Incêndios ’empurram’ Amazônia a ponto crítico e irreversível de devastação, diz estudo americano

Os postulantes aos cargos de prefeito e vice foram autuados por danos ambientais (Ricardo Oliveira/ Revista Cenarium)

05 de outubro de 2020

15:10

Michelle Portela – Da Revista Cenarium

BRASÍLIA – O crescimento dos focos de calor na Amazônia está levando a região a um ecocídio contemporâneo. Se continuar nessa velocidade de devastação de áreas naturais, a região amazônica deixará de ser um área de floresta tropical e passará a ser substituída por savana ainda durante a nossa vida, diz um estudo publicado em setembro nos Anais do Jardim Botânico de Missouri.

A questão apontada pelo pesquisador Mark Bush, professor de Biologia da Florida Tech, é que o ponto irreversível para virar uma savana, uma pastagem com poucas árvores, está chegando mais perto e caminhamos para ele acelerando como nunca nos últimos 100 mil anos. É o que se chama de efeitos do Antropoceno, ou a “Época dos Humanos”, termo cunhado pelo Prêmio Nobel de Química de 1995.

O pesquisador usou pólen fóssil e carvão recuperado em sedimentos de lagos encobertos pela floresta que datam de milhares de ano para rastrear as mudanças climáticas na região. Na publicação, Bush destaca que os incêndios eram quase desconhecidos na Amazônia – uma área de grande umidade – antes da chegada dos humanos, que, nos últimos 10 mil anos, esses incêndios não impactavam a um ponto de “não retorno” porque o ecossistema podia se recuperar desses eventos menores e que os efeitos do aquecimento do clima levam a uma escala maior de queimadas e de seca, ambos produtos da mudança climática provocada pela intensa ação do homem nas últimas décadas.

“A imensa biodiversidade da floresta tropical corre risco de incêndio”, disse Bush. “Novos e recorrentes pontos de inflexão: a interação do fogo, mudança climática e desmatamento nos ecossistemas neotropicais”, são os pontos apresentados pelo pesquisador como fatores de aceleração da savanização da Amazônia.

Os dados de Bush mostram que o ponto de inflexão provavelmente será alcançado se as temperaturas subirem mais 2 a 3 graus Fahrenheit, nesse ritmo, até o final deste século. “O aquecimento por si só pode induzir o ponto de inflexão em meados do século, mas se as políticas atuais que fazem vista grossa para a destruição da floresta não forem interrompidas, poderemos chegar ao ponto de inflexão muito mais cedo. E isso alteraria as chuvas em todo o hemisfério”, disse Bush.

A tese também foi defendida pelo ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Ricardo Galvão, durante entrevista à Tv Brasil 247, do site de notícias homônimo. De acordo com o cientista, “se a Amazônia, toda a Amazônia, não só a brasileira, for desmatada na ordem de 25% a 30%, o ponto de não retorno para ela se tornar uma savana vai ser alcançado. Estamos muito perto disso”.

E ressaltou a evolução da ação humana. “Até 1980 praticamente não tínhamos desmatado a Amazônia e de lá para cá desmatamos quase 20%. Então, estamos em uma situação muito próxima do ponto de não retorno”, alertou Galvão.