‘Precisamos revitalizar nossa história’, diz vencedora do prêmio ‘Pesquisador Ciência na Escola’, no AM

14 de novembro de 2021

13:11

Bruno Pacheco – Da Revista Cenarium

MANAUS – A professora de Biologia do Instituto de Educação do Amazonas (IEA) Márcia de Castro Gomes idealizou o projeto “Revitalizando a história no jardim: um olhar sobre a medicina cabocla”, vencedor da categoria Ciências Biológicas na primeira edição do “Prêmio Fapeam de Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I)”, da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), realizada na sexta-feira, 12, em sessão pelo canal do YouTube da instituição.

Márcia venceu na categoria Pesquisador Ciência na Escola, Ciências Biológicas

Visando a revitalizar a história do IEA, por meio do conhecimento tradicional com as plantações influenciado pela religiosidade e fé dos ancestrais, o projeto pretende evitar o esquecimento das riquezas naturais da floresta e garantir o conhecimento desse bem entre os alunos. A iniciativa começou a ser elaborada no terreno, em 2019, quando o horto botânico não era utilizado. À época, a área foi vandalizada, fato que causou uma repercussão negativa à escola e fez a educadora renovar o espaço.

“Aluno é aluno. Temos os dedicados à escola, mas também temos aqueles que, de um modo ou de outro, acabam querendo chamar a atenção e nós sabemos disso. Quem é educador, sabe essa realidade. Não adianta querermos padronizar de acordo com um só comportamento, pois eles não são robôs. Cada um tem sua realidade e história, e algumas são difíceis, que resultam em comportamentos inadequados, inapropriados e, infelizmente, de vandalismo”, lamentou a professora.

Márcia Gomes é chamada carinhosamente de professora “Marcinha”. (Bruno Pacheco/Revista Cenarium)

Para Márcia Gomes, a professora “Marcinha”, como é chamada carinhosamente pelos alunos, o grande terreno vandalizado precisava ser revitalizado, pois ali tem histórias de gerações de alunos da escola centenária. “Uma história que precisa ser lembrada, ter sua referência, seu lugar de volta à nossa atenção e aos nossos cuidados, porque a gente sabe que um povo sem história, que não a conhece, é um povo fadado ao insucesso. E nós temos a necessidade de revitalizarmos a nossa história”, contou.

Conhecimento familiar

Na família de Márcia, a sabedoria sobre as plantas medicinais no cuidar da saúde foi repassada de geração em geração. Segundo a professora, a avó dela era uma pessoa de muita fé e uma grande rezadeira, ou seja, uma mulher que fazia rezas com o objetivo de curar doenças e “afastar o mal”. Além disso, a matriarca tinha um grande conhecimento sobre o poder medicinal das plantas.

Segundo Márcia, o conhecimento sobre a utilização medicinal das plantas foi repassado de geração em geração na família dela. (Arquivo Pessoal/Reprodução)

“Ela sabia para que servia cada planta. Não era só você pegar e fazer esses preparos, pois ela, ligada à fé, fazia suas orações e era algo bastante ancestral. Sabemos que a medicina da floresta é a natureza, as plantas, e hoje temos muitas plantas industrializadas, mas que saíram justamente aqui do nosso laboratório natural, que é a Amazônia. E eu via minha avó fazendo isso, chegávamos a comentar em casa quem herdaria o legado dela, esse conhecimento, foi quando percebi que a geração presente não sabe dessa sabedoria, a riqueza que nós temos naturalmente, o que me preocupou e me fez unir a situação de revitalizar o jardim, trazer nossa história e valorizar essa medicina cabocla”, detalhou.

Desenvolvimento

Quando começaram as inscrições para o Prêmio Fapeam, lembra a professora, ela comentou com o irmão, o professor universitário Eduardo de Castro Gomes, sobre a vontade dela elaborar a iniciativa, e ele a orientou sobre como desenvolver o projeto. Márcia destaca, ainda, que teve como orientadores os professores de Química e Física, Claudenor e Fernanda.

