Brasil precisa de políticas que barrem violência contra defensores de direitos humanos

A Conaq encaminhou um ofício ao governo federal em que cobra medidas efetivas e urgentes para que a segurança nos territórios seja garantida (Reprodução/Agência Brasil)

31 de agosto de 2023

13:08

Luciana Santos – Especial para Agência Amazônia**

MANAUS (AM) – A Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) encaminhou nessa quarta-feira, 30, um ofício ao governo federal em que cobra medidas efetivas e urgentes para que a segurança nos territórios seja garantida, assim como a titulação das terras, que são normalmente alvos de disputas que tem ocasionado a morte de lideranças quilombolas, como foi o caso de Mãe Bernadete Pacífico, do quilombo Pitanga dos Palmares, na Bahia, assassinada no dia 17 de agosto.

De acordo com a entidade, uma pesquisa identificou que entre as principais situações que colocam em risco a vida dessas lideranças estão: a omissão, demora e hostilidade do Estado nos processos de titulação; conflitos com pessoas com interesse nos territórios (fazendeiros, latifundiários, empresários, grileiros, etc.); falta de políticas públicas (saúde, educação, alimentação adequada, etc.); e o avanço de empreendimentos (mineração, construção de portos e estradas, etc.)

O documento cita o Censo Quilombola de 2022, que revelou que apenas 12,59% da população quilombola vive em territórios oficialmente delimitados. Segundo a Conaq, é necessário a definição de uma política de Estado (e não de governo), com planos de ação e metas, assegurando no âmbito federal, estadual e municipal estrutura administrativa e recursos para que se dê a regularização dos territórios.

Trago a iniciativa da Conaq para chamar atenção para o cenário local no que se refere às violências contra defensores de direitos humanos e à omissão do Estado. Dados fornecidos pelo Instituto Mana, que atua na execução do Programa Estadual de Proteção a Defensores de Direitos Humanos, Comunicadores e Ambientalistas (PPDDH-Amazonas), indicam um aumento significativo dos pedidos para inclusão no programa no período de setembro de 2022 a agosto de 2023. De 32 casos, o número passou a 65 e o grupo mais exposto às ameaças são os indígenas. Entre as etnias que são alvo de conflitos estão: Apurinã, Baré, Kanamari, Kokama, Maraguá, Marubo, Mura, OmáguaKambeba, Satarémawé, Tenharim e Ticuna.

Não por acaso, as quatro demandas de acolhimento provisório feitas ao PPDDH-Amazonas envolvem indígenas. São lideranças dos municípios de Jutaí, Autazes, Benjamin Constant e Silves, cujas ameaças envolvem o tráfico de drogas, piratas dos rios, missionários e empresas interessadas na exploração das riquezas naturais de áreas ainda não declaradas como territórios indígenas.

E por falar nos autores das ameaças, a lista no Amazonas tem o tráfico de drogas em primeiro lugar; seguido por pescadores; fazendeiros; invasores; e autoridades públicas e madeireiros (empatados). É interessante observar esses dados, porque o tráfico de drogas surge a partir de uma ausência do Estado; Este que possui autoridades também envolvidas nas violências contra os defensores de direitos humanos, como consta das informações repassadas. É como se existisse um pacto silencioso que vai refletir também na resolução desses crimes e na própria estrutura que a rede de proteção deveria dispor para executar plenamente seu trabalho.

E aí eu retorno ao documento elaborado pela Conaq para dizer que compartilho da ideia de que é necessária a construção de uma política de Estado que verdadeiramente proteja lideranças quilombolas, indígenas e demais defensores de direitos humanos no Brasil. Quantas outras Mães Bernadetes precisarão ser assassinadas? Definitivamente não precisamos de mais sangue derramado daqueles que apenas ousaram lutar por garantia de direitos e por um País de fato democrático.

(*) Luciana Santos é jornalista e advogada, mestre em Direito Constitucional, especialista em Direito Público, Direitos Humanos e Processo Civil, Africanidades e Cultura Afro-brasileira e possui MBA em Marketing e MBA em Gestão empresarial.
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