Lideranças indígenas mudam estratégia de mobilização contra o ‘Marco Temporal’

Temas universais como 'Democracia' e 'Meio Ambiente' entram na pauta do movimento indígena brasileiro na luta contra o 'Marco Temporal' (Alass Derivas/Reprodução)

22 de maio de 2023

20:05

Mencius Melo – Da Agência Amazônia

MANAUS – A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) lançou o tema de mobilização e mudou a estratégia para a semana decisiva de julgamento da tese do “Marco Temporal” que será julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 7 de junho em Brasília. Com a temática: “Pela justiça climática, pelo futuro do planeta, pelas vidas indígenas, pela democracia, pelo direito originário/ancestral, pelo fim do genocídio, pelo direito à vida, por demarcação já: Não ao Marco Temporal!”, a Apib concentrou, entre os dias 5 e 8 de junho, a mobilização no Distrito Federal que, até então, encerraria no dia 9 de junho.

A coordenadora-executiva da Apib pela Comissão Guarani Yvyrupa, Juliana Kerexu, explicou que a concentração em três dias e o lançamento do tema são elementos de reforço na luta contra a tese do Marco Temporal.

Não há justiça climática e futuro do planeta sem demarcação dos territórios ancestrais. Isso porque somos nós, povos indígenas, os verdadeiros guardiões das florestas. O “Marco Temporal” ignora a nossa existência antes de 1988 e coloca em risco a vida da população originária e de toda a humanidade”, declarou.

Povos indígenas voltam a Brasília para a vigília durante o julgamento do ‘Marco Temporal’ (Carl de Souza/AFP)

Em entrevista à REVISTA CENARIUM, o antropólogo Alvatir Carolino comentou a iniciativa da luta contra o “Marco Temporal”. “Por algum tempo, a percepção de preservação de meio ambiente foi vinculada à ideia de natureza intocada. Um exemplo disso é o Parque Yellowstone, nos EUA, que foi despovoado de suas populações originárias para que a biodiversidade daquele local fosse preservada. A questão é que o domínio cultural dos ecossistemas está posto antes mesmo do saber ocidental se firmar. São os saberes dos povos indígenas que nos mostram como conviver sem destruir a natureza“, observou.

Novas diretrizes

Para o antropólogo, ao adotar um tema de agenda local e universal, a Apib acerta politicamente. “Quando os indígenas assumem um discurso que está na macropolítica mundial, como é a questão climática, democracia, configurações de Estados modernos, é uma ideia acertada por parte do movimento indígena brasileiro. Democracia e meio ambiente são dois temas mundiais, hoje, e isso coloca o movimento em total sintonia. Esse posicionamento pode surtir efeito sobre o pensamento e as decisões jurídicas, como a questão do ‘Marco Temporal'”, ponderou Alvatir.

Movimento Acampamento Terra Livre se tornou uma das maiores mobilizações de povos originários no mundo (Reprodução/Poder360)

Tudo o que se busca, hoje, de equilíbrio com a natureza, está contido na música de Caetano, ‘O Índio’, onde ele diz que o ‘obvio sempre esteve oculto’, no sentido de que a sociedade ocidental não olhou com os devidos olhos para a forma de como os indígenas convivem milenarmente com a natureza, porque tudo o que se busca, hoje, de equilíbrio na relação econômica de produção, na relação com o planeta, isso já é cotidiano na vida desses povos, como forma de ciência milenar”, finalizou.