‘Violência está bem mais próxima’, diz criminalista sobre execução em frente ao Fórum Henoch Reis, em Manaus

Matheus Danilo Barros Dias, 27 anos, foi executado a tiros por membros de facção rival em Manaus Foto: Ricardo Oliveira/Cenarium

06 de janeiro de 2022

19:01


Maria Luiza Dacio – Da Revista Cenarium

MANAUS — Matheus Danilo Barros Dias, 27 anos, foi executado a tiros na tarde desta quinta-feira, 6, por membros de uma facção criminosa, enquanto estava a caminho da audiência de custódia no Fórum Ministro Henoch Reis, bairro Adrianopólis, zona Centro-Sul de Manaus. O jovem foi preso durante a noite de quarta-feira, 5, por policiais do 1º Distrito Integrado de Polícia (DIP). Com ele, outros dois suspeitos portando duas pistolas, munição, dinheiro e joias também foram detidos.

De acordo com informações da Polícia Civil, o trio teria cometido uma tentativa de homicídio no Prosamim do Mestre Chico, zona Sul, e teve a ação impedida por policiais. Nesta tarde, aproximadamente às 14h30, seriam apresentados para audiência de custódia, mas tiveram a viatura policial interceptada por outros dois carros e foram fuzilados.

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Trio teria cometido uma tentativa de homicídio no Prosamim do Mestre Chico, zona Sul de Manaus. (Foto: Ricardo Oliveira)

Matheus tinha processos de homicídio simples, porte ilegal de armas, tráfico de drogas em Manaus e também no município de Iranduba. Patrick Regis de Sena e Antônio Marlon Silva dos Santos são os dois outros suspeitos presos que sobreviveram e foram levados ao hospital ainda como vida.

Ação ousada

Para o advogado Christhian Naranjo, a novidade desta ação é a ousadia, o avanço de praticar o crime violento. “Ao lado do Fórum de Justiça, na presença de policiais, constituindo uma grande afronta ao Poder Judiciário e à polícia, o que inegavelmente aumenta a percepção de que a violência está bem mais próxima do que jamais esteve antes”, afirma.

A história letal de Matheus não é exceção. Para o sociólogo e professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam) Gilson Gil, o tráfico surge como uma opção de “emprego” e de “carreira”. “Especialmente em um momento de desemprego e inflação como o atual”, explica.

Mais perto

“O tráfico aponta um caminho para esses jovens. Um dinheiro fácil e imediato. No Amazonas, penso não haver, ainda, uma estabilidade entre os grupos. É muito dinheiro envolvido e o Amazonas é um ponto central de passagem para as drogas. Se os governos não oferecerem opções de emprego e renda aos jovens, esse movimento só aumentará e as facções crescerão mais e mais”, completa o sociólogo.

A guerra entre essas facções tem um objetivo principal: o poder sob o tráfico de drogas. Um estudo de 2021 do Fórum Brasileiro de Segurança Pública aponta que na última década, enquanto a taxa de mortalidade brasileira foi de 23,9 mortes a cada 100 mil habitantes, nos Estados da Amazônia ficou em 29,6. Amapá (41,7), Acre (32,9) e Pará (32,5) se destacaram entre os mais letais. Pelo menos 20 facções com base prisional atuam em território amazônico, revela o levantamento.

O professor defende também que as facções têm de ser reprimidas. “E isso também pode ser feito asfixiando suas transações econômicas, vigiando fronteiras e rios, enfim, impedindo esse comércio. Nos bairros, além da vigilância, é preciso orientar e mapear os jovens, evitando que entrem nas facções. Impedir que milícias sejam criadas nos bairros”, frisou Gilson.


Para o sociólogo, outras soluções seriam: controlar a lavagem de dinheiro, evitar a circulação financeira, quebrar as cadeias de comando das facções, evitar contatos nacionais e regionais, e impedir que se organizem. Outras opções seriam urbanizar bairros e ruas, evitando locais ermos e abandonados, oferecendo opções de lazer e ocupação aos jovens.

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Um dos suspeitos deixou o local ainda com vida. (Foto: Ricardo Oliveira)

Guerra antiga

Os impactos dessa guerra são fortemente sentidos e vivenciados pela sociedade. Prova recente foram as cenas de terror que a capital amazonense viveu nos dias 5 e 6 de junho de 2021, onde uma ‘onda’ de ataques foram registrados em diversos bairros. Ônibus incendiados, agências bancárias atacadas e até mesmo obras públicas viraram alvos de facções após mortes entre rivais e aliados.

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Na ocasião, a Secretaria de Segurança Pública (SSP-AM) afirmou que os ataques eram uma represália dos criminosos pela morte de um traficante conhecido como ‘Dadinho’ e o próprio secretário de Segurança Pública à época, coronel Louismar Bonates, reconheceu que a ordem dos ataques partiu de dentro do presídio. E essas ordenanças não são novidades.

O professor lembra que o judiciário é peça central nesse assunto. “Processos longos, prisões cheias, culpados liberados. Ele (o judiciário) é uma peça importante para que se resolva definitivamente isso. Evitar que nas prisões os bandidos de periculosidades diversas se unam e incrementar penas alternativas poderiam ajudar os mais jovens”, sugeriu.

“O Ministério Público também ajudaria centrando fogo nas ações de lavagem de dinheiro, nas ações de inteligência, a fim de asfixiar a circulação de recursos”, disse.