21 de agosto de 2023
21:08
Daleth Oliveira – Da Agência Cenarium Amazônia
BELÉM (PA) – Clientes da 123milhas, agência de viagens on-line, tiveram uma surpresa na última semana, quando a empresa anunciou que não vai emitir passagens com embarque previsto de setembro a dezembro de 2023 da linha promocional. Em Belém (PA), a pedagoga Eliana Siqueira, 60, programou uma viagem em família para Salvador (BA) para o mês de novembro e, agora, não sabe o que vai fazer com suas férias.
“Perdemos as férias e mais de R$ 6 mil. Eu sou cliente da empresa há muito tempo, viajei várias vezes com passagens promocionais e passagens regulares, nunca tive problema. Por isso, estava confiante que dessa vez daria tudo certo. Iria com meu filho, que queria comemorar seu aniversário na Bahia, e minha neta, compramos com antecedência e, agora, para comprar novas passagens, o valor está muito acima do planejado”, reclama Siqueira.
Além das passagens, Siqueira tinha gastado com hotel e passeios. Ela conta que toda a viagem estava planejada e, agora, não quer receber o reembolso da 123milhas por meio de voucher, única modalidade de devolução ofertada pela agência.
“O problema também está na falta de comunicação com a empresa. Nós não fomos notificados, as informações que temos são as que vemos na imprensa. A empresa não nos dá opção de reembolso, apenas o voucher. Não conseguimos falar com atendentes e, enfim, não sabemos mais o que fazer”, desabafa Eliana.
‘Só compro, agora, direto das companhias’, diz paraense
Também de Belém, a psicóloga Thaysse Gomes, 25, comprou as passagens promocionais da 123milhas para ir a São Paulo no mês de novembro ver o show da Taylor Swift, cantora pop norte-americana. “Comprei por R$ 750, ida e volta, o que era super em conta. Não tinha desconfianças com o serviço da empresa, porque minha tia indicou”, relata a jovem.
“Fiquei sabendo do cancelamento por uma amiga que também vai ao show. Logo fiquei desesperada, mas até agora estou sem entender direito o que aconteceu, porque não recebi nenhum e-mail cancelando. Só sei o que todo mundo está falando. O último e-mail que recebi da empresa estava, inclusive, confirmando a viagem, dizendo para esperar até dez dias antes da partida para emissão do cartão de embarque. Depois disso, não fui mais notificada”, continua Thaysse.
Após o susto, a paraense diz que foi aconselhada a processar a 123milhas, porém, ainda não pensa no assunto. A prioridade dela é entender o que está acontecendo e comprar novas passagens, mas dessa vez, direto com as companhias aéreas.
“Todo mundo aconselhou a processar a empresa, mas agora não sei se vou fazer isso, não sei se vale a pena o transtorno. Agora, vou comprar as novas passagens com as companhias porque eu não vou arriscar cair em outro golpe”, finalizou a paraense.
Prejudicial à credibilidade das agências
Na avaliação do economista Genardo Chaves de Oliveira, é justamente isso que as agências devem temer depois da repercussão do cancelamento das passagens da 123milhas. “O risco é de prejudicar a credibilidade de agências de viagens. As pessoas podem começar a comprar passagens diretamente nas companhias aéreas, o que pode levar a uma diminuição da receita das agências de viagens, pela recompra mais cara”, comenta o especialista.
“O caso da 123 milhas é um alerta para as agências de viagens. Elas precisam se esforçar para manter a credibilidade e a confiança dos clientes. Isso pode ser feito oferecendo um serviço de qualidade, preços competitivos e transparência nas informações para não prejudicar uma atividade lucrativa e um mercado aquecido”, destaca Oliveira.
Procon notifica empresa 123milhas
O Instituto de Defesa do Consumidor do Amazonas (Procon-AM) informou nesta segunda-feira, 21, que notificou a agência de viagens e que a empresa tem 48 horas após o recebimento da notificação para apresentar explicações.
“O consumidor tem direito ao reembolso da forma que ele pagou. Essa questão de disponibilizar voucher não é a opção correta. A empresa tem que dar a justa opção do cliente ser reembolsado pelo voucher, cartão de crédito ou na conta bancária indicada. Portanto, a forma de pagamento que o consumidor usou deve ser opção de reembolso“, explica Jalil Fraxe, diretor-presidente do órgão.
De acordo com o titular da pasta, a plataforma será notificada caso não conceda a opção de devolver o valor em dinheiro. O consumidor que se sentir lesado pela agência deve procurar o instituto. “Quem comprou, além das passagens, aluguel de carros, hotéis, passeios, tem direito de reivindicar, por via judicial, uma indenização“, completa.
Além do Procon do Amazonas, a mesma entidade de outros Estados anunciou notificação da 123milhas, como São Paulo, Pernambuco e Rio Grande do Sul. A Agência Cenarium Amazônia solicitou posicionamento do Procon do Pará, mas até o fechamento desta matéria não obteve retorno.
‘Não é golpe, é ato ilícito’, explica advogada
A advogada especializada em Direito do Consumidor, de Manaus (AM), Bianca Borges, explica à reportagem que, apesar da opinião pública estar tratando do caso como “golpe”, o que se pode afirmar, até então, é que se trata de um ato ilícito.
“É ilícito porque está indo contra o código de defesa do consumidor. Ora, a empresa pode oferecer voucher para os consumidores como reembolso, mas não pode oferecer apenas essa opção. Além do mais, a empresa deveria prestar o serviço contratado pelo cliente, independente do que venha acontecer. Então, de certa forma, a empresa se impediu de cumprir com sua obrigação“, detalha a advogada.
Bianca aconselha que os consumidores que não aceitarem o voucher devem procurar ajuda especializada. “Busquem um advogado e solicitem o ajuizamento de uma ação judicial para restituir o valor pago e possíveis danos morais. Vocês também podem procurar o Procon do seu Estado para proceder com uma reclamação formal“, indica a especialista.
‘Voucher afronta direito do consumidor’, afirma advogado
De Belém, o advogado especialista em Direito do Consumidor, Kristofferson Andrade, defende que o voucher oferecido pela 123milhas é uma afronta ao Código de Defesa do Consumidor (CDC). “A agência colocou de forma arbitrária, sendo que a lei é clara que cabe ao consumidor a escolha sobre a devolução integral do valor que pagou, seja em dinheiro, emissão de passagem ou aceitação do voucher“, argumenta.
Kristofferson indica que, antes de notificar a empresa judicialmente ou pelo Procon, os consumidores que não aceitarem a proposta de reembolso devem primeiro encaminhar um e-mail ou entrar em contato com o Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) ou qualquer canal oficial da agência informando o não aceite, informando que quer o dinheiro de volta.
“Depois disso, dê um prazo de sete a dez dias. Passado esse prazo, pode ou procurar o Procon, ou ingressar judicialmente, lembrando que não é obrigado a passar pelo Procon para depois ingressar com ação judicial. Pode se ingressar com ação judicial e depois fazer o registro junto ao Procon. Nisso, é bom levar documentação das passagens que comprou e qualquer outro gasto que venha ocorrer com o cancelamento, para que se ingresse também em uma ação por dano moral“, finaliza o advogado.