doença. Mas não estamos propondo isso como estratégia. É a constatação de uma tragédia. Temos de aprender com os dados reais”, defendeu Croda.

Descarte da Tese

Anteriormente, o líder da pesquisa e doutorando em biologia pelo Inpa, Lucas Ferrante, justifica que esse declínio do número de internações é resultante do isolamento social, que apesar de não ter sido mais rigoroso, suavizou a curva projetada anteriormente. Ele também critica o método cientifico utilizado pela Ufam, que por meio do projeto Atlas de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), afirmou que Manaus seria a primeira capital do País a vencer a crise sanitária.

“Nas próximas duas semanas vamos observar um aumento do número de casos confirmados e mortes. No entanto, é importante ressaltar que pesquisas como as da ODS Ufam, são ‘super desconcentradas’, e não detém qualidade científica para serem divulgadas à população. Não é plausível afirmar que o vírus está se tornando mais fraco, sem verificar as variações genéticas dele. O crescimento exponencial de novos casos vai acontecer em Manaus, assim como em outras capitais que aderiram à reabertura do comércio. A preocupação aqui se dará pelo colapso dos leitos na capital em conjunto com interior”, alerta.  

O estudo contemplou pesquisadores da INPA, Ufam, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Escola de Tecnologia da Universidade do Estado do Amazonas (EST-UEA) e outros colaboradores externos. O estudo em questão foi encomendado pelo MP-AM e não sustentava a reabertura de atividades, pelo contrario, defendia um isolamento mais rígido por um período de duas semanas.

Tese logística

Segundo o coordenador do boletim elaborado pelo Atlas ODS Amazonas, Henrique Pereira, por conta da evolução do vírus, não haveriam possibilidades de uma segunda onda de contaminação de Covid-19 à curto prazo, fato que faria da capital amazonense a primeira cidade do país a superar a crise.

“Todos os vírus estão competindo para se reproduzir, os menos virulentos, ganham vantagem porque se transmite em maior frequência e, depois de certo tempo, interagindo com a população hospedeira, se tornam maioria”, defendeu.

Para chegar a essa conclusão, formada pelos pesquisadores Henrique Pereira, Danilo Egle e Bruno Lorenzi, usou o modelo logístico, e não epidemiológico, para prever taxas de crescimento de casos e de óbitos.

A projeção estima que o 97% das mortes por Covid-19 deve ocorrer até o dia 17 deste mês. Pereira ressaltou que a hipótese, não deve ser confundida com a imunização de rebanho, onde quase toda a população já teria tido contato com o vírus.

(*) Gisele Coutinho sob a supervisão de Carolina Givoni