‘Não se faz política sem nossos corpos’, diz ministra da Igualdade Racial em evento da Abraji

A palestra intitulada 'Da periferia ao Palácio do Planalto: ministra Anielle Franco e o combate à desigualdade racial' (Márcia Guimarães/Revista Cenarium)

29 de junho de 2023

19:06

Márcia Guimarães – Da Agência Amazônia

SÃO PAULO – “Não dá para fazer política sem os nossos corpos estarem lá”, disse a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, ao falar sobre a ocupação de espaços de poder por negros como ferramenta de prevenção e enfrentamento ao racismo e de construção da equidade racial no Brasil. Nesta quinta-feira, 29, Franco participou da entrevista no primeiro dia do Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, em São Paulo.

A palestra intitulada “Da periferia ao Palácio do Planalto: ministra Anielle Franco e o combate à desigualdade racial” foi realizada no congresso promovido pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), e segue até domingo, dia 2, com a participação da REVISTA CENARIUM na composição de três mesas.

A ministra Anielle Franco em discurso na Abraji (Márcia Guimarães/Revista Cenarium)

Durante a entrevista, mediada pela analista de política Basília Rodrigues e pela jornalista do Estadão Verifica e diretora da Abraji, Gabi Coelho, a ministra Anielle Franco respondeu a questionamentos sobre a inclusão do negro na seara política e lembrou críticas que têm ouvido sobre não haver negros preparados para ocupar espaços de comando nos ministérios e no primeiro escalão do governo federal.

“Eles insistem em dizer que esse lugar não é para a gente e quem chega [aos lugares] e permanece não é visibilizado”, afirmou, ao lembrar que, após as críticas, o ministério abriu um canal via e-mail para o recebimento de currículos que, segundo ela, têm chegado aos milhares, com informações de profissionais de diversas áreas de atuação.

Narrativas antirracistas

Para a ministra, é necessário reforçar e difundir narrativas antirracistas, falar com as pessoas em todas as comunidades e regiões do País para começar a construir uma sociedade mais humana e democrática. “A gente tem que pensar em eleger pessoas como a gente [negros]. Por isso, precisamos falar com as pessoas, falar das nossas narrativas”, disse.

Anielle Franco também falou sobre questões como violência política, principalmente, a sofrida por negros nos espaços de poder e lembrou de situações como uma conversa que teve com a deputada federal Benedita da Silva (PT), em que a parlamentar afirmou que sofre violência política há 40 anos e não sabia como nomear, e do caso da ex-deputada federal Áurea Carolina, que decidiu não se candidatar à reeleição.

“É um lugar adoecedor”, afirmou. “A política não vai mudar. Vamos continuar passando por assédio, enquanto a gente não se impuser e disser que não vamos mudar para caber na política, que eles é que têm que mudar. A gente precisa normalizar a política mais humana”, concluiu.

A palestra intitulada ‘Da periferia ao Palácio do Planalto: ministra Anielle Franco e o combate à desigualdade racial’ (Márcia Guimarães/Revista Cenarium)
Marielle Franco

A ministra também voltou a falar que a irmã dela, Marielle Franco, assassinada em 2018, quando era vereadora do Rio Janeiro, também foi vítima de violência política antes e depois de morta e relatou como as notícias falsas disseminadas após o assassinato impactaram a vida de sua família.

De acordo com ela, a primeira fake news disseminada logo após a morte de Marielle era a foto de uma mulher no colo de um homem com uma mensagem que afirmava que a então vereadora havia sido financiada por um traficante.

“Isso foi aumentando de uma forma, [a ponto] de eu andar na rua, em 2018 ainda, e as pessoas cuspirem na minha cara”, disse, contando ainda, à época, que foi demitida de três escolas onde trabalhava por conta da associação falsa com o tráfico de drogas. “Enquanto estiver nesse lugar, enquanto tiver sangue correndo nas minhas veias, vou defender a memória da minha irmã, porque a gente tem que parar de criminalizar as pessoas que vêm da favela”, afirmou.

Retomadas

A ministra também respondeu a questionamentos sobre a retomada da pauta da igualdade racial como um ministério do governo federal sobre o balanço dos primeiros seis meses de atuação na pasta e ações futuras.

“Os primeiros seis meses foram para arrumar a casa e, ao mesmo tempo, atender às emergências do povo preto, que é de 58% da população”. Anielle destacou ainda que tem buscado trabalhar as ações do Ministério da Igualdade Racial de forma transversal, buscando parcerias com os demais ministérios para atuação em frente ampla.

“Não dá para separar a pauta do povo negro da pauta indígena. Acredito muito nessa luta conjunta. Toda vez que falamos sobre política pública para negros, falamos sobre mulheres indígenas também. Isso, no âmbito das mulheres, não tem como separar”, disse.

Mesas de discussão

REVISTA CENARIUM participa de três mesas de discussão no 18° Congresso da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). Este é o segundo ano consecutivo que o veículo de comunicação integra o evento.

O fotojornalista Ricardo Oliveira participará da palestra “Bastidores de reportagens sobre uma Amazônia em ebulição“, no dia 1° de julho, das 11h30 às 13h. Ele e o repórter Thalys Alcântara, do Metrópoles, irão falar sobre as investigações do recrutamento de meninos indígenas para um grupo islâmico e a exploração de trabalhadores em carvoarias na Amazônia, com mediação da diretora da Abraji, Thays Lavor.

Também no dia 1°, a correspondente da CENARIUM no Pará, Daleth Oliveira, participa da palestra “Jornalismo investigativo local a serviço das cidades“, ao lado da fundadora do Marco Zero Conteúdo e professora da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), Carolina Monteiro; do jornalista e criador do site Vocativo.com, Fred Santana; e do repórter do Matinal do Rio Grande do Sul Pedro Nakamura, com mediação do professor e jornalista Antonio Rocha Filho.

A CEO da CENARIUM, Paula Litaiff, vai compor a terceira mesa, ainda no dia 1°, representando o veículo de notícias na palestra “O 8 de janeiro pegou a imprensa de surpresa?”, com a repórter da Revista Piauí, Ana Clara Costa; o presidente da ONG Repórter Brasil e colunista do UOL, Leonardo Sakamoto; e a diretora-executiva do site de notícias Metrópoles, Lilian Tahan.

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