ANP ignora MPF e mantém leilão para exploração de gás e petróleo no Amazonas

Campo do Azulão, operado pela Eneva (Foto: Divulgação/Eneva)

13 de dezembro de 2023

15:12

Yana Lima – Da Agência Amazônia

MANAUS (AM) – Mesmo com recomendação contrária do Ministério Público Federal (MPF), a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) manteve leilão de blocos para exploração de gás e petróleo na Bacia do Amazonas, em áreas que interferem em terras indígenas. O consórcio formado pela Eneva (80%) e Atem (20%) arrematou a área de acumulação marginal de Japiim, nos municípios de São Sebastião do Uatumã e Urucará, a 227 quilômetros leste da cidade de Manaus. A área está inserida na Floresta Amazônica, e seus poços se encontram na margem de braços do Rio Maripá.

Após o leilão, o MPF pediu explicações da ANP, nesta terça-feira, 12, para que a agência se manifeste sobre a manutenção dos blocos exploratórios da Bacia do Amazonas no processo, mesmo diante de uma recomendação que pede a exclusão, desde 2015. O MPF solicitou manifestação em cinco dias.

UTE Jaguatirica 2, na Bacia do Amazonas (Reprodução)
Desde 2015, o MPF recomenda que a ANP exclua blocos situados na bacia Amazônica (Foto: Reprodução)

Leia a recomendação na íntegra:

Eneva

Eneva S/A, que arrematou a maior parte do consórcio, é responsável pela Unidade de Tratamento de Gás (UTG) Azulão, localizada no município de Silves, no interior do Amazonas, primeira área produtora de gás na Bacia do Amazonas. A atuação da empresa na região tem sido alvo de denúncias, devido aos impactos ambientais e relação conflituosa com povos tradicionais.



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Durante o 4º Ciclo da Oferta Permanente, pelo regime de concessão, o consórcio pagou um bônus de assinatura de apenas R$ 165 mil (o mínimo era de R$ 160 mil) e não teve concorrência. O investimento previsto na área é de R$ 1,2 milhão. A área de Japiim tem uma superfície total de 52 quilômetros quadrados. Estas acumulações marginais são áreas inativas onde a produção de petróleo foi interrompida ou considerada como não rentável por petroleiras.

Especialistas ouvidos pelo Broadcast (do Grupo Estado) chegaram a apontar que os setores na Bacia da Foz do Amazonas não receberiam ofertas em função das dificuldades de obtenção de licença ambiental na região, como ocorreu com a Petrobras na Foz do Amazonas.

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Segundo o MPF, nesse novo ciclo, além dos blocos já ofertados anteriormente, foram incluídos blocos que estavam “em audiência” à época da realização do laudo técnico que subsidiou recomendação emitida em 2015. Dos sete blocos previstos na recomendação, quatro estão entre os novamente ofertados no 4º Ciclo.

O laudo técnico indica interferências de diversos blocos em oferta com terras indígenas e unidades de conservação, somando 42 interferências, segundo o MPF.

Ilustração presente em laudo técnico do MPF mostra localização geográfica de blocos exploratórios (Ilustração: Reprodução / MPF)

Confira a íntegra do laudo técnico:

Consulta

O MPF reforçou, ainda, que é necessário haver consulta prévia, livre e informada aos povos indígenas (e tradicionais) envolvidos, conforme previsto na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o que não se confunde com a obrigação prevista na Constituição Federal.

A Carta Magna determina que a exploração de recursos hídricos e minerais localizados em terras indígenas dependem de autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas – regulamentação que hoje não existe e, por isso, é proibida qualquer exploração mineral em território indígena no Brasil. Mesmo se os blocos não estiverem sobrepostos a terras indígenas, o fato de estarem no entorno imediato, ou a poucos metros, pode causar impactos sociais e ambientais decorrentes de atividades exploratórias”, afirma o MPF.

Impactos

O estudo que balizou a recomendação do MPF aponta que a exploração e produção de hidrocarbonetos causam impactos ao meio ambiente em todas as fases da atividade, desde a exploração, terminação, produção, transporte, até o refino. Os impactos estão relacionados principalmente à água, ar e solo.

O documento é assinado por Fábio Santos, analista do Ministério Público da União e perito em Geologia Assessoria Nacional de Perícia em Meio Ambiente. Ele aponta que as atividades de exploração e produção de petróleo são responsáveis pelos seguintes aspectos ambientais:

  • Desmatamento nas fases de exploração e transporte
  • Despejo de resíduos oleosos no solo e/ou no mar
  • Má disposição de resíduos sólidos contaminados
  • Emissão de gases
  • Geração de efluentes domésticos e despejo nas águas
  • Geração de cascalho e deposição ao redor da cabeça dos poços
  • Vazamentos de dutos e/ou tanques de armazenamento no solo e/ou no mar
  • Despejos de rejeitos do processamento industrial
  • Geração de ruídos e vibrações
  • Vazamentos ou derramamento de resíduos da lavagem dos tanques de navios petroleiros
  • Colisões entre navios e despejo de óleo bruto no mar

AGÊNCIA AMAZÔNIA entrou em contato com a ANP, por e-mail, sobre a manutenção dos blocos na bacia amazônica, e aguarda posicionamento.

Edição: Yana Lima

Revisão: Gustavo Gilona