Em RO, Justiça barra novo golpe antiambiental de Coronel Marcos Rocha e impede extinção de reserva

São 180 mil hectares destinados à preservação da natureza e à produção de pesquisas científicas sobre a biodiversidade amazônica (Reprodução/WWF Brasil)

12 de novembro de 2022

15:11

Iury Lima – Da AGÊNCIA AMAZÔNIA

VILHENA (RO) – Uma nova investida contra o meio ambiente, promovida pelo governador reeleito Coronel Marcos Rocha (União), está sendo barrada pela Justiça de Rondônia. Um decreto, assinado por ele, e publicado no final de outubro, anulou a criação de mais uma área protegida no Estado, a Estação Ecológica (Esec) Soldado da Borracha.

São 180 mil hectares destinados à preservação da natureza e à produção de pesquisas científicas sobre a biodiversidade amazônica. Agora, o Tribunal de Justiça (TJRO) julga uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) provocada pelo Ministério Público estadual (MPRO). Mesmo com a apreciação do pedido ainda não concluída, a Corte garante a perda dos efeitos da norma, com decisão cautelar.

A medida, considerada de urgência, foi publicada na última quarta-feira, 9, pelo TJ. O documento é assinado pelo desembargador José Jorge Ribeiro da Luz e revoga o Decreto N° 27.565. À AGÊNCIA AMAZÔNIA, o MP disse que a rápida resposta da Justiça acontece como uma espécie de antecipação de tutela, visando “evitar novas invasões”. “Era urgente, por isso o relator deu parecer favorável“, detalhou o Ministério Público. 

Criada há quatro anos, a Estação Ecológica Soldado da Borracha tem cerca de 180 mil hectares de floresta destinados à preservação e produção científica (Thiago Alencar/AGÊNCIA AMAZÔNIA)

Violações

Criada em 2018, a Esec Soldado da Borracha fica localizada entre a capital Porto Velho e o município de Cujubim, no interior. A Promotora de Justiça Valéria Giumelli Canestrini argumenta que a área deve ser mantida, “como consta no parecer técnico” da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Ambiental (Sedam-RO) “porque serve como corredor ecológico”. Ela também reforça o que diz o Ministério Público, que aponta possível aumento do “caos fundiário” caso a reserva seja extinta, como pretendia o governo.

Já o promotor de Justiça Pablo Hernandez Viscardi, que também é coordenador do Grupo de Atuação Especial Meio Ambiente (Gaema), do MPRO, elenca uma série de violações na tentativa de extinguir a unidade.

“De acordo com a opinião do Ministério Público, este decreto estadual ofendeu, gritantemente, o meio ambiente ecologicamente equilibrado, que é um direito humano fundamental de todo e qualquer cidadão”, afirmou Hernandez. “Também afrontou o princípio da proibição do retrocesso ambiental e, também, ofendeu de morte o princípio da separação dos poderes, visto que a extinção de uma unidade de conservação só poderia se dar por lei, que deve passar, inclusive, pela Assembleia Legislativa, ou, então, por ação declaratória de inconstitucionalidade oriunda do nosso Tribunal de Justiça”, ressaltou o promotor.

Além desses mesmos pontos citados pelos promotores, o TJ elencou, por sua vez, o que chamou de afronta contra as constituições federal e estadual de Rondônia, que preveem a proteção do meio ambiente. Citou ainda violação de decisões já proferidas acerca do mesmo tema.

“O Tribunal Pleno da Corte Estadual, por duas vezes, em julgamento judicial de ADIs, reconheceu a constitucionalidade do decreto de criação da Estação Ecológica Soldado da Borracha. O reconhecimento judicial da Esec deve-se a julgamentos, também, contra outros decretos governamentais, que pretendiam extinguir a Estação, além de outras reservas de preservação ambiental”, publicou em nota.

Já na ementa da decisão, o tribunal aponta a existência de especulação e pressão no sentido de converter floresta para uso agropecuário. Destaca que o local tem espécies ameaçadas de extinção; cobra ações de combate à exploração ilegal de recursos naturais, bem como invoca a garantia de não comprometer a integridade dos atributos que justificaram a criação de Unidades de Conservação (UCs), tidas como essenciais ao patrimônio nacional que se constitui o bioma amazônico. 

Em 2021, Coronel Marcos Rocha tentou reduzir outras duas UCs de Rondônia (Reprodução)

Retrocessos

A redução ou extinção de áreas ambientais não é uma novidade na gestão Marcos Rocha. Por outro lado, a investida contra a estação ecológica foi “uma surpresa” para a promotora Valéria Canestrini. “Justamente, porque foi numa sexta-feira, no dia 28 de outubro”. A data foi oportuna: o apagar das luzes da campanha do 2° turno para os principais candidatos ao governo de Rondônia. Um último ato antiambiental de Rocha, alinhado ao governo federal, caso não fosse reeleito. 

Canestrini também diz que o decreto surpreendeu, devido à existência de limites impostos à liberdade de ação administrativa do Estado, que dizem respeito à proteção ambiental. Ou seja, todas as ações e medidas devem estar em sincronia com a tutela ecológica, “o que já têm sido declarado pelo Egrégio Tribunal de Justiça de Rondônia nas decisões e análises das outras Ações Diretas de Inconstitucionalidade”, ressaltou. 

No ano passado, Marcos Rocha reduziu quase 220 mil hectares de duas das mais importantes Unidades de Conservação do Estado: A Reserva Extrativista (Resex) Jaci-Paraná e o Parque Estadual de Guajará-Mirim. O caso também foi revertido pela Justiça. Apesar da revogação da lei, as áreas ainda não foram totalmente recompostas. Estudo da Rede WWF-Brasil diz que o desmatamento aumentou mais de 2700% na região, desde então.

Unidades de Conservação reduzidas em 2021, antes e depois (Catarine Hak/AGÊNCIA AMAZÔNIA)

‘Para gringo ver’

Enquanto o Governo de Rondônia participa da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP27), no Egito, prometendo investimentos na economia verde, realizada, inclusive, dentro de reservas ambientais, as atitudes do Executivo dizem o contrário quando praticadas no próprio território. O Judiciário precisa intervir para garantir que um dos Estados recordistas em destruição da Amazônia ainda tenha florestas em pé.

“No Estado de Rondônia, nós temos a Lei N° 4.437, de 2018, que institui a Política Estadual de Governança Climática e Serviços Ambientais no Estado de Rondônia (…) assim, todos os atos do Poder Executivo, Legislativo e Judiciário devem visar a proteção ecológica, além de todos os fundamentos no combate às mudanças climáticas”, pontuou a promotora de Justiça Valéria Giumelli Canestrini.