Consumo excessivo e inflação contribuem para maior número de endividados em 12 anos

Pagamento em cartão. (Marcelo Camargo/ Agência Brasil)

05 de abril de 2022

12:04

Marcela Leiros – Da Revista Cenarium

MANAUS — O número de endividados no Brasil chegou ao maior patamar em 12 anos, com 77,5% das famílias com o “nome sujo”. Isso é o que indica a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Diante desse grande montante, a CENARIUM conversou com especialistas que indicam que o hábito das famílias de consumirem além da renda, somado à inflação, estão colocando os brasileiros em “maus lençóis”.

A pesquisa considera dívidas a vencer gastos com cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, crédito consignado, empréstimo pessoal, prestação de carro e de casa. Os dados são referentes ao mês de março e, segundo a confederação, esse é o maior valor no índice nos últimos 12 anos. De acordo com a Peic, há um ano, a proporção dos endividados era de 67,3%, 10,2 pontos abaixo do percentual atual.

À CENARIUM, o psicólogo Calvino Camargo analisou a relação de consumo das famílias brasileiras, lembrando que a questão é como as famílias relacionam o que recebem por mês com aquilo que compram.

“O endividamento das famílias brasileiras hoje tem a ver com o quanto elas recebem não é suficiente para o custeio das necessidades cotidianas: alimentação, moradia etc. Agora a gente tem uma classe média com uma certa disponibilidade para o consumo aleatório, sobre o que não precisa e o que não está planejado. Isso é um fato psicológico importante. Ele, de certa maneira, contribui para um tipo de consumo sem planejamento”, explicou.

“O mercado foca em pessoas com condições de consumir. E a situação atual é uma diminuição do ganho de classe C. Você tem uma expectativa de consumo, mas não tem condições de manter”, pontuou ainda.

Endividado

As dívidas complicaram a vida do designer Thiago Alencar. Em 2019, ele fez um empréstimo de R$ 5 mil para ajudar a mãe, mas ficou desempregado e o pagamento do compromisso teve que ficar para depois. Hoje, o valor devido está em R$ 20 mil.

“Na época eu era funcionário público comissionado e contava que não fosse demitido. Mas com a troca de governo que teve naquele mesmo ano, fui demitido e já sabia que a minha mãe não iria conseguir me ajudar com as parcelas do empréstimo. Para piorar, eu apenas fui conseguir um emprego no final do mesmo ano e assim eu já estava com uns meses devendo”, contou ele.

“Quando comecei a pensar que ia conseguir começar a pagar, ‘estourou’ a pandemia e fiquei desempregado novamente. Vale ressaltar que na época do empréstimo também estava pagando Fies [Sistema de Financiamento Estudantil] que atualmente também estou devendo”, acrescentou.

Renda versus inflação

A economista Denise Kassama lembra que a renda dos brasileiros no 1º trimestre de 2022, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), caiu 9,7 % em relação ao mesmo período do ano passado, e 1,1% em relação ao trimestre anterior. E ainda há a inflação acumulada em mais de 10%. “É quase um milagre achar alguém que não esteja com algum tipo de dívida”, disse ela.

Kassama deu dicas, às famílias, para colocarem as contas em dias. “É preciso entender que a renda da família reduziu e se adequar a nova realidade. Avaliar todos os gastos da família e organizá-los por ordem de prioridades. Por exemplo, compra de bens alimentícios deve estar a frente de jantares fora de casa e, por último, analisar os gastos e como reduzi-los para se adequarem a realidade da renda da família”, explicou.