Parlamentares do AM criticam decreto que limita fiscalização de atos do Executivo municipal

O advogado e cientista político Helso Ribeiro definiu também o fato como antipatia por parte do prefeito (Foto: Robervaldo Rocha/CMM)

07 de fevereiro de 2022

21:02

Malu Dacio – Da Revista Cenarium

MANAUS — Parlamentares do Amazonas se mostraram contrários ao Decreto nº 5.254, de 3 de fevereiro de 2022, em que a Procuradoria Geral do Município (PGM) recomenda o afastamento de pedidos individuais de vereadores da Câmara à Prefeitura de Manaus, passando esta a atender apenas pedidos coletivos, em nome de toda a Casa Legislativa

Na prática, o decreto, que passou pelo aval do Executivo, já institui no âmbito do município que apenas a Câmara Municipal, e não mais os vereadores de forma individual, poderá fiscalizar os atos do executivo ou solicitar informações da Prefeitura ou das autarquias.

“Entende-se pela impossibilidade jurídica de se fornecer as informações solicitadas por meio de pedidos individuais de membros do Poder Legislativo, por violação ao Princípio da Separação dos Poderes, considerando que a fiscalização dos atos do Executivo é de atribuição exclusiva das Casas do Poder Legislativo, consoante entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal”, diz o parecer do procurador-geral do município, Ivson Coelho.

Durante a sessão plenária na Câmara Municipal de Manaus nesta segunda-feira, 7, a postura adotada pela maioria esmagadora dos vereadores foi o silêncio. Apenas Rodrigo Guedes (PSC) e Amom Mandel (sem partido) se mostraram contra o decreto.

Rodrigo Guedes (PSC) disse em tribuna que o decreto tira a prerrogativa da Câmara Municipal de Manaus e dos vereadores em fiscalizar a Prefeitura de Manaus. “Isso é simplesmente calar a voz do parlamento. Esse decreto precisa ser revogado urgentemente”, disse Guedes.

“A CMM não é uma secretaria da Prefeitura. Se for para tratar a Câmara desse jeito, é melhor passar a chave e fechar a Câmara Municipal de Manaus. Isso é uma brutalidade com o parlamento que nós não podemos permitir”, declarou o vereador.

“Esse decreto precisa ser revogado imediatamente. Porque os requerimentos da Câmara Municipal de Manaus, apesar de serem iniciativas do parlamentar, são aprovados pelo plenário aqui desta Casa. Quando se aprova, é feito pela Casa e por todos os vereadores”, lembrou Rodrigo.

Guedes disse que apresentará um requerimento para convocação dos responsáveis pelo decreto. “Decreto que foi assinado pelo prefeito, mas foi orientado pela PGM e precisa ser explicado porque a voz do parlamentar não pode ser calada”, protestou o Guedes.

Vereador Rodrigo Guedes defendeu que o decreto precisa ser revogado urgentemente. (Foto: Divulgação)

Trabalho limitado

O vereador Amom Mandel (sem partido) defendeu que o decreto limita o trabalho dos vereadores. “Uma coisa é dizer que as solicitações não têm esse prazo estabelecido por lei, de acordo com a Lei Orgânica do Município de Manaus (Lomam), até porque são ferramentas diferentes”, lembra o vereador.

“Uma coisa é a ferramenta utilizada pelo parlamentar, enquanto cidadão, via Lei de Acesso à Informação. Outra coisa é a ferramenta disposta na Lomam. Não pode ser admitido pelo Parlamento, é um enfraquecimento desnecessário”, disse Amom.

“É claro que a gestão municipal quer dificultar o acesso às informações. Se as informações que nós queremos acesso teriam que ser divulgadas independentemente de nós solicitarmos, por que proibir as secretarias ou servidores de responderem às solicitações de informações?”, questionou Mandel.

Falta transparência

O deputado federal José Ricardo (PT) afirmou que falta transparência nas ações da Prefeitura e do Estado do Amazonas. “Agora, o prefeito surpreende ao impedir a fiscalização dos vereadores e irá prestar informações somente se a Câmara Municipal, dirigida pelo seu aliado, autorizar. Um absurdo. O que o prefeito quer esconder? Em sua mensagem na Câmara Municipal, falou de avanços, mas essa atitude é de retrocesso”, criticou o deputado.

José, que também é economista, analisa que a Lomam estabelece que a Prefeitura deve instituir mecanismo de participação popular, com fiscalização e controle das ações públicas, sendo que a participação dos cidadãos acontecerá por meio de seus representantes, no caso, os parlamentares.

“E a própria Lei Federal 12.527/201, no artigo 10, define que qualquer interessado poderá apresentar pedido de acesso a informações aos órgãos e entidades. A lei ainda estabelece um prazo de 20 dias para que o órgão ou entidade conceda a informação”, salientou o petista.

“Senhor prefeito, a decisão da PGM, baseada numa situação gerada pela Assembleia do Rio de Janeiro, lhe induz ao erro e não condiz com a boa prática de prestar contas das ações e dar transparência à gestão pública”, finalizou em nota.

Lei da transparência

O advogado e cientista político Helso Ribeiro explica que a procuradora-geral do município elaborou o parecer baseado em uma decisão unânime do Supremo Tribunal Federa, entendendo que não caberia pedidos individuais de deputados e tampouco ações individuais de deputados federais na fiscalização da Presidência da República.

Helso lembra também que grande parte da casa legislativa é formada por apoiadores do prefeito. “Dos 41 vereadores, eu diria que pelo menos 35 – e sendo econômico – estão ao lado dele. Eu vejo em um primeiro momento um ato de antipatia face à Câmara de Vereadores”, define,

“O motivo seria um possível choque de atribuições da separação dos Poderes. Eu entendo que quanto mais luz do sol nos negócios públicos melhor. Nós já temos a Lei da Transparência que permite que eu, você, qualquer cidadão, qualquer vereador, deputado, senador possamos requerer informações, e os órgãos públicos são obrigados a dar esta informação”, lembra o especialista.

A CENARIUM procurou a Prefeitura por meio da Secretaria Municipal de Comunicação (Semcom), mas até a publicação dessa matéria não obteve resposta.

Confira o Decreto na íntegra: