Em nova missão em Rondônia, ONG Doutores da Amazônia já atendeu mais de 1,2 mil indígenas

Pelo menos 1.230 integrantes de povos originários já foram contemplados pela ação destinada a 12 comunidades (Doutores da Amazônia/Reprodução)

20 de outubro de 2022

22:10

Iury Lima – Da AGÊNCIA AMAZÔNIA

VILHENA (RO) – De volta ao Estado de Rondônia, a organização não governamental Doutores da Amazônia aposta na ciência para prestar o que há de mais moderno em tratamentos de saúde para populações indígenas. A ONG superou, nesta quinta-feira, 20, quinto dia de missão, a meta de atendimentos: pelo menos 1.230 integrantes de povos originários já foram contemplados com vários tipos de procedimentos.

A ação, que conta com 35 voluntários, acontece em parceria com o Distrito Especial de Saúde Indígena (Dsei) de Vilhena (RO), além de empresas e entidades como a Fundação Nacional do Índio (Funai) e a Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, que é referência em Rondônia na proteção dos povos da floresta. Os indígenas receberam procedimentos odontológicos, consultas médicas, atendimento psicológico, assistência farmacêutica e de enfermagem, além de fisioterapia e outros serviços.

Ação conta com 35 voluntários e atende a 12 etnias indígenas de Rondônia (Doutores da Amazônia/Reprodução)

Os atendimentos vão até o próximo sábado, 22, contemplando, especialmente, a moradores da Terra indígena Sete de Setembro, onde ficam 28 aldeias da etnia Paiter Suruí, entre os municípios de Cacoal, no interior de Rondônia, e Rondolândia, em Mato Grosso. É tudo de graça e aberto para outros 11 grupos étnicos, como os povos Aikanã, Apurinã, Arara, Cinta Larga, Akuntsú, Nambiquara e outros.

Ciência rompendo fronteiras

“A parceria com os Doutores da Amazônia para o povo Paiter Suruí é algo muito importante”, destaca o cacique geral Almir Suruí. Ele conta que entre as principais carências dos quase 1.800 habitantes do território estão “a necessidade emergencial de atendimentos dentários e exames oftalmológicos” e que, com as várias outras especialidades dos voluntários da ONG, todos estão muito satisfeitos.

Cacique geral do Povo Paiter Suruí, Almir Suruí comemora a parceria que dura há quase uma década (Doutores da Amazônia/Reprodução)

Os Doutores da Amazônia levam a prestação de saúde como o principal pilar da causa voluntária. Por isso, eles atendem a esta região do Estado, com visitas feitas, pelo menos, uma vez a cada ano, além de rodar a Amazônia Legal. Só em Rondônia, eles atuam há pelo menos oito anos.

A possibilidade de romper barreiras, por meio da ciência, é o que move, por exemplo, a dentista Sônia Casanova. “Estamos, mais uma vez, trazendo tecnologia de ponta para o tratamento dos indígenas”, expressou com alegria. Ela utiliza um equipamento conhecido como CAD/CAM, “o que se tem de melhor em termos de próteses”, explica a voluntária. Com essa tecnologia, ela pode melhorar o design e a criação de próteses e restaurações dentárias.

“A gente consegue, então, fazer uma reabilitação, fazer prevenção, fazer tratamento de canal. Também usamos sistema de ‘raio-x’ com endodontia mecanizada (…) O que mais me seduz, além de trazer saúde para um povo que tem uma dificuldade muito grande de chegar até os grandes centros para encontrar tratamento, é a tecnologia, a ciência, o fato de podermos trazer o melhor. A ciência pode chegar em qualquer lugar. Com o nível de tecnologia e de desenvolvimento que nós temos hoje, conseguimos chegar em qualquer lugar, até mesmo no meio da Amazônia”, ressaltou Casanova.

Voluntária da organização, Sônia Casanova explica como o CAD/CAM auxilia em restaurações e agiliza a produção de próteses (Doutores da Amazônia/Reprodução)

Com outros equipamentos, como uma máquina fresadora, também levada para TI Sete de Setembro, que permite dar acabamento a peças com alta precisão, os especialistas encurtam o tempo de produção das próteses. O que levaria até três dias para moldagem e produção em laboratório é resolvido em questão de até 15 minutos.

