Mulher de 77 anos relata constrangimento ao pular catraca de ônibus em Manaus

Diariamente, centenas de idosos usam o transporte coletivo para suprir necessidades de deslocamentos nas grandes cidades. (Reprodução/Internet)

21 de março de 2023

12:03

Mencius Melo – Da Agência Amazônia

MANAUS – “Nunca imaginei que eu, aos 77 anos, teria que pular uma catraca de ônibus“. Assim, a professora aposentada Wilma Bezerra de Sena, moradora do bairro Planalto, Zona Oeste de Manaus, relata o constrangimento que passou em um ônibus do sistema de transporte público lotado.

O caso ocorreu há mais de um mês e a mesma fez a denúncia em forma de reclamação ao órgão responsável por fiscalizar as empresas do segmento, o Instituto Municipal de Mobilidade Urbana (IMMU), mas não obteve retorno até o momento da publicação desta matéria.

Wilma faz parte dos 210 mil pessoas que vivem em Manaus, acima dos 60 anos, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE, que têm o direito de usar gratuitamente o transporte público, segundo o artigo 261 da Lei Orgânica do Município de Manaus (Loman). Na capital amazonense, as pessoas acima de 60 anos correspondem a 23% dos 550 mil usuários do transporte público, na capital do Amazonas.

Dentre elas, Wilma Sena relatou: “Fiz parada em frente ao supermercado onde faço compras. Eu estava com volumes na mão e, ao parar, o motorista não abriu a porta da frente, tive que entrar pela porta de trás“, contou. “Quando entrei, passei a sacola para a cadeira da frente e pedi ao cobrador e ao motorista que o ônibus parasse para eu sair e entrar pela porta da frente“.

A mulher continuou o relato do momento tenso pelo qual passou no ônibus: “Pedi por favor, falei da lei, e quando vi que nada seria feito, decidi pular a catraca. O ônibus estava em movimento e eu fiquei com medo de cair, as pessoas gritavam dentro do ônibus: ‘Ela vai cair! Ela vai cair! Alguém me apoiou e, assim, consegui passar. O motorista e o cobrador agiram como se nada estivesse acontecendo”, afirmou Wilma. Ainda segundo a mulher, é recorrente ser maltratada em um transporte público na capital, mas a indignação bateu dessa vez: “Tiro por menos, mas dessa vez foi um absurdo!”, pontuou ela.

Wilma Sena optou por não divulgar sua imagem e também preferiu não citar a linha e nem a empresa de ônibus onde ocorreu o incidente. Ela alegou medo de retaliação: “Vivemos em um mundo tão violento, tão cheio de retaliações, que o fato de eu ter dado meu nome, já acho um comprometimento. Não estou dando essa entrevista esperando punir alguém, sei que emprego está difícil. Só acho que as empresas têm que capacitar melhor seus funcionários, eles são seres humanos que também têm problemas, mas, isso não dá direito de maltratarem os usuários. Prefiro não me expor”, considerou.

Além das dificuldades naturais de locomoção, por conta da idade, muitas pessoas acima de 60 anos enfrentam as limitações provocadas pela falta de estruturas de acessibilidade (Reprodução/seculodiario)

Empatia

Wilma Sena revelou à reportagem que sabe dirigir, mas não usa automóvel por pensar no próximo. “Eu sei dirigir e sou habilitada, mas só uso carro quando vou para a estrada, para o sítio que fica localizado em ramal”, falou. Questionada de por que não usar o carro na cidade, ela deu uma resposta humana. “Meu filho, tenho labirintite e, uma vez, caí na rua durante uma crise, agora, imagina se isso acontece comigo no volante? Vou matar alguém. Não posso fazer isso”, declarou.

Mesmo pensando no próximo, a aposentada não teve o mesmo tratamento no ônibus. “Eu estava lá, pendurada, e quase ninguém se mexeu ou tomou atitude“, lamentou. “Eu ando muito de ônibus, teve um dia que peguei 18 coletivos e eu não conheço um professor aposentando que não ajude um neto, um filho, com o que ganha de aposentadoria, e eu acho um desrespeito um idoso entrar em ônibus e ter jovens ocupando lugares destinados a idosos, homens com saúde, inclusive. É um desrespeito“, criticou.

De acordo com a assessoria do IMMU, a Prefeitura de Manaus segue um protocolo para equacionar situações como a que aconteceu com a aposentada Wilma Sena. “O departamento de educação para o trânsito, do IMMU, junto às empresas, tem um programa de palestras, anualmente, voltadas não só aos idosos, mas a outros públicos como os apenados, por exemplo. As próprias empresas também têm essas políticas de recapacitação”, explicou a assessoria.

A assessoria do IMMU ressalta, ainda, que há palestras e orientações programadas durante todo o ano, intensificadas, especialmente, em campanhas como “Maio Amarelo” e “Dia do Idoso”, relacionadas aos processos de atendimento ao idoso e PCDs. Há também os serviços fiscalizadores. “As denúncias são feitas pelo “Disk Transporte 118″. Com os dados necessários para verificação, fazemos o procedimento de confirmação e, se confirmado, damos a devida advertência ou punição ao profissional. Isso inclui denúncia relacionada não só ao atendimento, mas também queima de parada, horário etc…”, detalhou.

Estimativa

Wilma Sena faz parte de um universo em crescimento no Brasil. De acordo com o IBGE, o País possui cerca de 19 milhões de pessoas, com 60 anos ou mais, o que representa mais de 10% da população brasileira. Estudos indicam que esse contingente atingirá 32 milhões, em 2025, segundo estimativas.

A taxa colocará o Brasil como o sexto em número de pessoas com mais de 60 anos no mundo. Na realidade social brasileira, esse é o grupo etário que mais cresce no País, exigindo readequações infraestruturais, urbanas, programas e projetos sociais para uma população cada vez mais idosa.

Recente pesquisa do IBGE apresenta os números de idosos na cidade de Manaus, capital do Amazonas. Até 2025 esse número tende a aumentar (Divulgação/Assessoria-IBGE)