EXCLUSIVO – ‘Ele sempre foi anticiência e nunca gostou de ser brasileiro nem do povo brasileiro’, declara filha de Olavo de Carvalho

Com exclusividade, Heloísa de Carvalho, 52 anos, a mais velha dos oito filhos de Olavo de Carvalho conversou com a CENARIUM

26 de janeiro de 2022

08:01


Priscilla Peixoto — Da Revista Cenarium
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MANAUS — “O negacionismo do Olavo não era de agora (…) ele nunca gostou do Brasil, nem de ser brasileiro e nem do povo brasileiro. Ele não tinha esse orgulho”, declara Heloísa de Carvalho, 52 anos, a mais velha dos oito filhos de Olavo de Carvalho, que morreu ao 74 anos nesta terça-feira, 25, em Richmond, no estado norte-americano da Virgínia.

Em entrevista exclusiva à REVISTA CENARIUM, a bacharel em Direito e primogênita de Olavo disse acreditar que o falecimento foi por complicações causadas pela Covid-19, doença que ele negava a existência. O conhecido “guru” do presidente Jair Bolsonaro (PL) e marqueteiro da eleição do presidente, em 2018, foi diagnosticado com o vírus no dia 15 de janeiro deste ano.

“Eu acredito que o motivo teria sido Covid e os fatos levam a isso. Dia 1º de janeiro ele já estava falando sobre médico e achei estranho, lá pelo dia 5 ele sumiu das redes. Eu creio que ele já estava com Covid, sem teste e sem nada, começou a ter complicações e foi parar no hospital, obteve o diagnóstico confirmado e acabou indo parar na UTI por conta das complicações e não saiu dessa internação”, avalia Heloísa.

‘Fiel negacionista’

Heloísa destaca que o pai não cumpria as normas de segurança e orientações estabelecidas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e que não teria se vacinado contra a Covid-19. Segundo a filha, o pai não acreditava no vírus e toda sua potencialidade letal.

“Não fazia isolamento, não usava máscara, não cumpria nenhuma medida sanitária de segurança. Realmente era um fiel negacionista que falava que a pandemia não existia, que o vírus não existia e que ninguém morria de Covid-19. Mas é claro que os meus parentes e amigos próximos a ele vão negar. Inclusive já apareceu o médico da família Carvalho que eu conheço muito bem desde os anos 1980, declarando que ele não morreu de Covid e citando boletins médicos do hospital americano, só que não mostra. A pessoa não precisa mentir, mas ela pode omitir informações”, declara.

Dentre as memórias e sequelas que remetem ao negacionismo do pai, Heloísa revela não ter sido vacinada contra o sarampo quando criança e por consequência apresenta um grau leve de surdez e relembra que tanto ela quanto os irmãos sofreram como vítimas da doença.

“Meu pai não vacinou a gente contra o sarampo, eu adquiri sarampo junto com meus irmãos. Por conta das complicações do sarampo fiquei com sequela auditiva. É sutil, mas fiquei. Dois irmãos meus também quase morreram e foram até desenganado pelos médicos, mas conseguiram se salvar. Então assim, o negacionismo do Olavo não é de hoje e é complicado porque ele pôs a vida de crianças em risco como ele fez na pandemia com todo discurso antiálcool, antimáscara e anti-isolamento”, pontua Heloísa.

Publicação no Twitter de Olavo de Carvalho (Reprodução/Twitter)

Governo Bolsonaro

Embora tenha feito recentes críticas ao Governo de Jair Bolsonaro, o ‘ícone’ dos conservadores era conhecido por ser próximo da família do presidente. De acordo com Heloísa de Carvalho, a ligação entre o pai era, de fato, com os filhos de Bolsonaro, Flávio e Eduardo — este último, um fiel escudeiro do Olavo. Ela destaca que até mesmo as críticas e um aparente rompimento entre Olavo e a família Bolsonaro não passava de ‘estratégia’.

“O que eu sei é que ele nunca foi realmente próximo de Bolsonaro, o elo eram os filhos. O Flávio levou uma encomenda para ele nos EUA, creio que em 2012, e o Eduardo era um fiel “olavete” [como são conhecidos os seguidores de Olavo]. Faz pouco tempo que Olavo estava falando mal e atacando Bolsonaro e Eduardo falando bem dele nas redes sociais. Então para quem acha que houve um rompimento, não houve e tudo isso é modos operantes. O Olavo usava a tática do ‘morde e assopra’, toda vez que fazia isso, ele sumia, algo acontecia ali, o que eu não sei, mas obviamente imagino”, revela sem dizer exatamente do que suspeita.

Lado oposto

Durante a entrevista, Heloísa faz questão de destacar que, ao contrário do pai, acredita na eficiência da ciência e sempre bateu de frente com os posicionamentos do pai declaradamente negacionista. A bacharel em Direito relembra ter sido uma das pessoas que mais buscava ofertar um contraponto em relação às declarações do pai, principalmente, quando o assunto era Covid-19.

“Nunca fui “olavete” e fã do meu pai. Não fui propagadora dele e podem visitar minhas redes sociais, os poucos elogios que fiz a ele são de 2007, 2010. Tenho algumas poucas fotos dele e, um pouco antes de romper com ele, vi algumas coisas sobre o filme dele, mas nada relevante. Nunca fui afinada com as pautas dele, quando divergíamos dos assuntos ele virava as costas me deixava falando sozinha porque não queria me ouvir”, relembra.

Revolta e apelo

Na contramão do que foi pregado pelo pai em vida, Heloísa faz um apelo para aqueles que ainda resistem à vacina se conscientizem, tomem o imunizante e obedeçam às orientações já conhecidas para evitar contaminações. Em isolamento social, ela lamenta ter perdido a melhor amiga no mesmo dia em que o pai declarou que não havia morte por Covid-19 no País.

“Perdi uma grande amiga porque os patrões não a liberaram do trabalho para se isolar e tinha que pegar condução todos os dias se expondo ao vírus. Ela já era viúva e morreu deixando três filhos crianças com menos de dez anos de idade órfãos. Minha melhor amiga partiu justo no dia em que Olavo disse que não existia morte por causa de Covid”, disse a filha de Olavo.

Ela acrescentou que no dia da morte da amiga, ela se revoltou com o pai. “Eu perdia uma grande e querida pessoa, amiga trabalhadora, pobre que deixava filhos órfãos e ele falando aquilo e várias outras coisas e postagens que ele fez durante essa pandemia que me deixava triste e com muita raiva. Não paguem para ver, se cuidem”, alertou Heloísa.

(*) Colaborou Rômulo D’Castro, correspondente da REVISTA CENARIUM no Pará