Setores de serviços, agropecuária e indústria são os que mais contratam imigrantes no AM e RR

Os setores de serviços, agropecuária, e indústria são os que mais apresentaram potencial de contratação de refugiados e migrantes da Venezuela (Thiago Alencar/AGÊNCIA AMAZÔNIA)

01 de dezembro de 2022

21:12

Gabriel Abreu – Da AGÊNCIA AMAZÔNIA

MANAUS – A Agência da ONU para Refugiados (Acnur), em parceria com a AVSI Brasil, e apoio do Ministério Público do Trabalho, no Amazonas e em Roraima (MPT-AM/RR), divulgaram na quarta-feira, 30, na capital amazonense, uma pesquisa que mostra o panorama do mercado de trabalho para imigrantes e refugiados no Amazonas e em Roraima.

Os setores de serviços, agropecuária, e indústria são os que mais apresentaram potencial de contratação de refugiados e migrantes da Venezuela, que possuem diversos níveis de escolaridade e formações profissionais. Além disso, empregadores desses Estados já vêm sendo beneficiados pelo intercâmbio cultural e de conhecimentos trazidos por estes profissionais no dia a dia dos resultados das empresas.

A pesquisadora Bertha Maakaroun, coordenadora da Pólis Pesquisas, explicou que as capitais Manaus e Boa Vista sediaram os debates sobre a pesquisa com representantes do poder público local, da sociedade civil, do setor privado e pessoas refugiadas.

Foram levados em consideração, pelos pesquisadores, 20 entrevistas com diferentes representantes de segmentos produtivos de Manaus e Boa Vista. A pesquisa foi importante para entender as ações que precisam ser feitas para que a população refugiada e migrante, que integram os profissionais, agreguem experiência no setor privado.

“A partir da análise de dados secundários relativos à contribuição de cada segmento econômico com o Valor Adicionado Bruto (VAB) de cada cidade, identificamos os setores produtivos de maior participação na economia para entrevistas em profundidade, junto com os seus representantes de classe”, explicou Bertha Maakaroun.

Lançamento da pesquisa em Manaus, na sede do Ministério Público do Trabalho (MPT-AM/RR) (Felipe Irnaldo/ACNUR)

Cenário Amazonas

Na capital do Amazonas, foram realizadas 11 entrevistas em profundidade, em novembro de 2021, que levantaram informações sobre o setor produtivo de Manaus, oportunidades de emprego e de renda, bem como demandas por qualificação em diferentes atividades.

A partir da análise da composição do setor produtivo da capital foram identificados os segmentos de interesse, contando com entrevistas com representantes dos seguintes setores produtivos: comércio, construção civil, indústria, indústria de alimentação, bares e restaurantes, turismo e supermercados, bem como representantes governamentais federal, estadual e municipal, e organização da sociedade civil em apoio a refugiados e migrantes.

Manaus possui o maior Produto Interno Bruto (PIB) dentre as cidades da Região Norte, respondendo por, aproximadamente, 78% do PIB do Estado do Amazonas, alta participação que se explica, sobretudo, pelo Polo Industrial de Manaus (PIM), instalado na Zona Franca de Manaus (ZFM), não apenas em decorrência de sua produção industrial, mas também por seu potencial de atração de comércio e serviços em resposta às demandas das cadeias produtivas.

“O PIM tem cerca de 100 mil postos de trabalho, enquanto o de serviços e comércio passa de 400 mil. Ambos os setores demandam níveis de escolaridade e capacidades diversas, seja trabalhando na montagem na indústria, em reparos, e outros serviços relacionados ao setor, ou em bares, restaurantes e outros ofícios bastante demandados”, destacou Bertha.

Imagem aérea das empresas instaladas na Zona Franca de Manaus (ZFM) (Divulgação/Secretaria Geral)

Cenário Roraima

No caso de Roraima, foram realizadas 9 entrevistas, em profundidade, com representantes de categorias econômicas do Estado, economistas e gestores públicos estaduais e municipais. Os representantes do setor produtivo – Indústria, Indústria da Construção, Indústria da Confecção, Comércio, Setor Hoteleiro e Setor Agrícola –, foram definidos a partir do perfil da economia do Estado e do peso que os diferentes setores e atividades econômicas assumem em seu Produto Interno Bruto (PIB).

“São setores que demandam por diferentes ofícios, os mais recorrentes são eletricistas, técnicos em instalação e manutenção de ar-condicionado, mecânica e manutenção de maquinário pesado empregado no setor agrícola e na indústria da construção”, explica Bertha.

