No AM, polícia prende segundo envolvido em tentativa de homicídio contra casal homoafetivo

Emanuel Medeiros e o marido, Jonas Nogueira Júnior, 25, foram vítimas de homofobia (Reprodução)

08 de fevereiro de 2022

20:02

Ívina Garcia – Da Revista Cenarium

MANAUS – “Nos sentimos mais seguros, porém ainda é bem difícil conviver com os danos físicos, financeiros e principalmente psicológicos que sofremos”, a declaração é de Emanuel Medeiros Marinho de Almeida, 25, vítima de homofobia praticada em setembro de 2021, em Manaus, ao saber que o segundo suspeito, um homem de 34 anos, que estava sendo procurado pela polícia, foi localizado na tarde dessa segunda-feira, 7.

Preso desde o dia 1º de fevereiro por tráfico de drogas, o suspeito também responderá pelo crime de tentativa de duplo homicídio com agravo da Lei do Racismo. Segundo o delegado Marcos Arruda, o mandado de prisão foi expedido no dia 2 de outubro e a decisão judicial em nome do indivíduo foi cumprida em uma unidade prisional da capital, onde ele se encontrava custodiado.

“Tomamos conhecimento de que o infrator estava preso desde o dia 1º de fevereiro, pelo cometimento do delito, momento em que nos dirigimos até a localidade para cumprir o mandado”, explicou.

Primeiro suspeito preso

O suspeito de efetuar os disparos contra um casal, um homem de 42 anos, foi preso ainda em outubro do ano passado, em sua residência, localizada no bairro Lago Azul, Zona Norte de Manaus. Ele também foi indiciado por tentativa de duplo homicídio qualificado, combinado com a Lei do Racismo, onde se enquadram casos de homofobia.

Entenda o caso

Emanuel estava com seu marido, Jonas Nogueira Júnior, 25, chegando em uma praça, localizada no conjunto Eldorado, no Bairro Parque 10 de Novembro, zona Sul da capital. O casal estava em uma moto, estacionando no local, quando foram abordados por um homem que começou a xingar o casal. Durante os ataques, uma mulher, acompanhante do homem que fazia os xingamentos, avisou ao casal para terem cuidado pois o homem estava armado.

Com medo, Jonas e Emanuel saíram do local e foram para uma delegacia mais próxima para registrar o boletim de ocorrência, quando um segundo homem iniciou os xingamentos, entrou no carro e começou a seguir o casal. Quando os dois pararam em uma esquina para fazer o retorno, o homem de dentro do carro atirou contra o casal. Um dos disparos pegou no ombro de Emanuel, mas Jonas foi quem foi mais atingido, tendo o pulmão e a axila atingidos pelos disparos e precisou ficar dez dias internado.

Nasceu de novo

Atingido no pulmão, Jonas é o que mais carrega sequelas do atentado. No próximo dia 17 de fevereiro, ele faz aniversário de 26 anos e pretende comemorar o renascimento. “O desejo dele é de celebrar a vida e agradecer a Deus pela proteção”, diz o esposo.

“As marcas que ficaram no corpo dele fazem muito mal a ele, por serem uma lembrança da violência e da noite em que ele quase perdeu a vida”. Jonas permanece fazendo exames físicos para assegurar a melhora na função pulmonar. Todos esses exames estão sendo realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas as consultas com psicólogos e psiquiatras têm saído do bolso do casal. “Jonas está bem, ele voltou a trabalhar, só está muito afetado psicologicamente. Não recebemos nenhuma assistência, pagamos a terapia com nosso dinheiro.” explica Emanuel.

Com a prisão dos indivíduos, Emanuel acredita que a polícia tenha feito o trabalho com todo o empenho, principalmente pela repercussão do caso. “Sobre o atentado, não há muito o declarar, infelizmente isso não é uma exceção no Brasil. Essa é a realidade que nós, da comunidade LGBTQIA+, vivemos todos os dias, principalmente a letra T (trans e travestis), que é a mais afetada por essa violência.”

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Violência contra LGBTI+

Entre janeiro e agosto de 2021, de acordo com dados do Observatório de Mortes Violentas de LGBTI+ no Brasil, coordenado pela Acontece Arte e Política LGBTI+ e Grupo Gay da Bahia (GGB), aponta que, no Amazonas, seis pessoas foram mortas de forma violenta apenas por serem LGBTQIA+. No Brasil, foram 187 assassinatos e 18 suicídios no período. Dos segmentos analisados pela pesquisa, cerca de 50% correspondia a violência contra homens gays, ou seja, 102 pessoas mortas por sua orientação sexual.

Os motivos que levam à violência contra essa comunidade estão internamente ligados à intolerância. Segundo o cientista social e especialista em segurança pública Pontes Filho, são diversos os fatores que levam ou concorrem para isso “Sem dúvida um dos principais é a falta de formação básica quanto ao respeito às liberdades fundamentais num contexto de predomínio de uma cultura homofóbica e de intolerância”, ele explica que a sensação de impunidade é usada para justificar a violência contra LGBTIA+.

“A cultura homofóbica e machista cria um ambiente de intolerância à diversidade de orientação sexual, o que produz muitas vezes a sensação de que seria ‘legítima’ a violência praticada contra o público LGBTIA+. Isso fomenta muitas vezes violência e crimes de ódio contra pessoas de orientação sexual diversa, como também de raça e de gênero.”

A falta de instrução no Brasil e em particular no Amazonas podem ser também fatores que agravam a violência contra minorias. Pontes aponta a educação como saída para o fim da descriminação. “Dentre as possibilidades para lidar com esse problema, sem dúvida, é imprescindível uma educação orientada para o respeito à cidadania e aos direitos humanos. E essa não se limita apenas ao nível fundamental de ensino, mas a todos os que dela carecem continuamente, mesmo aos que já são egressos de um curso de nível superior.” completa.