Márcia com o irmão, Eduardo Gomes. (Arquivo Pessoal/Reprodução)

“Nesse período, tive apoio dos alunos finalistas do terceiro ano, em 2019, que foram espetaculares. Expliquei a ideia do projeto e eles abraçaram a iniciativa. Chamei os três bolsistas, a Liriel, a Wendy e o Francimir, juntamente com a turma toda, para arrumar o jardim. Fizemos todo um processo de limpeza, junto com professores amigos de trabalho, para darmos vida ao jardim, pois não era só um projeto de ciências biológicas da professora Márcia, era uma iniciativa que poderia ser utilizada por todas as disciplinas e trazer benefícios à comunidade. Foi uma grande mobilização, um processo muito bom e animador”, relatou.

Em meio ao início da pandemia da Covid-19, em 2020, as atividades do projeto precisaram ser pausadas. Por conta da ausência dos alunos e de profissionais da educação na escola, não era possível dar andamento aos cuidados com as plantas. Somente em agosto do ano passado, a iniciativa voltou a ser desenvolvida. “Mesmo com esse retorno, teve a parte híbrida. Os alunos não eram os mesmos, pois eles já haviam se formado. Ou seja, tudo que tinha sido planejado, teve que mudar. Em 2020, foi tudo mais difícil”, lembrou.

Orgulhosa ao afirmar que ainda em 2021 conta com o apoio dos alunos formados em 2019, a professora Márcia Gomes inscreveu o projeto no Prêmio Fapeam e acredita ter chegado ao objetivo da iniciativa: fazer o encontro do presente com o passado para valorizar a cultura amazônica, num momento em que o mundo mais precisou da atuação da medicina. “É gratificante. O projeto está surtindo efeito porque é, justamente, esse encontro do presente com o passado. O passado instruindo o presente, ajudando a preservar, orientando e valorizando a nossa cultura, nossa riqueza natural da Floresta Amazônica”, enfatizou.

Márcia Gomes com parte dos alunos do Instituto de Educação do Amazonas que colaboraram com o projeto. (Arquivo Pessoal/Reprodução)

“Agradeço a todos. Este ano, infelizmente, a minha mãe, Maria Ivanilda, foi vítima de Covid-19 e, tenho certeza, que ela está ali torcendo por mim no céu. Sempre ofereci essa conquista a tudo que aprendi com ela e com minha avó. E a emoção duplica, porque não é só um prêmio, é o reconhecimento de um trabalho, um projeto que eu fiz não pensando em ganhar uma bolsa da Fapeam ou um prêmio, mas de revitalizar e dar um novo norte a uma realidade”, concluiu.

Márcia Gomes com a mãe, Maria Ivanilda, vítima da Covid-19, em 2021. (Arquivo Pessoal/Reprodução)

Prêmio Fapeam

O prêmio Fapeam condecora pesquisadores, profissionais de comunicação e professores pela relevante atuação em prol do conhecimento científico, tecnológico, inovativo, social, ambiental e desenvolvimento econômico no âmbito do Programa Ciência na Escola (PCE), no Amazonas. A iniciativa conta com o apoio do governador Wilson Lima, que disponibilizou um total de R$ 248.160 para financiar os projetos, reconhecendo e valorizando os trabalhos da classe de pesquisadores da educação básica.

De acordo com o resultado da análise das propostas aprovadas pelo Comitê de Especialistas no âmbito do Prêmio Fapeam de Ciência, Tecnologia e Inovação – Chamada Pública nº 001/2021, um total de 30 profissionais foram classificados para concorrer ao prêmio nas categorias: Pesquisador Destaque; Pesquisador Inovador; Profissional de Comunicação e Pesquisador Ciência na Escola. 

Os primeiros colocados nas categorias Pesquisador Destaque e Pesquisador Inovador recebem: troféu e três meses de bolsa no valor de R$ 5.720,00; o 1º colocado na categoria Profissional de Comunicação: troféu e três meses de bolsa no valor R$ 1.650,00; o 1º colocado na categoria Pesquisador Ciência na Escola ganha troféu e três meses de bolsa no valor de R$ 1.650,00.

Veja o momento em que a professora Márcia Gomes foi escolhida vencedora do Pesquisador Ciência na Escola, categorias Ciências Biológicas, da Fapeam: