‘Seguidor não é eleitor e curtida não é voto’; estrategista Rodrigo Gadelha analisa cenário político no Brasil

Em entrevista exclusiva à AGÊNCIA AMAZÔNIA, Rodrigo Gadelha fala sobre redes sociais, marketing político, fake news e novos projetos (Reprodução/Internet)

11 de abril de 2023

18:04

Gabriela Rangel – Especial para a Agência Amazônia

SÃO PAULO – O publicitário e estrategista político Rodrigo Gadelha é especialista em utilizar as redes sociais para alavancar campanhas políticas de candidatos a diversos cargos. Pioneiro no uso do WhatsApp como ferramenta de campanha no mundo, Rodrigo lembra, orgulhoso, de quando utilizou o aplicativo de mensagens, na campanha presidencial de Aécio Neves, em 2014. Como na época não havia experiências anteriores com a ferramenta, ele criou uma metodologia, a partir do zero, e virou case para profissionais da área.

Rodrigo continua antenado às novidades tecnológicas. Em entrevista exclusiva à AGÊNCIA AMAZÔNIA, o publicitário compartilha quais redes sociais considera importante para quem quer investir no marketing político, divide angústias em relação às fake news e fala sobre os novos projetos: um livro e um curso. Isso porque, além da forte presença no mercado, Rodrigo Gadelha também é professor. Em sala de aula, divide os conhecimentos que adquiriu, em 30 anos de carreira, com aspirantes a políticos e publicitários em formação.

Entre as várias mensagens importantes que Rodrigo faz questão de frisar está o alerta de que o número de curtidas nas redes não significa votos. É nesse trabalho de aproximação e convencimento que está a essência do trabalho do publicitário. Leia a entrevista:

Rodrigo Gadelha recebeu a equipe da Revista Cenarium, em São Paulo (Walfran Leão/Agência Amazônia)

REVISTA CENARIUM: Com tamanha experiência em estratégia política nas redes sociais, como você vislumbra uma melhor utilização da internet?

Rodrigo Gadelha: O mais importante é entender o comportamento das pessoas, porque ao longo da vida o comportamento muda. Eu lembro muito bem que, quando houve o advento da TV, as pessoas falaram que o rádio iria acabar, o que não aconteceu. Depois, com a internet, disseram que a TV iria acabar e não acabou. Então, o que a gente tem que começar a enxergar é como o comportamento se adapta.

Por exemplo, eu fiz a primeira campanha utilizando o WhatsApp, em 2014, e ainda continuo com a ferramenta porque o brasileiro abre o aplicativo 72 vezes ao dia, atualmente. 99% dos brasileiros usam o WhatsApp. A média de idade do usuário é 45 anos, não são jovens, são pessoas que usam para trabalho.

E muita gente questiona “Por que existem fake news? É alguém buscando o lado ruim da ferramenta?”.

Ninguém pensa quais são as características do mundo digital brasileiro: 90% dos planos de celulares são pré-pagos. Com isso, o WhatsApp é de graça, mas o acesso à navegação na internet não é grátis. O usuário não consegue entrar numa agência de checagem para verificar se a informação é verdadeira ou falsa. Então, se ele recebe uma imagem do WhatsApp, ele não tem a possibilidade de pesquisar a veracidade. O poder da fake news não é culpa dele, o governo tem que democratizar a internet, para que todo mundo tenha acesso à informação de qualidade. Isso é que vai gerar resultado, não tentar punir todo mundo.

Outro ponto que digo quando políticos e empresas me questionam sobre como usar melhor a internet é: “Seja Generoso”. A primeira coisa que ele tem que fazer quando entra na internet é pensar no outro, porque todo mundo pensa em usar o WhatsApp para falar o que quer e não se pergunta o que o outro quer ouvir. Isso vai mudar como o eleitor te enxerga.

RC: Sobre campanha eleitoral, sabemos que não há uma receita pronta a ser seguida. Mas existe algum ponto que é imprescindível para o sucesso?

RG: É imprescindível pensar antes de fazer. Pior coisa é querer ir logo para o operacional: já fazer um post no Facebook, um envio por WhatsApp. Por exemplo, quando você quer conquistar alguém, você leva direto para um restaurante de frutos-do-mar, sem saber se a pessoa é alérgica ou se gosta de frutos-do-mar?  Você planeja isso. Por que a maioria das pessoas não faz a mesma coisa com o eleitor, então?  

Vou falar sobre o caso do vereador da cidade de São Paulo Thammy Miranda. Ele é um homem trans que já havia perdido duas eleições e sempre focou no público LGBTQIAP+. Mas quando a gente fez a análise de inteligência de dados, percebemos que esse público não se identificava com ele. Por ser um homem casado, com filho, a percepção é que Thammy pertencia a uma família tradicional. Pelos dados, começamos a enxergar que o público dele era de mulheres solteiras das classes C, D e E, analfabetas funcionais, que tinham filho e viam na figura do Thammy um pai ideal. Mulheres de 60 anos com filho que sofreu preconceito, como o Thammy sofreu ao fazer a transição, viam nele a coragem.

A partir desse perfil fizemos uma campanha “Thammy Miranda, Gente Que Cuida de Gente”, e o principal produto da campanha foi uma web série que mostrava o dia a dia dele sendo pai, porque era o que o público queria ver.