“Profissionais como web designers, produtores de vídeos e conteúdo digital, gestores de redes sociais, que atuem nessas novas plataformas comunicacionais, podem apoiar nas diferentes frentes do comércio como um todo, principalmente, depois da pandemia”, completou a pesquisadora.

Por três anos consecutivos, Roraima foi o Estado que apresentou o maior crescimento populacional, desempenho influenciado pela mobilidade de pessoas venezuelanas. Diferentemente, no Brasil, vem ocorrendo redução gradual da taxa de crescimento populacional há algumas décadas.

Segundo a pesquisa da estimativa da população para os municípios brasileiros e Unidades da Federação (UFs), do IBGE, a população de Roraima é de 631.181 habitantes (data base, 1° de julho de 2020) – um aumento de 4,2% em relação a 2019, quase cinco vezes e meio superior à média nacional, que apontou para um crescimento médio populacional de 0,8% em relação a 2019. Ademais, o perfil demográfico de Roraima é substancialmente mais jovem do que o do Brasil.

Orla do Rio Branco, um dos cartões-postais da cidade (Prefeitura de Roraima/Divulgação)

A dependência da economia, de Roraima, do setor público também se evidencia no mercado de trabalho: em novembro de 2020, o setor de “administração pública, defesa, seguridade social, educação, saúde e serviços sociais” foi responsável por 27,5% da força de trabalho ocupada, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD, novembro/2020). Para fins de comparação, no Brasil, naquele mês, 18,2% da força de trabalho ocupada se empregava na administração pública, portanto, proporcionalmente, um terço inferior aos números de Roraima.

Contratação de refugiados

O diagnóstico também escutou lideranças e representantes de diferentes setores sobre a mão de obra proveniente da Venezuela. Em todos os setores produtivos pesquisados, são percebidos aspectos positivos desta força de trabalho.

Os entrevistados avaliaram que as pessoas refugiadas estão dispostas a se deslocarem onde haja oportunidades de trabalho, são esforçadas no aprendizado e execução das tarefas, têm bom relacionamento interpessoal e facilidade em interagir com novos colegas, além de conseguirem trazer novas culturas e capacidade de inovação para o ambiente de trabalho.

“Nós, do setor de bares e restaurantes, constatamos essas qualidades também no dia a dia. Agregam valor ao trabalho, ajudam os colegas e colaboram. Temos tido experiências muito positivas por nossos associados”, destacou Rogério Cunha, representante da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel).

Refugiados buscam capacitação para o trabalho no Brasil. Os venezuelanos Angel Sifonte e Maria Gabriela esperam uma oportunidade de trabalhar no interior do País (Divulgação)

Oportunidades de melhoria

Os empregadores também relataram a necessidade de fortalecimento da proficiência em português, para as pessoas refugiadas, como ponto a ser aperfeiçoado para facilitar o processo de contratação, considerando que eventuais dificuldades de compreensão daqueles com menor proficiência no idioma são um desafio para o pleno andamento das rotinas de trabalho.

Além disso, reforçam a importância de regularização dos documentos para que as oportunidades de trabalho sejam efetivadas, bem como para o acesso a cursos de qualificação que promovam mais conhecimentos sobre as especificidades locais. Nesse sentido, parcerias entre o setor privado e instituições que promovam capacitações podem ajudar a suprir a demanda por mão de obra qualificada que requer apenas este ajuste de conhecimentos técnicos.

O Acnur e seus parceiros, no Brasil, seguem promovendo atividades voltadas para a integração local de pessoas refugiadas e migrantes da Venezuela e de outras nacionalidades. As ações incluem oferta de cursos de português, qualificação profissional, elaboração de currículos, preparações para entrevistas e encaminhamentos para vagas de emprego condizentes com as formações destes profissionais.

“Esta pesquisa deve servir de apoio para que ações importantes sejam potencializadas, com os diversos atores e organizações locais engajadas. Esta participação ativa dos diferentes atores e setores para a integração local da população refugiada e migrante torna possível alcançar êxito nos esforços para a promoção da inclusão socioeconômica e do crescimento da economia local, diversificando as receitas e os resultados do setor privado”, destacou o representante do ACNUR, Oscar Sánchez Piñeiro.

Para a procuradora-chefe do MPT-AM/RR, a pesquisa deve nortear o trabalho conjunto que várias instituições têm integrado para a autossuficiência de pessoas refugiadas e migrantes em Roraima e no Amazonas.

“As contribuições desta pesquisa serão fundamentais para que o trabalho desenvolvido pelas diversas organizações voltadas à integração local de pessoas refugiadas e migrantes da Venezuela seja fortalecido e tenha impacto tanto com a absorção de pessoas em empregos dignos, quanto na construção da autonomia ao nível local”, conclui.

Veja a íntegra do estudo: