Povo Kanamary recorre à ministra Rosa Weber para conter violência no Vale do Javari

O povo Kanamary é um dos povos que habita o Vale do Javari, área cobiçada pelo crime ambiental, tráfico de drogas, garimpo e pesca ilegal (Reprodução/Cimi)

26 de abril de 2023

21:04

Mencius Melo – Da Agência Amazônia

MANAUS – Após um ano do assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, no Vale do Javari, em Atalaia do Norte (distante 1.136 quilômetros de Manaus), no Estado do Amazonas, a situação pouco se alterou para os povos que ali habitam. Com a invasão na aldeia Irari 2, ocorrida no domingo, 16, por homens armados de fuzis, a advogada Inory Kanamary, presidente da Comissão de Amparo e Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/AM), ingressou com denúncia no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), cuja presidente é a ministra Rosa Weber do Supremo Tribunal Federal (STF).

A advogada indígena Inory Kanamary, da OAB-AM, é uma das vozes em defesa dos povos originários no Amazonas (Reprodução/Arquivo Pessoal)

O documento foi apresentado à Unidade de Monitoramento e Fiscalização de Decisões e Deliberações da Corte Interamericana de Direitos Humanos (UMF/CNJ), braço do CNJ, e à própria ministra Rosa Weber. A magistrada esteve no mês de março em Tabatinga (distante 1.107 quilômetros de Manaus) e lá reuniu-se com lideranças da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja). Durante a visita, a ministra vivenciou os dilemas e a realidade dos habitantes do extremo norte do Estado do Amazonas. Além de acompanhar de perto a situação dos povos do Javari, Rosa Weber travou contato com a cultura Kanamary.

Por conta da atuação de Rosa Weber, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) se posicionou: “emitiu, em 27 de outubro de 2022, a Resolução N° 59/2022, ampliando medidas cautelares em favor dos membros da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) e obrigando o Estado brasileiro a adotar medidas necessárias e eficazes para proteger a vida e a integridade pessoal das comunidades indígenas no Vale do Javari, em especial, de suas lideranças e dos defensores de direitos humanos que atuam na área, com vistas à garantia de não repetição do crime que vitimou Bruno Araújo Pereira e Dom Phillips”, declarou o texto.

Ministra do STF, Rosa Weber solicitou ao Ministério da Justiça providências que garantam segurança no Vale do Javari (Carlos Moura/STF)

Ao ministro

Assim que informada do novo ataque aos Kanamary, a ministra Rosa Weber enviou documento ao ministro da Justiça, Flávio Dino. “Chegou ao conhecimento deste Conselho Nacional de Justiça denúncia
a respeito da invasão de aldeia do povo indígena Kanamary, por grupo criminoso fortemente armado com fuzis que ameaçou de morte liderança da respectiva comunidade, conforme consta da referida notícia, de acordo com o Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (OPI)”
, diz o início do documento. “Os criminosos chegaram ao local a bordo de um bote de alumínio e se comunicavam em espanhol”.

A notícia dá conta, ainda, de que agentes da Polícia Federal se deslocaram ao local após a denúncia, guiados por indígenas; e que em outubro de 2022 já houve ameaças de morte contra uma liderança Kanamary, por parte de pescadores ilegais, na mesma região em que o indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips foram vítimas de homicídio em junho do ano passado.

Ao final, a ministra Rosa Weber faz um pedido ao ministro Flávio Dino: “À luz de todo o exposto, requer-se ao Ministério da Justiça e Segurança Pública que envie todos os esforços para adotar providências imediatas a fim de apurar os fatos denunciados e garantir a segurança das comunidades indígenas da região, em especial, do povo indígena Kanamary, cuja aldeia foi, violentamente, invadida, nesta semana em que também se celebra, historicamente, pela primeira vez, o Dia Nacional dos Povos Indígenas”, finalizou.

O Vale do Javari, há anos, possui um histórico de violência aos povos indígenas que habitam a região (Adam Mol/Funai)

Novo ataque

No domingo, 16, quatro homens encapuzados invadiram a aldeia Irari 2, localizada no noroeste da Terra Indígena, próximo à fronteira com o Peru, buscando “acertar as contas” com o cacique Valdemar Kanamary. Conforme o Boletim de Ocorrência (B.O) registrado no 50° Distrito Integrado de Polícia (DIP), os homens chegaram em um bote de alumínio com motor 13 HP, por volta das 16h de domingo. Armados com fuzis, os homens falavam em espanhol que estavam em busca do cacique. Segundo a denúncia feita por uma liderança que estava no local, no momento do ocorrido, os homens estavam “pedindo a cabeça” do cacique.

Ao serem informados que o cacique não estava na aldeia, naquele momento, os autores das ameaças saíram do local. A denúncia foi enviada à AGÊNCIA AMAZÔNIA por uma liderança indígena que prefere não ser identificada, com medo de se tornar um dos alvos. Segundo ele, a tensão na região não diminuiu, apesar da presença de agentes federais.

Leia o documento na íntegra: