Pesquisadores encontram traços de antibiótico em rio e córregos de Boa Vista

Rio Branco, o principal rio de Roraima, é o responsável por abastecer a cidade de Boa Vista (Sales Neto/Reprodução)

08 de agosto de 2023

21:08

Winicyus Gonçalves – Da Agência Amazônia

BOA VISTA (RR) – Cientistas das Universidades Federal de Roraima (UFRR) e do Rio Grande do Sul (UFRGS) identificaram traços de amoxicilina no Rio Branco, e dois igarapés, Grande e Mirandinha, que abastecem Boa Vista. Os resultados do estudo apontaram ainda bactérias multirresistentes a antibióticos em amostras coletadas em pontos de captação hídrica na cidade.

As coletas das amostras foram realizadas em setembro de 2022, durante o período chuvoso em Roraima, e em dezembro de 2022, durante o período de estiagem.

Segundo o resultado do estudo, os pesquisadores alertam para evitar ameaças a saúde ambiental. O Rio Branco, por exemplo, é o principal do Estado e responsável, diretamente, por abastecer Boa Vista.

De acordo com o pesquisador Leovergildo Rodrigues Farias, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Recursos Naturais da UFRR, traços do antibiótico foram encontrados nos cursos d’água devido ao aumento no uso de antibióticos durante a pandemia de Covid-19. “Pelo alto uso de antibióticos na pandemia, a amoxicilina e outros medicamentos são preocupantes, porque fazem proliferar bactérias multirresistentes nos mananciais que abastecem Boa Vista”, avalia.

Leovergildo Rodrigues Farias, pesquisador vinculado ao PPG em Recursos Naturais da UFRR, conduziu os trabalhos em Roraima (Naiara Demarco/CGGCOM/Capes)

O coordenador do projeto e pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da UFRR, Marcos Vital, afirma que a presença de antibióticos nas águas de rios e córregos em Boa Vista são um risco para a saúde pública. “Já existe um impacto. A água está afetada, contaminada, por essas substâncias. O Rio Branco abastece a capital, que tem 2/3 da população do Estado. Se não houver um projeto em saúde pública que promova a conscientização e a limpeza dos rios, a população vai estar vulnerável a esse tipo de contaminação”, pontua.

O objetivo é que os resultados, parcialmente divulgados em artigo publicado na Revista Ibero-Americana de Ciências Ambientais, possam levar à formulação de políticas públicas que limitem, por lei, as quantidades desses contaminantes que podem ser encontradas nos mananciais.

Cafeína

O estudo ainda encontrou grandes quantidades de cafeína em amostras dos três cursos d’água analisados. Leovergildo Farias explica que o café é uma das bebidas mais consumidas do mundo. Assim, a cafeína é um bom indicativo de poluição da água.

“A cafeína é um indicador de contaminação por esgotos domésticos, porque é a segunda bebida mais consumida no mundo. Se há presença nos mananciais é porque há ocorrência de esgoto, e nós encontramos quantidades de 170 a 200 microgramas por litro, que são altas”, complementa o pesquisador da UFRR.

O pesquisador ainda sugere mais estudos sobre o tema para reforçar a necessidade da criação de políticas públicas que possam monitorar com mais clareza a qualidade da água que é ofertada à população. “Contaminantes emergentes, como a cafeína e a amoxicilina, são um problema global por não serem legislados. E no Brasil é incipiente esse tipo de estudo”, conclui Leovergildo.

Garimpo

As amostras com amoxicilina e cafeína reforçam dúvidas sobre a qualidade da água dos rios de Roraima. Um estudo divulgado em agosto de 2022 indicou que peixes de três rios estavam altamente contaminados por mercúrio no Estado. A pesquisa, feita pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), Instituto Socioambiental (ISA), Instituto Evandro Chagas e a Universidade Federal de Roraima (UFRR) revelou que há espécies de peixes com teor do minério acima da recomendada para consumo humano.

A análise coletou amostras de 75 peixes, de 20 espécies diferentes e quatro níveis tróficos (herbívoro, onívoro, detritívoro e carnívoro) e levou como base a avaliação de risco à saúde, conforme metodologia proposta pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Os pescados foram analisados entre os dias 27 de fevereiro e 6 de março de 2021, e as amostras revelaram índices altos de contaminação em trecho do Rio Branco, na cidade de Boa Vista (25,5%), baixo Rio Branco (45%), Rio Mucajaí (53%) e Rio Uraricoera (57%).

AGÊNCIA AMAZÔNIA questionou a Companhia de Águas e Esgotos de Roraima (Caer), responsável pelo abastecimento hídrico do Estado, sobre as ações feitas para o tratamento e distribuição da água no Estado, mas não houve retorno até o fechamento da matéria.