Assistência a comunidades isoladas da Amazônia é preenchida por ONGs na pandemia

Projeto encabeçado pela artista Márcia Novo se concentra em comunidades próximas à capital amazonense. (Arquivo Pessoal)

10 de maio de 2020

19:05

Nícolas Marreco – Da Revista Cenarium

Sem um plano de contingência do Governo Federal, as lacunas da assistência aos indígenas, aldeados ou não, em meio à pandemia são tapadas, muitas vezes, por instituições do terceiro setor. O acesso à comida, saúde básica, incluindo kits de higiene para prevenção, já é escasso nas rotinas habituais. Com a Covid-19, Organizações Não Governamentais, associações e projetos pessoais formam um braço importante pela proteção à vida dos nativos.

Todos os links de doações das instituições estão embutidos no texto abaixo.

A cantora Márcia Novo, amiga de comunidades indígenas nos arredores de Manaus, tem mobilizado contatos próximos para fazer cotinhas e doações às tribos. A terceira entrega de itens, feita nesta semana para o Parque das Tribos – com mais de 3 mil moradores, aproximadamente – e na comunidade do Jurupari foi de remédios e alimentos.

“A maioria deles vive de artesanato e estão completamente sem renda. O indígena da cidade tem um problema muito sério, porque os órgãos como Casai (Casa de Saúde Indígena) e Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena) consideram indígenas apenas quem está nas aldeias. Quem vem para a cidade não tem assistência alguma. Então tem muito índio morrendo e estamos preocupados com isso”, destacou.

O projeto “Vidas Indígenas Importam” já alcançou ao menos seis comunidades, desde a chegada do novo Coronavírus. Na segunda etapa, 800 cestas básicas foram doadas, conforme a artista. Antes da entrega, o líder responsável pelos nativos é preparado para a organização do recebimento, para evitar aglomerações.

“Preparamos o líder para não evitar contato entre os contaminados e não expor quem quer ajuda. Entendemos que o depósito bancário é a melhor ajuda no momento. Tem um número que presta contas e tira todas as dúvidas para quem quer doar. Tem índio com febre, por exemplo, e não tem dinheiro para comprar os remédios, não tem nada. Se você pode fazer pouco, faça como for”, completou.

Casa do Rio

Alocada desde 2014 na região do Careiro Castanho (a 87 quilômetros de Manaus), a ONG Casa do Rio adaptou todas as atividades de educação, agroecologia e geração de renda para uma força-tarefa contra a Covid-19. O fundador, Thiago Cavalli, contou que fez um monitoramento das famílias mais vulneráveis para prioridade de atendimento.

Até agora, em quatro semanas, o grupo atingiu 1.800 famílias em quatro comunidades, com entrega de 2 toneladas de alimentos e 6 mil máscaras, além de outros insumos. “No início, enviamos informativos e modos de prevenção; montamos parceria com a FVS (Fundação de Vigilância em Saúde) para palestras.

Nos bairros, as pessoas estavam circulando sem máscaras, e também os profissionais da linha de frente. Contratamos costureiras, com envios de máquinas de costura, para quem não tinha”, relatou.

A entidade se concentra nas comunidades circundadas à rodovia BR-319. Como o Estado interrompeu a compra de insumos para a merenda escolar, Cavalli pontuou a compra de cestas desses produtores para a distribuição das famílias carentes. Uma parceria com o Itáu Social para enviar mais gêneros alimentícios também está em vias de negociação.

“A parceria apoiará 500 famílias num período determinado, e deve chegar nas próximas duas semanas. Estamos prospectando com a Brazil Foundation para as famílias vulneráveis de Manaus, no bairro da Redenção e do Parque das Tribos”, detalhou. A principal dificuldade na região foi a superlotação de famílias sem renda com pessoas perdendo emprego em Manaus e migrando para o interior.

Saúde itinerante

Cavalli avaliou que o auxílio emergencial “melhora um pouquinho”, pois não há médicos e remédios o bastante. Além disso, “os preços de itens da cesta básica aumentaram muito, alguns de 20 a 30%”. Enquanto isso, o projeto Saúde e Alegria, que atua em comunidades da Amazônia brasileira, expandiu sua rede de atendimento como prevenção e tratamento aos sintomas do coronavírus.

Existente desde 1987, originalmente concentra-se em municípios do oeste do Pará, com atividades de saúde e saneamento básico, ordenamento territorial, economia da floresta, entre outros. O coordenador Caetano Scannavino, com 32 anos de serviço, explicou o trabalho desenvolvido com comunicação educativa nas cidades, os atendimentos no navio-hospital Abaré e as doações ao Sistema Único de Saúde (SUS).

“Já estávamos trabalhando desde janeiro para as populações vulneráveis terem condições melhores no enfrentamento à pandemia. Intensificamos atividades de saneamento para as comunidades, aceleramos obras de sistemas de abastecimento para água potável nas aldeias que dependiam das águas contaminadas do rio Tapajós”, frisou.

Comunidades da bacia do rio Amazonas, do rio Arapiuns, da região do Médio Tapajós e aldeias Mundurucus estavam com obra de saneamento, com população total média de 30 mil ribeirinhos. A entrega de sabões e medicamentos em parceria com secretarias municipais de saúde se deu pelos financiamentos dos patrocinadores do projeto. Confecção de máscaras para os profissionais de saúde e entrega de alimentos e kits de higiene foram organizados com moradores das cidades.

“Fizemos entrega de EPIs, como os utilizados na Itália que reduziu em 40% a necessidade de UTIs. O clube de mães e o conselho comunitário de Alter do Chão (PA) organizaram uma rede de costureiras solidárias. Estamos com uma campanha educativa, de carimbo e programas de rádio, por exemplo, voltada para o público do interior se conscientizar. Também entramos em contato com a Ufopa (Universidade Federal do Oeste do Pará) para trabalhos com testagem rápida”, completou.