Por crime de racismo, MPF na Paraíba pede prisão do apresentador Sikêra Jr.

Sikêra Jr., mais uma vez, entra em conflito com a Justiça por falas em que promovem o crime de racismo (Reprodução/Metrópoles)

02 de fevereiro de 2023

20:02

Mencius Melo – Da Agência Amazônia

MANAUS – O apresentador do programa “Alerta Nacional”, da RedeTV!, Sikêra Jr., teve pedido de prisão e pagamento de multa, feito pelo Ministério Público Federal (MPF) na Paraíba, por crime de racismo cometido no dia 5 de junho de 2018, durante a transmissão do programa “Cidade em Ação”, na TV Arapuã, afiliada à emissora RedeTV! no Estado. O MPF entrou com ação penal na segunda-feira, 30, e a 16ª Vara Federal na Paraíba julgará a ação, que não prevê acordo com o apresentador.

Atualmente, Sikêra Jr. apresenta o programa “Alerta Nacional”, produzido em Manaus (AM) e exibido em rede nacional. A ação penal contra o apresentador foi amplamente noticiada em sites como G1 da ParaíbaCarta Capital, dentre outros. De acordo com o coletivo Intervozes, Sikêra Jr. é acusado de proferir falas racistas e misóginas contra uma jovem negra custodiada pelo Estado da Paraíba.

Na ocasião, Sikêra infringiu a Lei 7.716/89 que prevê crime de racismo tipificado no artigo 20. Considerou, ainda, o órgão, que o apresentador extrapolou todos os limites da liberdade de expressão, “pois, praticou discriminação e preconceito racial de gênero por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza, cuja pena é de reclusão de dois a cinco anos e multa”, declarou o MPF.

No perfil da rede social Instagram, o próprio apresentador postou uma foto, printada, sobre o pedido de prisão e multa, mas não chegou a discorrer sobre o assunto.

Post feito por Siqueira Jr. no Instagram (Reprodução/Instagram)

Sensacionalismo

Para o cientista político Paulo Queiroz, programas como o de Sikêra Jr. repetem uma velha fórmula usada na TV. “Antes de falarmos de liberdade de expressão ou ausência dela, temos que entender que programas policialescos não se preocupam com leis ou conteúdos. Eles procuram mesmo é a velha fórmula do sensacionalismo, ou seja: a busca incessante por audiência, e isso está na raiz da TV e não mudou porque, agora, estamos na era do ‘like“, observou.

Segundo Queiroz, para esse tipo de produção pouco importa princípios éticos ou coisa parecida, o que vale é o maior número de espectadores. “Todos esse programas são iguais. É muita fala e pouca apuração jornalística. Eles trabalham pela espetacularização da miséria para vender e pouco importa o conteúdo”, detalhou.

Mas, isso não significa falta de limites, como ressalta o cientista. “Esses programas sempre vão existir, mas, o que pode existir também é a regulamentação televisiva e, quando falo isso, não falo de censura, porque em tudo existe limites e, até mesmo, direitos fundamentais não são absolutos“, explicou.

Dados

O titular do Ministério dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, terá que atuar para desconstruir o racismo que, hoje, ocupa grande parte da produção radiofônica e televisiva, no Brasil (Reprodução/Valdir de Oliveira)

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De acordo com um levantamento do coletivo Intervozes, da ONG Artigo 19 e da organização da sociedade civil Andi – Comunicação e Direitos, em parceria com o MPF, a radiodifusão no Brasil é terreno fértil para as violações de direitos humanos. As entidades monitoraram, detalhadamente, 28 programas de rádio e TV durante 30 dias. O resultado chegou a assustadoras 4.500 violações de direitos humanos que infringiram, diretamente, 12 leis do Brasil e mais sete tratados multilaterais.

São variadas as infrações e violações às leis brasileiras apontadas pelo estudo. Nelas estão o desrespeito à presunção de inocência; incitação ao crime, à violência, à desobediência às leis ou às decisões judiciárias; exposição indevida de pessoas e famílias; discurso de ódio e preconceito; identificação de adolescentes em conflito com a lei; violação do direito ao silêncio; tortura psicológica e tratamento desumano ou degradante.

As abordagens policiais e as truculências das forças de segurança são quase sempre exploradas como exemplo de ‘política pública’ em programas como o de Sikêra Jr. (Reprodução/Jdia)

Plataforma

Além de produzirem volume de desinformação e atacar leis vigentes no País, vários apresentadores, repórteres e comentaristas aproveitam para fazer dos programas, plataforma de candidaturas políticas. Conforme o estudo do Intervozes, em 2018, os programas considerados policialescos tiveram 23 candidaturas em 10 Estados. Já em 2022, o número quase que dobrou. Foram 43 candidaturas de programas policiais ou que se beneficiaram deles para se eleger. A maioria dos candidatos são homens que fazem dos programas palanques de campanha.

No contexto de propostas ou ausência delas, os discursos seguem a receita do populismo, com defesa de agendas assistencialistas. Além do assistencialismo, os programas e seus candidatos defendem a política de morte na segurança pública, seguindo o mantra que diz que: “bandido bom é bandido morto”. Além da violência discursiva, há espaço para o conservadorismo religioso na defesa de pautas morais e a negação da própria política enquanto instrumento de diálogo democrático.