‘Idosa morta em campo de concentração’; fake news bolsonarista recebe condenação de entidade judaica e de cientista social

A imagem da idosa traz, ainda, uma foice e um martelo, símbolo do comunismo, e a expressão 'campo de concentração', marca indissociável do terror nazista (Reprodução/Internet)

11 de janeiro de 2023

09:01

Mencius Melo – Da Agência Amazônia

MANAUS – Redes bolsonaristas apelam e criam fake news de “idosa morta em campo de concentração do Lula”. A família da idosa repudiou, veementemente, o uso de imagem e o presidente do Comitê Israelita do Amazonas (Ciam), David Vidal, condenou o uso da expressão “campo de concentração”, que segundo ele está sendo usada de forma “completamente equivocada” ao se referir à Academia Nacional de Polícia (ANP), local onde estão presos os terroristas que destruíram as sedes dos três Poderes, em Brasília, no domingo, 8.

Terroristas presos no ginásio desportivo da Academia Nacional de Polícia (ANP), em Brasília, após o quebra-quebra do domingo, 8 de janeiro (Reprodução/Redes Sociais)

Em entrevista à AGÊNCIA AMAZÔNIA, David Vidal avaliou com preocupação o contexto, após atos terroristas em Brasília. “Os acontecimentos dos últimos dias, mais uma vez, trouxeram consigo o uso inadequado de palavras relacionadas ao ‘Shoá’ (holocausto), o uso de expressões como ‘genocida’, ‘genocídio’, ‘campos de concentração’ e ‘holocausto’, de forma indiscriminada, assusta. Vejo com preocupação o uso inadequado dessas expressões, tanto por adeptos do espectro político, à esquerda, quanto da direita, não se deveria banalizá-las desta forma”, criticou.

O presidente da entidade judaica cobrou bom senso: “Pessoas detidas não estão em campos de concentração, e um adversário político não é um genocida só porque não se gosta dele. Não se pode comparar o incomparável. É um desrespeito à memória dos que morreram em campos projetados e construídos por genocidas para matar, para onde um judeu era levado por ser ‘inferior’ e onde máquinas e processos industriais foram elaborados para extinguir, sistematicamente, nosso povo”, condenou.

Falsa informação

É a segunda vez que Deolinda Tempesta Ferracini tem sua imagem usada para produzir falsa informação. Deolinda morreu aos 80 anos, em 10 de outubro de 2022, vitimada por complicações resultantes de um Acidente Vascular Cerebral (AVC). “Já lutamos uma vez contra isso, que colocaram a foto da minha avó em um totem, em São Paulo, falando que ela foi morta vítima de Covid-19 e, agora, de novo, em uma fake news porca, nojenta! Hoje, faz 3 meses que ela morreu e isso é muito triste!”, desabafou a neta Juliana Cuchi em uma rede social.

Prisioneiros judeus chegando a um campo de concentração nazista. Frio, fome, doenças e execuções marcavam o dia a dia no confinamento (Reprodução/GenovaToday)

Juliana continuou as críticas chamando atenção para o conteúdo fantasioso criado em torno da imagem de Deolinda Tempesta. “Estão pegando a foto da minha avó e fazendo fake news, falando que ela morreu em um campo de concentração, coisas de política. Por favor, se vocês virem, apenas denunciem! Estou muito chateada, muito mesmo. O banco de imagens da foto da minha avó não dá direito ao uso indevido”, desabafou.

Deturpação provocada

Para o cientista social Alvatir Carolino, o uso da expressão “campo de concentração” é mais uma deturpação provocada pelo bolsonarismo. “É mais um erro equivocado de conceito e terminologia. Cabe notar que ‘campo de concentração’ é lugar de confinamento de subjugados, de pessoas que sofreram reclusão em função de seu pensamento, etnia, religião e que, principalmente, não passaram por um processo legal. Essas pessoas, em Brasília, estão sendo ouvidas por autoridades, estão sendo notificadas e acompanhadas por advogados”, observou.

O cientista continuou as comparações: “Estão todos dentro do processo legal, muito diferente de um campo de concentração. É uma distinção muito grande do que foi um campo de concentração na Alemanha. Nesses espaços, não havia qualquer resquício do direito legal e humano. Homens e mulheres eram escravizados, com um destino final que era a morte. Nada disso está acontecendo em Brasília. Estão tentando desvirtuar acontecimentos e conceitos para produzir desinformação. É mais uma mentira”, finalizou.