Privatização de empresas públicas impacta renda de famílias, apontam economistas

Refinaria da Petrobras no Amazonas foi privatizada em dezembro do ano passado (Divulgação/Petrobras)

07 de novembro de 2023

19:11

Mayara Subtil – Da Agência Cenarium Amazônia

BRASÍLIA (DF) – Em pauta no cenário nacional pelo menos desde os anos 1980, as privatizações de estatais têm gerado debates sobre o literal impacto ao bolso do consumidor, bem como a necessidade do trâmite. O tema ficou ainda mais em alta após a privatização da Eletrobras, finalizada em junho de 2022 durante a gestão Bolsonaro, e as tratativas em torno da possível venda dos Correios, já então barrada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Para se ter uma ideia, uma pesquisa do Instituto Datafolha, publicado pelo jornal “Folha de S.Paulo” em abril de 2023, revelou que 45% dos brasileiros são contra as privatizações de empresas e serviços públicos, enquanto 38% se posicionou a favor. À REVISTA CENARIUM AMAZÔNIA na segunda-feira, 6, o economista Ricardo Paixão explicou com exemplos de que forma privar o que é público pode, na prática, impactar na renda familiar.

Dois grandes serviços que deveriam ser prestados pelo setor público e, na verdade, presta, mas a gente questiona a qualidade, são saúde e educação. Se você paga uma escola particular ou um plano de saúde compromete boa parte da renda das famílias. Também não podemos colocar a sociedade em um mesmo grupo. Nós temos várias segmentações. Para quem ganha menos, não se tem condições de ter um plano de saúde, de colocar o filho em uma escola particular que, em tese, teria um ensino um pouco melhor. Em alguns casos, 60% do orçamento está pressionado por essas privatizações”, disse Ricardo.

O economista Ricardo Paixão diz que privatizações podem impactar na renda familiar (Reprodução/Arquivo Pessoal).

O professor de finanças William Baghdassarian, por sua vez, disse acreditar que o importante é compreender quando se é viável a passagem do controle à iniciativa privada. Salientou ainda a necessidade da privatização ser ancorada por uma regulação eficaz para evitar a formação de um monopólio privado ou até mesmo a má prestação do serviço.

Áreas onde o Estado é necessário, devemos manter as empresas. Áreas onde o setor privado pode prover o mesmo tipo de serviço, com mais privacidade, devemos privatizar. Tanto a empresa estatal quanto a empresa privada, em teoria, deveriam se reportar a um regulador. Quando se pergunta se o serviço vai estar melhor ou pior, a resposta não está entrelaçada sobre se é setor público ou privado, mas sim se o regulador está atuando de forma eficaz ou não“, explicou.

O economista William Baghdassarian vê com bons olhos a privatização dos serviços públicos (Reprodução/Arquivo Pessoal)

Já o economista Newton Marques, porém, lembrou que a virada de chave de público para privado não é sinônimo de que um serviço será melhor executado. “Há uma crença de que o setor privado sempre é mais eficiente que o setor público. Nós temos vários casos de empresas ligadas à prestação de serviços de energia elétrica e de água e esgoto e que foram privatizados aqui no Brasil e não necessariamente mostrou essa eficiência na prestação de serviços à sociedade“, disse.

Mas o que é privatização?

É um processo de transferência de órgãos ou empresas estatais à iniciativa privada. Isso pode ocorrer quando o Estado, por exemplo, precisa angariar recursos ou porque o governante entende que manter aquela empresa já não faz mais sentido. A empresa estatal, no caso, é toda aquela cujo controle acionário pertence ao Estado total ou parcial. Atuam, normalmente, em segmentos de interesse público, como os setores de energia, telecomunicações e infraestrutura.

É quando eu passo essa responsabilidade do ente público para o ente privado. Quando, por exemplo, se vende as ações da Petrobras. Eu estou tirando do setor público a responsabilidade de promover aquele serviço e passo para o setor privado”, detalhou William Baghdassarian.

Essa transferência à iniciativa privada ocorre por meio de vendas, como por meio de leilões públicos. Assim, o governo se torna o sócio minoritário ou outros dispositivos previstos na Constituição.

Por exemplo, se tem uma companhia de energia elétrica, ela é pública e é controlada pelo setor público e, em alguns casos, que não há recursos por parte de algum ente, seja municipal, federal ou estadual, e ele acaba transferindo o controle, por meio de uma licitação, para o setor privado, então, é esse setor que passa a fornecer esses serviços que, no caso, eram prestados pelo serviço público, como de energia elétrica, água e esgoto”, complementou Newton Marques.

O economista Newton Marques explica que privatizar os serviços públicos é transferir o controle para o setor privado (Reprodução/Arquivo Pessoal)

Uma das preocupações que rondam os especialistas envolve o lucro por parte da iniciativa privada sobre os consumidores. William Baghdassarian, por exemplo, confirma que a visão dos empreendimentos particulares está voltada ao lucro.

Mas são [lucros] compatíveis com o mercado. A empresa pública também trabalharia em cima do lucro, já que o Tesouro [Nacional] busca esses dividendos para fechar as contas; mas acaba ficando exposta ao clientelismo, já que muitas vezes as pessoas são indicadas por critérios políticos e não têm conhecimento nenhum sobre aquele assunto. Só a troca de um presidente por outro que tem conhecimento já faz o preço das ações subirem bastante”, justificou o economista.

Conforme o economista Ricardo Paixão, se bem-sucedido, o ato de privatizar uma empresa estatal em alguns casos pode ser benéfico ao mercado. Para o especialista, seria possível ampliar a concorrência e aquecer a economia, por exemplo.

Às vezes, o mercado ganha também. Você tem mais oportunidades para o empresariado conseguir a prestação de serviços e gerar emprego e renda. O mercado tem esse ‘plus’ quando se há um processo de privatização bem controlado. E a sociedade ganha naqueles casos em que se tem uma eficiência maior”, disse.

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Editado por Jefferson Ramos
Revisado por Adriana Gonzaga