Invasores sobrevoam área de indígenas isolados em Roraima para sondar riquezas

Indígenas isolados que vivem no Estado de Roraima (Leo Otero/MPI)

15 de novembro de 2023

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Winicyus Gonçalves – Da Agência Cenarium Amazônia

BOA VISTA (RR) – Invasores do território Yanomami, em Roraima, fizeram um vídeo durante sobrevoo ilegal de helicóptero a uma região habitada por indígenas Moxihatëtëa, que são isolados. O post no TikTok teve como título “índios canibais em Roraima” e foi publicado na segunda-feira, 13, mas foi apagado. Apesar disso, o registro foi feito pela Urihi Associação Yanomami, que pede providências do governo federal.

A lei brasileira protege, de forma especial, os indígenas que nunca tiveram contato ou são de recente contato com não indígenas. Segundo a Fundação Nacional dos Povos Originários (Funai), existem ao menos 114 grupos isolados no Brasil, a grande maioria na Amazônia. Nas imagens, ao menos dois homens falam sobre os indígenas, que estariam lançando flechas contra a aeronave. Um deles diz: “bando de viado (…) olha lá os canibal [sic] para quem nunca viu”. O vídeo foi compartilhado pelo presidente da Urihi Associação Yanomami no Twitter. Veja abaixo:

Os Moxihatëtëa vivem em total isolamento, sem contato com outros indígenas ou não indígenas, e sobrevivem exclusivamente do que cultivam e caçam na floresta. Apesar de não terem contato com os demais Yanomami, eles são considerados um subgrupo da mesma etnia, porque possuem o mesmo tronco linguístico e chegaram a ser dados como extintos nos anos 1990.

A existência do grupo foi confirmada em um sobrevoo em meados de 2006. As primeiras fotografias da comunidade foram divulgadas em novembro de 2016, após um sobrevoo na região realizado pela Funai.

A partir dali, a Funai passou a monitorar este povo. Hoje, a maior ameaça aos Moxihatëtëma é a proximidade com os garimpos ilegais. Na região do Alto Catrimani 1, onde fica a aldeia Moxihatëtëma, já houve relatos de que rotas que dão acesso às áreas de exploração de ouro foram abertas a 15 quilômetros da aldeia. As rotas abrem espaço para a entrada de maquinário pesado, como retroescavadeiras que estavam a serviço do garimpo.

Região onde fica os Moxihatëtëa, no território Yanomami (Guilherme Gnipper/FPEYY/Funai)
Cobranças

A Urihi Associação Yanomami cobrou proteção ao povo em ofício enviado, hoje, à Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), aos ministérios dos Direitos Humanos e dos Povos Indígenas, à Polícia Federal (PF), ao Ministério Público Federal (MPF) e ao Exército. Segundo Júnior Herukari Yanomami, o povo Moxihatëtëa não mantém contato com não indígenas, nem sequer com outros indígenas Yanomami. Um eventual contato deles com não indígenas poderia resultar em uma tragédia.

“O garimpo na Terra Yanomami ganha contornos ainda mais sensíveis, tendo em vista o risco de dizimação ou genocídio do grupo isolado, sendo imprescindível que as agências federais, conjuntamente com a atuação de coordenação, articulação e cooperação da União Federal, mobilize forças de comando e controle de diferentes ministérios para apoio ao exercício de poder de polícia ambiental e socioambiental requerido”, afirmou Herukari em nota.

No documento, eles reconhecem que o Governo Lula deu início à operação de desintrusão do garimpo ilegal, mas cobram mais ações para retirada dos invasores da Terra Indígena Yanomami. “Ocorre que, não obstante o êxito da operação em impedir a expansão das atividades de mineração, conforme demonstra a redução de alertas, a morosidade da expulsão de garimpeiros nas regiões mais isoladas do território tem sujeitado suas comunidades à violência de criminosos, inclusive, com indígenas isolados, como o grupo Moxihatëtëa“, finaliza.

Maior território indígena do Brasil, a Terra Indígena Yanomami passa por uma grave crise humanitária e sanitária em que dezenas de adultos e crianças sofrem com desnutrição grave e malária. Desde o dia 20 de janeiro, a região está em emergência de saúde pública. Alvo há décadas de garimpeiros ilegais, a região enfrentou, nos últimos anos, o avanço desenfreado da atividade ilegal no território. Em 2022, a devastação chegou a 54% – cenário que tem mudado com as ações deflagradas desde janeiro deste ano.

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Editado por Jefferson Ramos
Revisado por Adriana Gonzaga