Barrada pelo STF, proibição de linguagem neutra vira bandeira de deputada bolsonarista

Deputada em primeiro mandato, Débora Menezes, do PL, apresentou um Projeto de Lei que já existe e que pode, em caso de jurisprudência, ser derrubado pelo STF (Hércules Andrade/ Reprodução)

15 de fevereiro de 2023

21:02

Mencius Melo – Da Agência Amazônia

MANAUS – Barrada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a proibição de linguagem neutra virou “bandeira” da deputada do Amazonas de primeiro mandato, Débora Menezes (PL), que no dia de sua posse, 1° de fevereiro, declarou que não priorizará a pauta indígena no Parlamento do estado com a maior população de povos originários do Brasil.

Débora apresentou o Projeto de Lei (PL) N° 99/2023 que proíbe o uso de linguagem neutra ou dialeto não binário em grade curricular, material didático de escolas públicas, privadas e em documentos oficiais de repartições públicas no Amazonas. Hoje, as escolas não possuem diretrizes para usar o dialeto e o STF derrubou uma proposta similar promulgada em Rondônia, ao entender que a lei estadual feria o direito à liberdade de expressão, previsto na Constituição Brasileira.

Decisão do STF foi publicada no site do órgão. (Reprodução/ STF)

O advogado Christian Naranjo entende que a decisão do Supremo pode ser questionada, somente, no âmbito judicial. “Tendo em vista o recente entendimento firmado pelo STF, que entendeu que normas como a proposta violam a competência legislativa da União para editar normas gerais sobre diretrizes e bases da educação, há grande chance de o tema ser objeto de questionamento em todo o País”.

A proposta de Débora Menezes “determina que nos ambientes formais de ensino e educação, é vedado o emprego de linguagem que, corrompendo as regras gramaticais, pretendam se referir a gênero neutro, inexistente na norma oficial da língua portuguesa”. Um trecho do projeto cita, ainda, que a Língua Portuguesa não deve e não pode ser utilizada por uma “militância ideológica”.

Trecho do PL apresentado por Débora Menezes (Reprodução)

Na tribuna da Assembleia Legislativa do Amazonas (Aleam), Menezes se posicionou contra a linguagem neutra. “Me posiciono contra a linguagem neutra ou binária e acredito que não pode haver espaço para confusão na mente das nossas crianças e dos nossos adolescentes”, esclareceu.

Projeto de Lei de Débora Menezes – Linguagem neutra:

Cópia

Um projeto de lei de autoria do ex-deputado estadual Fausto Junior (União Brasil), hoje deputado federal pelo Amazonas, com objeto semelhante à proposta de Débora Menezes foi apresentado em agosto de 2021 e tramita na Casa Legislativa. Em seu projeto, Fausto diz que a linguagem neutra descaracteriza a normal culta da Língua Portuguesa.

Fica vedado o uso da “linguagem neutra”, do “dialeto não binário” ou de qualquer outra que descaracterize o uso da norma culta da Língua Portuguesa na grade curricular e no material didático de instituições de ensino públicas ou privadas, em documentos oficiais das instituições de ensino, em editais de concursos públicos, assim como em ações culturais, esportivas, sociais ou publicitárias que percebam verba pública de qualquer natureza, no âmbito do Estado do Amazonas“, diz o Artigo 1° do PL.

Projeto de Lei de Fausto Júnior – Linguagem neutra:

Vazia

À REVISTA CENARIUM, a professora alfabetizadora e pedagoga Luciana Coelho Pereira, que atua na área da Educação, afirmou que a proposta de Débora Menezes é “vazia”, já que não há, em nenhuma escola, o uso da linguagem neutra.

“Em nenhuma escola há, sequer, essa discussão”, atestou. “É o mesmo povo que espalhou a fake news da cartilha do MEC que seria de incentivo ao que tanto criticam. Ouço sobre esse assunto há uns três anos, mas, não existe tal conduta nas escolas e muito menos discussão, e jamais se cogitou essa prática”, disparou.

Para a pedagoga Luciana Coelho Pereira, discussões como essas se arrastam há anos e não trazem nenhuma concretude ou contribuição para a educação (Reprodução/Arquivo Pessoal)

Jurisprudência

Na semana passada, o Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para derrubar uma lei que proíbe o uso da linguagem neutra em escolas públicas e privadas, materiais didáticos e em concursos públicos de Rondônia. A proposta era do, agora ex-deputado estadual, Sargento Eyder Brasil (PL). Inconformado, ele usou as redes sociais para criticar a comunidade LGBTQIAP+.

O ministro do STF, Edson Fachin, entende que não é competência dos Estados legislar sobre normas de ensino, e insistir no contrário é atentar contra princípios fundamentais do País (José Cruz/ Agência Brasil)

Primeiro, ele ironizou o STF. Disse que a lei foi “invalidade pelo STF” e afirmou que “agora, as escolas estaduais de RO podem usar a ‘linguagem neutra’”, usando aspas ao se referir ao dialeto. “Perdemos essa batalha, mas continuaremos na luta para defender as nossas crianças de ideologias esquerdistas”, escreveu, por fim, o ex-deputado. 

Acolhimento

Com o objetivo de acolhimento social, a linguagem não binária compreende os termos “todes”, “todxs”, “bonite”, “amigue”, “elu”, “delu”. A variação é de acordo com a preferência da pessoa a quem você se refere. Isso vai depender se ela prefere pronomes neutros ou de acordo com algum dos gêneros. Isso porque uma pessoa não binária, ou seja, de gênero neutro ou fluído, também pode adotar pronomes masculinos e/ou femininos. 

A AGÊNCIA AMAZÔNIA entrou em contato com o gabinete da deputada Débora Menezes para saber seu posicionamento, mas, até o fim desta reportagem, não obteve retorno.

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