Vazante revela cenário desolador de rio amazônico tomado pelo lixo

Seca do Rio Negro transforma paisagem amazônica (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)

07 de outubro de 2020

20:10

Náferson Cruz – Revista Cenarium

IRANDUBA – Com a seca, o volume de água do Rio Negro começa a mudar o cenário em algumas áreas da Região Metropolitana de Manaus. No distrito do Cacau Pirêra, pertencente ao município de Iranduba, a 25 quilômetros de Manaus, garrafas, sacolas plásticas e muito lixo dividem espaço entre os flutuantes, transformando a bela paisagem em depósito de resíduos.

Entretanto, o que mais chama atenção são crianças que brincam de aprender no lixo ou aprendem enquanto brincam em meio ao descarte dos outros. A imagem foi captada pela lente sensível do fotógrafo Ricardo Oliveira, da REVISTA CENARIUM.

Crianças brincam em ambiente tomado por lixo (Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)

No curto período de tempo que a equipe permaneceu na localidade, duas horas, era comum avistar crianças, perante aos olhos de seus familiares, em suas inocentes brincadeiras diante de um cenário desolador em meio ao lixo e próximo ao fio de água do leito seco do rio.

Enquanto os pequenos se divertiam empinando papagaio, brincando de bola e correndo atrás de animais, os adultos relatavam seus anseios de dias melhores.

Crianças se divertem correrndo atrás de porcos (Ricardo Oliveira/ Revista Cenarium)

Morador da localidade, Romualdo Silveira, de 33 anos, conta que o convívio de quem reside nos flutuantes não é dos melhores, pela falta de assistência básica por parte do poder público, porém, fica bem melhor durante o ciclo da estiagem, quando há circulação das pessoas pelo local. Segundo ele, no período da enchente a locomoção das pessoas fica impossível, somente com canoas.

“Eu prefiro quando o rio está seco a enchente. Temos mais dificuldade quando o rio sobe, pois só podemos sair de casa nas canoas. Temos esperança que as coisas melhorem para todos que moram nos flutuantes”, disse Ronílson, enquanto admirava o cenário do local diante de seus familiares.

Mas há quem prefere o período da cheia dos rios. “É melhor, porque temos a fartura de peixes e o lazer que é tomar banho de rio. A seca traz sujeira e essa paisagem triste”, comentou Emília Nogueira, 18, estudante.

Moradores lamentam acúmulo de lixo (Ricardo Oliveira/ Revista Cenarium)

Para a dona de casa Maria Selma da Silva, de 40 anos, a culpa do acúmulo de lixo se divide entre a população e as autoridades. “Infelizmente, tem gente que não está nem aí e joga lixo como se ele fosse desaparecer, mas não é isso o que acontece. Quando a vazante [seca] vem, ele [lixo] volta e aí fica assim. Penso que deveria haver um trabalho de conscientização maior por parte das autoridades, explicando que isso é ruim para todo mundo”, explicou.

O ex-funcionário público Dirceu Pimentel, de 65 anos, lamenta o cenário. “Passei 5 anos sem vir aqui, mas antes nunca tinha visto um cenário como esse. A gente nunca espera algo assim, fiquei assustado”, relata Pimentel, natural de Itacoatiara.

Ciclo da vazante

O início da vazante do Rio Negro iniciou em julho, segundo especialistas, durará até o final de outubro. Nesta quarta-feira, 07, a cota do rio foi registrada em 17,18 metros. Na última semana, o ‘Negro’ estava baixando quinze centímetros por dia, em média.

Em comparação com o mesmo período do ano passado, o Rio Negro estava com 20,07 metros, uma diferença de 2,89 m. De acordo com o engenheiro do Porto de Manaus, Valderino Pereira, a vazante deste ano não irá se comparar com a de 2010, a maior da história, quando o Rio Negro ficou com apenas 13,63 m de profundidade.

Apesar do pouco volume de chuva, o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) informa que ainda é cedo para prever uma seca recorde na região.