Caso Ana Hickmann: mulheres têm vergonha e medo de denunciar companheiros, afirmam especialistas

Ana Hickmann e Alexandre Correa (Divulgação)

12 de novembro de 2023

16:11

Beatriz Araújo – Da Agência Amazônia

MANAUS (AM) – O caso de agressão doméstica envolvendo a apresentadora Ana Hickmann, registrado neste sábado, 11, revela que as agressões contra mulheres estão mais frequentes e atingem todas as classes sociais. No Brasil, uma mulher é agredida em seu lar a cada quatro horas. Com o ciclo da violência, vem também o medo e a insegurança de denunciar o agressor às autoridades de segurança. Segundo especialistas, o medo em denunciar ainda é reflexo do machismo enraizado na sociedade brasileira.

Apresentadora do programa “Hoje em Dia” na TV Record, Ana Hickmann registrou um Boletim de Ocorrência (BO) contra o marido, Alexandre Correa. Segundo informações registradas no BO, o casal teve um desentendimento e, após Ana afirmar que iria acionar a polícia, Alexandre pressionou a apresentadora contra a parede e ameaçou agredi-la com cabeçadas.

Ainda segundo a artista, ao tentar afastar o marido para pegar o celular que estava fora da casa, Alexandre fechou a porta de correr e feriu o braço esquerdo de Ana Hickmann. Mesmo com o registro de violência, Ana Hickmann afirmou que foi apenas um mal-entendido do casal.

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Alexandre Correa e a esposa, Ana Hickmann (Redes Sociais)

Segundo a advogada especialista em direitos humanos Luciana Santos, o medo e a dúvida perseguem as vítimas de violência doméstica por muitos fatores, principalmente pela sociedade brasileira ainda ser marcada pelo machismo e por uma séria desigualdade entre os gêneros que impedem as mulheres de procurar seus direitos.

“As mulheres têm muito medo do estigma de terem sido agredidas pelo marido, mas a maioria das mulheres, principalmente mulheres de baixa renda, não denuncia seus maridos devido à dependência financeira. A maioria dessas vítimas possui filhos e não quer deixá-los em condições desfavoráveis. Além disso, há também o medo de ir à delegacia por desconhecer os trâmites da Lei Maria da Penha e a descrença na Justiça. Então, muitas mulheres deixam de denunciar por acreditarem que nenhuma medida será tomada e o agressor continuará impune”, analisou.

Mulheres têm muito medo do estigma de terem sido agredidas pelo marido (Adobe Stock)
Conscientização

No Amazonas, o Grupo de Estudos, Pesquisa e Observatório Social: Gênero e Poder (Gepos), da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), coordenado pela professora Iraildes Caldas, orienta homens e mulheres de associações que auxiliam mulheres vítimas de violência doméstica. O Gepos também promove orientações para compreender as questões de gênero que afetam as comunidades locais, especialmente as mulheres em situações de vulnerabilidade.

Para Iraildes Caldas, iniciativas de orientação como essa são fundamentais para combater o que ela afirma ser “o mal do século”. “A violência doméstica é uma das maiores problemáticas hoje no mundo ocidental, e o Brasil assume uma dianteira nesse ranking. A violência contra a mulher, hoje, é tida como mal do século. E a cada dia cresce essa violência. Hoje nós já temos o crime de feminicídio, desde 2015, que é o crime pelo fato de elas serem mulheres. Não é somente uma misoginia, mas é muito mais do que isso, é matar a mulher porque ela é mulher”, pontua a coordenadora do Gepos.

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Crescimento

Segundo uma pesquisa realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, por meio do Instituto Datafolha, revelou que todas as formas de violência contra a mulher cresceram no período recente. Em 2022, foram mais de 18 milhões de mulheres vítimas de violência. São mais de 50 mil vítimas por dia. Ao mesmo tempo, o estudo revela que uma em cada três mulheres brasileiras (33,4%) com mais de 16 anos já sofreu violência física e/ou sexual de parceiros, ou ex-parceiros. O índice é maior que a média global, de 27%.

Recentemente, o Ministério Público Federal (MPF) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) lançaram um infográfico intitulado “violentômetro”. A finalidade do material é contribuir com a conscientização do público, sobretudo do gênero feminino, sobre os sinais e níveis de violência contra a mulher e sobre a importância de se buscar ajuda imediatamente.

(Divulgação)

O violentômetro sinaliza e explica, de forma simples e didática, a escala de violência típica das relações abusivas, situações em que a mulher deve reagir, buscar ajuda e denunciar o agressor. O gráfico identifica os níveis de agressão, que vão desde “pequenas” humilhações e xingamentos até o grau mais extremo, o feminicídio.

Denuncie

As especialistas também destacaram a importância de combater o medo e buscar uma rede de apoio para formalizar as denúncias de violência física. Para denunciar casos de violência doméstica em emergência, é necessário ligar para o 190 e registrar o caso para a Polícia Militar. O atendimento telefônico é gratuito e imediato, e a central 190 funciona 24 horas.

Denuncie por meio da Central de Atendimento à Mulher, pelo 180. (Paulo H. Carvalho/Agência Brasil)

Também é possível buscar denunciar por meio da Central de Atendimento à Mulher pelo 180. O serviço registra e encaminha denúncias aos órgãos competentes e fornece informações sobre os direitos das mulheres, bem como os locais de atendimento mais próximos e apropriados para cada caso, como as Delegacias de Atendimento à Mulher (Deam).

Mulheres vítimas de violência também podem procurar uma Delegacia Especializada da Mulher (DDM) próxima à sua casa ou Delegacia de Polícia fora do horário comercial. A ligação é gratuita, e o serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana.

Edição: Eduardo Figueiredo

Revisão: Gustavo Gilona