Obra de condomínio de luxo é paralisada pela Justiça após danos a residências vizinhas

Obras de empreendimento afetam diretamente moradores do entorno (Foto: Alan Geissler / Revista Cenarium Amazônia)

02 de janeiro de 2024

15:01

João Felipe Serrão – Da Agência Amazônia

MANAUS (AM) – A Justiça do Amazonas determinou a suspensão das obras de um condomínio de luxo localizado no bairro Flores, Zona Centro-Sul de Manaus, sob responsabilidade da Construtora Colmeia. A decisão foi motivada por danos registrados em residências nas proximidades da construção. No último Natal, em 25 de dezembro, pelo menos cinco casas do conjunto Duque de Caxias foram atingidas por uma enxurrada após uma forte chuva. A água invadiu as casas e deixou um cenário de destruição. Segundo o judiciário, houve omissão do município no processo de liberação e fiscalização do empreendimento.

A hipótese dos moradores é que o fenômeno tem relação com o desmatamento realizado para a construção do residencial. Eles afirmam que a área não é de risco e que as inundações começaram depois que a construtora desmatou cerca de 2,3 hectares de mata nativa de um terreno localizado atrás das casas. Mas enquanto isso não é confirmado por estudos técnicos, a Justiça decidiu paralisar o empreendimento, para minimizar o risco de novos acidentes na região.

Imagem aérea mostra área desmatada (Foto: Alan Geissler / Revista Cenarium Amazônia)

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A Defensoria Pública ingressou com ação judicial pedindo medidas de contenção no canteiro de obras do empreendimento Le Jardin, incluindo um levantamento pericial da obra e dos imóveis afetados. Além disso, o órgão pediu o pagamento de aluguel e ajuda de custo para famílias afetadas, e a suspensão da licença de construção do empreendimento.

Por entender que apenas o último pedido se trata de uma questão de urgência, a Justiça concedeu decisão liminar que, além de embargar a construção, pediu o cancelamento da licença para construção do empreendimento.

Representação digital do imóvel em construção (Foto: Divulgação / Construtora Colmeia)
Omissão

Na decisão, o juiz Moacir Pereira Batista registrou que “com forte provas de vídeos e fotos, vislumbro os referidos requisitos, mormente pelo risco de novos danos e por ter sido omisso o município e a Implurb em fiscalizar ou não observar no projeto da obra ao conceder o licenciamento.”

Ao determinar a suspensão da obra e do licenciamento, a Justiça aciona a Prefeitura de Manaus e pede que a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas) apure se houve infração administrativa; que a Defesa Civil analise a necessidade de interditar a região no entorno do empreendimento e ainda que a Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania (Semasc) atue para conceder aluguel social, se for o caso.

Na semana passada, a Defesa Civil já havia alertado que a obra era irregular, momento em que encaminhou o caso ao Instituto Municipal de Planejamento Urbano (Implurb). Por sua vez, na ocasião, o instituto afirmou que o empreendimento era regular no órgão.

A Prefeitura de Manaus informou que foi notificada na manhã desta terça-feira, 2, e que adotará “as medidas processuais pertinentes dentro do prazo estabelecido pelo Judiciário”.

Confira a decisão judicial na íntegra.

Moradores

A gerente de produção Suane Viana foi uma das pessoas que teve a casa afetada pela obra. A casa dela foi atingida por uma infiltração de água no dia 11 de dezembro, data em que a empresa suprimiu a vegetação nativa da área.

De acordo com Suane, embora a decisão da Justiça represente uma vitória para os moradores, o medo de dias chuvosos continua, pelo risco de novas inundações.

“Nós enfim estamos sendo ouvidos, nos deixa de certa forma aliviados, mesmo com a tensão que estamos vivendo. Até o momento, a empresa Colmeia não tem prestado nenhum tipo de suporte, tampouco tomado ações eficazes a fim de evitar reincidências do ocorrido. Nós estamos ainda correndo riscos, temendo inclusive por desbarrancamentos mais altos”, afirmou Suane.

Moradores lamentam prejuízos após desmatamento para construção de condomínio (Foto: Ricardo Oliveira / Amazônia)

O educador físico Rafael Silva foi quem teve a casa com maior estrago causado pela chuva do dia 25 de dezembro. Ele teve perda total dos bens como carro, moto, eletrodomésticos e móveis e afirma que, nos últimos dias, tem investido dinheiro do próprio bolso para custear a recuperação de seus bens. Ele criticou a postura da construtora, que, de acordo com ele, tem sido omissa na prestação de socorro às vítimas.

“Eles têm nos ignorado. Eles estão brincando com as nossas vidas, não estão preocupados com o ser humano. A Colmeia não está interessada em soluções e buscar melhorias nessa obra. A gente precisa de justiça. No meu caso, que perdi tudo, não me foi prestado nenhum socorro. Por conta desse desmatamento, eu acabei no Natal acordando com minha casa ficando debaixo d’água, levando todas as minhas coisas”, disse Rafael.

Vizinha ao empreendimento em construção, residência do educador físico Rafael Silva teve muro destruído por enxurrada (26.dez.23 – Ricardo Oliveira/Revista Cenarium Amazônia)
O que diz a empresa

Em nota enviada à REVISTA CENARIUM, a Colmeia afirmou que “a empresa até o momento não recebeu nenhuma notificação sobre o embargo da obra” e que, após conhecer os autos do processo, poderá se pronunciar sobre os fatos.

Em outra nota enviada anteriormente à imprensa, a empresa disse que “não existe relação entre a causa das inundações e as obras do empreendimento Le Jardin“.

Ainda segundo a empresa, “todos os estudos técnicos necessários à implantação do empreendimento foram realizados, assim como, toda a documentação da obra está de acordo com a legislação e todos os pré-requisitos ambientais foram seguidos e atendidos de acordo com os poderes concedentes”.

Editado por Yana Lima

Revisado por Gustavo Gilona