Transporte, moradia e alimentação mais caros em dezembro comprometem orçamento de fim de ano

Os setores de transporte, moradia e alimentação, com os quais as famílias mais gastam no fim de ano, puxaram o maior encarecimento do IPCA dos últimos seis anos. (Reprodução/ Internet)

23 de dezembro de 2021

17:12

Iury Lima — Da Revista Cenarium

VILHENA (RO) — As contas do fim de ano, já infladas pelas comemorações, devem fechar ainda mais altas no orçamento dos brasileiros, principalmente para quem vive de um salário mínimo. Isso porque o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) fechou dezembro com alta anual acumulada em 10,42%, o maior patamar desde 2015. Por outro lado, o índice relativo apenas ao mês de dezembro, de 0,78%, foi 0,39 ponto porcentual (p.p) inferior ao de novembro deste mesmo ano (1,17%). Mesmo assim, os setores de transporte, moradia e alimentação, com os quais as famílias mais gastam no fim de ano, puxaram o maior encarecimento do IPCA dos últimos seis anos.

Divulgados nesta sexta-feira, 23, os números fazem parte do levantamento mensal feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Economista avalia tendência de aumento como volta do ‘fantasma da inflação’. (Agência Brasil)

Trindade da carestia

Não é novidade que o IPCA vá às alturas por influência do encarecimento destes mesmos três grupos de serviços. Desta vez, o principal encarecimento ocorreu no setor de Transportes, atingindo a forma de locomoção das pessoas, sendo que a justificativa foram os constantes reajustes no preço dos combustíveis, especialmente da gasolina. O acumulado de janeiro a dezembro atingiu 21,35%. Para se ter uma ideia, a gasolina sofreu 16 alterações de preço ao longo do ano, mas apenas cinco delas significaram reduções. A alta acumulada é de 68,6%, segundo dados da Petrobras.

Na sequência, abaixo dos Transportes, os grupos de serviços de Habitação, Alimentação e Bebidas, tiveram, até o presente mês, alta acumulada de 14,67% e 8,68%, respectivamente. Já as variações dos dois, apenas em dezembro, foram de 0,90% e 0,35%. 

Por outro lado, apenas os setores de Saúde e cuidados pessoais e Educação tiveram índices favoráveis à realidade econômica do País; o primeiro teve queda de 0,73%, enquanto o segundo se manteve estável.

Mais uma vez, morar, comer e se locomover ficou ainda mais caro, no Brasil. (Fonte: IBGE/Arte: Isabelle Chaves)

Fantasma da inflação

Ao avaliar os novos índices do IPCA, a economista e vice-presidente do Conselho Federal de Economia (Cofecon), Denise Kassama, lamenta ao dizer que este é sintoma da volta de um velho e temido conhecido do bolso do brasileiro, que assolou a Nação entre as décadas de 1980 e 1990. “Sim, o fantasma da inflação volta a nos assustar. Tudo fica mais caro, menos o nosso salário. Ou seja, há uma perda do poder aquisitivo do brasileiro, atingindo de forma mais cruel o bolso dos que ganham um salário mínimo ou menos”, afirmou a especialista, em entrevista à CENARIUM. “Quanto menor a renda, maior o impacto”, acrescentou. 

Kassama também explica que esta é uma tendência, sendo que a alta em diversos tipos de produtos, bem como as carnes, grãos e combustíveis, ocorre há pelo menos dois anos consecutivos, além da influência do dólar sobre o real. 

“A alta do dólar estimulou os produtores a venderem seus produtos no mercado internacional, onde os ganhos foram maiores, sobrando bem menos para o mercado interno. Demanda constante, menor oferta, aumento de preços. Combustíveis também subiram no mercado internacional, contribuindo para alta do produto no Brasil, que importa boa parte deste insumo. E quando sobe combustível, sobe praticamente tudo: fretes, transportes e tudo que dele deriva”, detalhou a economista.

Alternativas

Uma das saídas para as contas ainda mais salgadas de dezembro seria a utilização dos recursos distribuídos pelo pagamento do 13º salário, mas isso apenas no caso daqueles que contam com contrato formal de trabalho e direitos reconhecidos. 

De acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), em 2021, o pagamento do benefício deve representar a injeção de R$232,6 bilhões na economia, o equivalente a 2,7% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. “Entretanto, em um País onde a informalidade representa quase 50% do PIB e o desemprego na casa dos 15%, muitos brasileiros não contam com essa opção”, ponderou Denise Kassama.

Ainda segundo a especialista, para conter as altas, o governo federal “usou o remédio padrão”, ou seja, a promoção da alta dos juros com o propósito de reduzir o consumo. “Um remédio amargo, com pouca eficácia, pois não estamos em uma inflação de demanda,  aquela provocada pelo aumento do consumo. Assim acaba impactando quem ganha menos, além de não resolver a questão da inflação, que continua alta”, concluiu.