Rodrigo Gadelha é publicitário e estrategista político (Walfran Leão/Agência Amazônia)

RC: Então, a partir desse exemplo do vereador Thammy Miranda, podemos pensar que o que deu certo, na última eleição, vai valer como estratégia na próxima?

RG: Cada momento é único, depende do cenário. Vamos fazer uma análise da política brasileira:

1989 – Collor versus Lula. Temos Color caçador de Marajás contra a corrupção.

Depois veio Fernando Henrique Cardoso, que consertou a economia.

E, então, veio 2002: “Quero um Brasil decente”. Veio Lula contra a corrupção.

2018 tinha Bolsonaro contra corrupção.

Ou seja, o Brasil não muda, mas o cenário era diferente, posicionamentos diferentes. Precisamos enxergar qual vai ser o posicionamento dessa eleição.

RC: Após o seu pioneirismo no uso do WhatsApp, em uma campanha política, em 2014, com o então candidato Aécio Neves, ainda considera o WhatsApp muito importante na estratégia política?

RG: O WhatsApp para mim ainda é uma grande ferramenta, mas o principal para ganhar uma eleição é montar um bom time. Isso é 50% de tudo, porque não adianta você ter um bom financeiro, não adianta você ter um bom jurídico, porque você ganha a eleição, mas não assume.

Mas, quando a gente fala de WhatsApp, hoje, 70% de tudo o que é compartilhado, é feito dentro do WhatsApp. Ou seja, todo o resto representa 30%. Isso mostra o poder dessa ferramenta.

Mas tem muitas ferramentas crescendo. Há dois anos, eu venho falando sobre o TikTok. Há um ano e meio a plataforma tinha cinco milhões de inscritos, agora, está com 89 milhões. Então, é uma grande ferramenta. Muita gente não entendeu a evolução do TikTok porque não é a música, é o formato, é a velocidade, ninguém mais quer ver um vídeo de 20 minutos, porque a vida está corrida demais, as pessoas querem informação rápida e direta, 60 segundos é perfeito para você absorver.

Eu vou fazer o lançamento de um livro, no fim do ano, chamado “Marketing de Contexto”. Eu acredito e falo sobre isso nas minhas palestras: o marketing de conteúdo acabou. Agora, a gente vive a era do marketing de contexto, não é forma, não é conteúdo, porque conteúdo tem de monte, o que importa é o contexto certo, no momento certo, na hora certa.

O publicitário falou sobre redes sociais, marketing político e fake news (Walfran Leão/Agência Amazônia)

RC: Os políticos estão sabendo usar as redes da melhor forma?

RG: Muita gente sim. No mundo digital, foi a direita quem conseguiu entender melhor e aproveitar. A esquerda vem aprendendo. A gente tem o Janones, um cara de esquerda que começou a aprender a usar, mas a direita ainda é muito forte.

Uma brincadeira que eu faço é que, no digital, você pode ser o Lula ou você pode ser o Bolsonaro, mas jamais o Alckmin. Você pode ser quente ou frio, mas jamais o morno, tem que ter sex appeal.

RC: Outra atuação profissional sua é a de professor. Como é fazer parte do quadro de docentes da Renova BR, a maior Escola de Formação de políticos do Brasil?

RG: Tenho muito orgulho de ter sido um dos fundadores da Renova BR, em 2017. Já dei aulas em vários cursos como mobilização de redes sociais, marketing digital e mandato digital. A importância do Renova é o posicionamento, transformar pessoas comuns em políticos incomuns, dando oportunidade e estrutura para os alunos. Por exemplo, tenho muito orgulho de ter sido o professor do primeiro deputado cego da história do País, da primeira deputada indígena, de ter participado de uma série de inovações, na política, que passaram pela escola. Então, eu sou um doador do Renova BR e faço questão de ser um ativista nesse processo.

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RC: Você ainda tem planos de estar mais presente na sala de aula?

RG: Depois de oito anos de amadurecimento, vamos lançar a “Academia da Política”, uma escola própria, focada no desenvolvimento de política, porque eu acho que temos uma lacuna no mercado. Serão cursos focados na preparação de profissionais, com uma equipe extremamente qualificada. Essa era uma paixão minha, um sonho adiado por causa da correria das consultorias.

Nós devemos lançar, em abril, o primeiro curso ministrado por mim, mas também terão oito grandes nomes de mercado que convenci, pessoalmente, a participarem das gravações.

RC: Então, o ano está movimentado, você já tinha falado sobre um novo livro, agora, uma escola…

RG: E tem mais uma novidade, junto com o livro, lançarei também um podcast, no fim do ano.

RC: E para encerrar esse bate-papo, uma dúvida sobre o futuro no cenário político. Tendo em vista as eleições municipais de 2024, qual tendência na internet você destaca?

Na última eleição, falei muito de TikTok, na próxima eleição será a vez da rede Kwai, que traz vídeos curtos. Essa rede é a base da pirâmide que cresce, absurdamente. Vai ser a primeira eleição que vai ter um político eleito pela Kwai.

E o que eu posso dizer para ajudar qualquer político é uma frase que eu reforço desde 2013: Seguidor não é eleitor e curtida não é voto.

Assista a entrevista na íntegra: