Um mês depois, ataques em Brasília levantam debate sobre atuação da Justiça

Movidos pela recusa em aceitar um presidente eleito e inspirados por teorias da conspiração, manifestantes cometeram uma série de atos de vandalismo (Marcelo Camargo/Agência Brasil)

08 de fevereiro de 2023

20:02

Daniel Amorim – Da Agência Amazônia

MANAUS – Na manhã de domingo, 8 de janeiro de 2023, a praça dos Três Poderes, em Brasília, virou cenário do mais grave atentado à democracia brasileira desde o fim da ditadura civil-militar. Apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) invadiram os prédios do Congresso, Palácio do Planalto e Supremo Tribunal Federal (STF) e cometeram uma série de atos de vandalismo.

Motivados pela recusa em aceitar o presidente eleito pela via democrática, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), instigados por teorias da conspiração divulgadas em aplicativos de mensagens, vândalos exigiram para si o direito de determinar a liderança no País.

Um mês após o episódio, nenhum participante das invasões aos Três Poderes foi punido. Segundo Capoulican Padilha, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, no Amazonas (OAB-AM), trata-se de um aspecto formal da Justiça brasileira, que funciona por meio de prazos definidos em lei, para a produção de provas no âmbito do processo e na manifestação da defesa e da acusação.

O Ministério Público Federal (MPF) ainda está oficializando as denúncias, as acusações formais dos envolvidos. Não podemos falar em acertos e erros nesse sentido. Aqueles que estão presos cautelarmente são presos processuais, aguardando julgamento“, ressalta.

Por outro lado, entre as medidas que ainda devem ser tomadas, Padilha cita a necessidade de aprofundamento nas investigações para definir o perfil da atuação dos golpistas nos atos. “Outra informação relevante é a identidade dos líderes que não participaram dos eventos e financiaram a cadeira de comando e as ações criminosas“, acrescenta.

Especialista cita necessidade de identificar articuladores da tentativa de golpe (Ueslei Marcelino/Reuters)

Nesse contexto, a única ressalva fica por conta do que Padilha chama de “atuação precipitada do Judiciário”, o que vai na contramão da folclórica lentidão da Justiça brasileira, e pode favorecer argumentos dos advogados de defesa. “Acho que o Ministério Público está oferecendo acusações e denúncias de forma um pouco precipitada. Não sei qual a motivação. E isso pode comprometer o andamento processual na medida em que um bom defensor pode explorar essas acusações“.

Regra versus exceção

Nos debates sobre a investida golpista em Brasília, há uma crítica recorrente à atuação da Justiça: a punição em caráter prévio foi aplicada a pessoas sem grande poder aquisitivo ou influência na política. A prisão em larga escala é defendida, inclusive, por grupos de esquerda, em geral, contrários a um sistema que penaliza a população preta e periférica sem condições de defesa.

Precisamos entender que, de acordo com o Direito, a prisão é exceção e não a regra. Você apura os fatos, identifica os sujeitos envolvidos no ato criminoso e formula denúncias na Justiça, que vai acolhê-la ou não, e convoca os acusados para a sua própria defesa“, explica o sociólogo Luiz Antônio do Nascimento, professor da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). “A prisão ocorre quando o sujeito está atrapalhando as investigações ou continua praticando crime, o que parece que está ocorrendo“.

No entanto, o professor acredita que o procedimento padrão da Justiça deve garantir a punição dos articuladores da tentativa de golpe. “A investigação policial começa pelos ‘peixes pequenos’ que vão dar elementos probatórios – porque não estão preocupados em guardar provas – e, a partir disso, as autoridades vão chegando nos peixes graúdos e maiores” complementa.