20 de abril de 2023
18:04
Michel Jorge – Da Agência Amazônia
BELÉM (PA) – As ameaças recebidas pela primeira deputada estadual a se declarar negra na história da Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa), Lívia Duarte (PSOL), e a vereadora de Belém Bia Caminha (PT), já estão sendo investigadas pelas autoridades da segurança pública do Estado do Pará e pela Polícia Federal (PF). As parlamentares receberam, no início desta semana, mensagens com ofensas racistas e ameaças de morte.
Trecho da ameaça direcionada à deputada Lívia diz: “você vai visitar Marielle Franco”, vereadora carioca assassinada em 2018. Já a ameaça enviada via e-mail à vereadora petista Bia Caminha afirma que a parlamentar será “eliminada em breve” e se encontrará com Marielle Franco, em uma evidente manifestação de ódio e violência política.
As ameaças denotam o inconformismo pela luta antirracista, feminista e anti-homofóbica empreendida pela deputada desde o mandato como vereadora de Belém – de 2020 a 2022. Em nota, a equipe de Lívia disse que “reivindicar direitos incomoda alguns, que, possivelmente, se sentem ameaçados, de alguma forma, com a perda de seus microespaços de dominação. Preferem que nós permaneçamos subservientes e invisibilizados. E, para impedir a nossa luta, a qualquer custo, alguns fogem ao campo da disputa política, abandonam o bom senso e optam pela criminalidade”.
Militância
A deputada estadual tem se posicionado duramente contra os atos criminosos e antidemocráticos registrados no dia 8 de janeiro deste ano, em Brasília (DF), quando foram invadidos e depredados o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e a sede do Supremo Tribunal Federal (STF). Ela também atua nas pautas e direitos ligados às minorias políticas, como mulheres, negros e negras e da população LGBTQIAP+ (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Queer, Intersexuais, Assexuais, sendo que o símbolo “+” acolhe as demais orientações sexuais).
Militante socialista, feminista e antirracista desde os 13 anos, Lívia foi a primeira presidente municipal negra do PSOL, no Brasil, e é fundadora do Setorial de Mulheres do Partido Socialismo e Liberdade. Também é autora do Projeto de Lei (PL) que proíbe homenagens a escravocratas e genocidas em Belém. A parlamentar também criou a Frente Parlamentar de Combate à Fome, que prevê uma série de ações parlamentares voltadas ao combate da insegurança alimentar da população belenense. Desde cedo, milita com o filho nos braços, e a experiência da profusão de tarefas e jornada extenuante acabou por esculpir seu perfil de ativista contra as múltiplas violências que atingem as mulheres, notadamente as negras, desde a mais tenra infância.
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Bia Caminha
A vereadora, que é vice-presidente estadual do PT-PA, foi eleita a vereadora mais jovem da história de Belém e mais votada do Norte do País, pelo PT, aos 21 anos, com atuação política em defesa da Amazônia, mulheres, negros e negras, juventudes e da população LGBTQIAP+. A movimentação combativa da parlamentar e militante a tornou alvo de grupos de extrema-direita que, ao longo de sua trajetória política, tentam interromper tudo que a vereadora representa.
Em nota, o Diretório Nacional do PT disse que “a violência política contra mulheres negras e LGBTQIAP+ tem sido arma dos grupos de extrema-direita por todo o Brasil, e que não aceitam que parlamentares como a vereadora Bia Caminha ocupem e existam na política. O Partido dos Trabalhadores (PT) se solidariza e comunica que já está tomando as medidas cabíveis para garantir a proteção da vereadora”.
Violência política
Pesquisa do Instituto Marielle Franco, divulgada em dezembro de 2020, entrevistou 142 mulheres negras, de 21 Estados, em todas as regiões do Brasil, e de 16 partidos. Do total, 80% das candidatas negras sofreram violência virtual, 60% sofreram violência moral ou psicológica e 50% sofreram violência institucional. Das entrevistadas, 18% receberam comentários e/ou mensagens racistas, ou sexistas, em suas redes sociais, por e-mail ou aplicativos de mensagens e 8% foram vítimas de ataques com conteúdo racista durante transmissões virtuais.
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Além disso, 60% das mulheres negras entrevistadas foram insultadas, ofendidas ou humilhadas em virtude de atividade política nas eleições. Em 45% dos casos de violência virtual e moral, a agressão foi feita por indivíduo ou grupo não identificado, o que dificulta denúncias e aumenta a impunidade nos casos desse tipo de agressão.
Dentre as entrevistadas que realizaram algum tipo de denúncia, 70% afirmaram que a denúncia não ajudou no esclarecimento do caso e nem trouxe mais segurança para o exercício da atividade político-partidária.
Marielle Franco
Marielle Franco, ex-vereadora no Rio de Janeiro, foi uma mulher negra, socióloga, com mestrado em Administração Pública. Eleita vereadora da Câmara do Rio de Janeiro, com 46.502 votos. Presidiu a Comissão da Mulher da Câmara. No dia 14 de março de 2018, foi assassinada em um atentado ao carro onde estava. Treze tiros atingiram o veículo, matando também o motorista Anderson Pedro Gomes. O que aconteceu depois é que Marielle tornou-se um dos mais importantes símbolos da luta popular no Brasil.
Nas últimas semanas, em um movimento articulado, houve um aumento na disseminação de mensagens de ódio em todo o País. O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ministro do STF, Alexandre de Moraes, afirmou na terça-feira, 18, que o modus operandi dessas mensagens é idêntico ao de 8 de janeiro.