Máquina fresadora reduz produção de próteses de três dias para 15 minutos, na TI Sete de Setembro, em Rondônia (Doutores da Amazônia/Reprodução)

Difícil acesso à saúde

Localizada na zona rural de Cacoal, município a quase 500 quilômetros de Porto Velho, é na Aldeia Lapetanha onde as ações se concentram nesta nova missão. A cidade até tem aeroporto, mas os Doutores da Amazônia encaram uma viagem de ônibus de, aproximadamente, 10 horas para conseguir prestar os serviços gratuitos. Uma dificuldade sofrida, diariamente, por quem adoece nas aldeias do interior de Rondônia: deslocamento e vagas em hospitais.

“Eles [os indígenas] têm que ter essa oportunidade e a gente precisa ter um olhar especial para eles. A luta deles é desigual, quando, basicamente, são pouco mais de 840 mil indígenas [em todo o País], diante de cerca de 209 milhões de brasileiros. Então, o olhar precisa ser focado para essa região amazônica, essa região onde a dificuldade de conseguir um atendimento de saúde é muito grande”, declarou o presidente da ONG Doutores da Amazônia, Caio Machado.

Médico e fundador da ONG, Caio Machado ressalta como as ações promovidas pelos voluntários provam ao poder público a possibilidade de revolucionar a saúde indígena (Doutores da Amazônia/Reprodução)

“Quando promovemos saúde nessas regiões, conseguimos provar ao poder público que, em pleno século 21, é possível, sim, desenvolver atendimento de qualidade. Com a saúde, a gente também vai conseguir preservar a Amazônia, porque sem saúde ninguém faz nada”, acrescentou Machado.

Ações para o futuro

Além de já ter atendido a mais de mil indígenas, conforme a meta original, os médicos voluntários entregaram, nesta semana, mais de 400 óculos de grau para aqueles com algum problema na visão, após realização de exames oftalmológicos. Mas não para por aí. Outra previsão é de formalizar uma parceria, por intermédio da ONG, com o Hospital de Amor, com sede em São Paulo, voltado à prevenção e tratamento de câncer.

“Para dar continuidade desse projeto, estamos tentando fazer um termo de cooperação e estamos dialogando, na tentativa de trazer esse hospital para dentro de alguma aldeia da Terra Indígena Sete de Setembro. Será um momento histórico, onde a parceria vai trabalhar para melhorar a saúde dos povos indígenas na Amazônia”, revelou Almir Suruí.

Lideranças Paiter Suruí agradecem pela assistência voluntária da organização na TI Sete de Setembro (Doutores da Amazônia/Reprodução)

A organização

Chamada, inicialmente, de Doutores sem Fronteiras, a organização não governamental foi fundada pelo médico Caio Machado, em 2014, depois que ele participou de ações em comunidades ribeirinhas de Porto Velho. O objetivo segue o mesmo, desde então: transformar o acesso à saúde indígena brasileira, respeitando a ancestralidade, cultura e valores passados de geração a geração pelos povos nativos.

Hoje, a ONG, além de realizar missões por toda a Amazônia Legal, oferece atendimentos de telemedicina, algo que foi muito importante, inclusive, no período mais crítico da pandemia de Covid-19, quando a maioria das TIs aderiram ao isolamento voluntário e absoluto por falta de assistência do governo federal.

Na bagagem, já são quase 30 missões realizadas em terras indígenas de difícil acesso, no bioma amazônico, totalizando 291 dias de incursão, com mais de 15 mil procedimentos médicos e 31 mil procedimentos odontológicos, por exemplo. Um total de 64 mil ações gratuitas.

Saiba mais sobre atuação da ONG durante a pandemia

Reportagem produzida em 2020 pela TV Suruí, de Rondônia, em parceria com a TV Cultura de São Paulo (Reprodução/TV Cultura)