Territórios Kayapó, Munduruku e Yanomami são os mais impactados pelo garimpo

Impacto do garimpo no Rio Couto Magalhães, na Terra Indígena Yanomami (Christian Braga/Greenpeace)

22 de abril de 2024

08:04

Filipe Távora — Da Agência Cenarium

MANAUS (AM) — Os territórios dos povos Kayapó, Munduruku e Yanomami são os mais impactados pelo garimpo ilegal na Amazônia, com 13,79 mil hectares, 5,46 mil hectares e 3,27 mil hectares, respectivamente, segundo levantamento realizado pelo MapBiomas. Os dois primeiros territórios ficam localizados no Pará. Já a Terra Indígena Yanomami abrange parte dos Estados do Amazonas e Roraima.

O estudo apontou que 10% de toda área a garimpada na região está concentrada dentro de terras indígenas, correspondendo a aproximadamente 25,1 mil hectares, sendo que 77% das áreas de garimpo na Amazônia estão a cerca de 500 metros de rios, lagos e igarapés.

Garimpo ilegal no Pará (Reprodução/Polícia Federal)

Esse é um dos dados que explica a alta contaminação dos cursos d’água e as consequentes mazelas sanitárias causadas na saúde daqueles que dependem deles para sobreviver. A Amazônia concentrava, em 2022, 92% de toda área de garimpo do Brasil, com 241 mil hectares explorados.

O coordenador técnico do mapeamento de mineração no MapBiomas Cesar Diniz afirmou, publicamente, que a proximidade do garimpo aos cursos d’água constitui o DNA da atividade de extração garimpeira na Amazônia, especialmente do ouro, que está quase sempre atrelado aos rios e seus depósitos aluvionares.

Segundo ele, as terras indígenas são as áreas mais preservadas da Amazônia. Ainda assim, no interior delas, a concentração de garimpos próximo aos cursos d’água é preocupante, porque populações indígenas e ribeirinhas usam quase que exclusivamente dos rios e lagos para sua subsistência alimentar

Do jeito que a gente tem o garimpo hoje na Amazônia, ele é ilegal, está em franca expansão, faz uso de substâncias proibidas, é danoso ao meio ambiente, é danoso ao garimpeiro, é danoso aos ribeirinhos e aos índios e aumenta a mortalidade infantil. Está tudo errado”, ressaltou.

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Organização?

Advogada e mestre em direito ambiental Penélope Antony, explica que existem dois tipos de garimpo: aquele que é feito em terra firme ou em água. Em terra firme, o garimpo movimenta o solo por meio de maquinários, porque os garimpeiros buscam metais e gemas preciosos, como ouro e diamante. Usa-se mercúrio tanto na água quanto no solo. Esses fatores tornam o garimpo uma atividade de grande impacto ambiental.

As áreas não são recuperáveis. A maior parte do garimpo é ilegal. Quando o garimpeiro vai à área, ele não se preocupa com a compensação ambiental”, alerta advogada.

Balsas de garimpo no município de Autazes, no Amazonas (25.nov.21 – Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)

Ainda segundo a especialista, o garimpo em água utiliza dragas que alcançam o leito de rios. O material retirado de lá é processado em máquinas. O principal problema desse tipo de garimpo é a utilização de mercúrio.

Uma gota de mercúrio é altamente poluidora. Ele é extremamente nocivo à cadeia alimentar como um todo. Eu insiro nessa cadeia o ser humano. O mercúrio é extremamente danoso ao nosso organismo. Causa câncer e uma série de problemas”, afirmou.

Garimpeiro usa mercúrio em garimpo no Rio Madeira (27.nov.21- Ricardo Oliveira/Revista Cenarium)
Impactos

A professora e doutora em Direito Ambiental Carla Torquato analisa que os problemas que o garimpo provoca podem ser divididos em quatro pontos: impactos ambientais, impactos sociais, contaminação por mercúrio e falta de legalização.

Segundo ela, o garimpo é realizado, majoritariamente, em terras indígenas ou unidades de conservação. Multas e infrações são imputados a “laranjas”, termo usado para descrever uma pessoa ou entidade que serve como uma fachada para ocultar atividades financeiras ilícitas. Assim como Penélope Antony, Torquato também considera que a contaminação das águas é o impacto mais negativo.

O ponto mais negativo do garimpo na região amazônica é, certamente, a contaminação por mercúrio. A contaminação, muitas vezes, acaba sendo invisível. Ela não contamina somente terras indígenas, mas todas as nascentes ao redor, o que atinge a todos”, analisa.

Áreas de garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami vistas em sobrevoo ao longo do Rio Mucajaí (Fernando Frazão/Agência Brasil)
Sobrevivência

Apesar dos efeitos negativos ao meio ambiente, Penélope Antony considera que a falta de qualidade de vida que alguns moradores do interior do Amazonas vivem os aproxima do garimpo, que se torna para eles uma forma de sobrevivência.

Não estou falando dos donos de garimpo, logicamente. Eles, muitas vezes, cometem crimes e até deveriam ser presos. Mas, defendo o trabalhador garimpeiro, que não tem qualidade de vida e sequer sabe dos danos que aquela atividade vai causar ao meio ambiente”, afirmou.