Preconceito religioso: mulher acusa Lacta de satanismo por vender doce chamado ‘Feitiçaria’

Consumidores estariam jogando o produto fora por medo da "maldição".(Reprodução/Internet)

31 de março de 2021

21:03

Priscilla Peixoto

MANAUS – Uma mulher acusa a marca de bombons Lacta de praticar satanismo, apenas por comercializar um doce chamado “Feitiçaria”. Em um viral que circula nas redes sociais ao longo da semana, a mulher faz uso de palavras de ordem, carregadas de preconceito religioso para incentivar outros consumidores a descartar o produto.

A mulher que se diz religiosa, alega que o produto traz mensagem de magia negra e “maldições” para as pessoas e principalmente para as crianças que consumirem o bombom. “Não faz sentido ter um bombom com esse nome para crianças. É golpe baixo, não façam isso. Mensagens malignas de feitiçaria, de macumba, de magia negra. As forças do mal são poderosas”, diz a internauta em tom de repreensão.

O bombom é uma releitura de um dos clássicos que a caixa de chocolate da Lacta continha, chamado “Feitiço”. E faz parte da linha Lacta de Páscoa. Em comentários ao vídeo postado, outros internautas ironizaram o assunto em alta nas redes sociais. “Pode jogar no lixo aqui de casa” e “Gente, pensei que a época da inquisição tinha acabado”, foram alguns comentários sobre o vídeo.

O bombom tem sido alvo de polêmicas na internet (Reprodução/Internet)

Ignorância

Para Xɛ́byosɔnɔ̀n e Sacerdote da Sacralidade de Matriz Africana, Pai Alberto Jorge Silva, a atitude da mulher durante o vídeo é um recorte da sociedade, que por muitos anos cria rótulos de preconceito religioso, incluindo produtos de consumo. “Tudo o que não é considerado hebraico cristão é demonizado pela sociedade. O que tem haver ou remeta ao candomblé, umbanda, tambor de minas, em suma, tudo aquilo que não é neopentecostal é considerado ‘coisa do diabo'”, comenta.

Pai Alberto afirma ainda que muitas pessoas procuram utilizar artifícios para propagar falsas afirmações. “Este caso lembra, por exemplo, a distribuição de bombons que ocorre todos anos na celebração de São Cosme e Damião, onde os neopentecostais afirmam que as guloseimas são enfeitiçadas e impróprias para o consumo e pedem para as crianças trocarem os doces recebidos pelos bombons ungidos pela igreja evangélica. Então, este episódio que está viralizando na internet não é diferente do que já vem acontecendo desde sempre”, relembrou o sacerdote.

O doce seria uma releitura do bombom clássico dos anos 90 (Reprodução/Internet)

Casos parecidos

O recorte de intolerância e preconceito refletidos no consumo de produtos disponíveis no mercado já levou outras marcas também conhecidas pelo público para o centro da polêmica da teoria da conspiração. Refrigerantes como Coca-Cola, o popular macarrão instantâneo da marca Miojo e até produtos infantis como os cards do desenho Yu-gi-oh, febre entre as crianças na década de noventa, também já tiveram seus nomes e campanhas de marketing associados a forças obscuras.

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As práticas se repetem

Mesmo com tantos séculos após a idade média, as práticas, os medos, temores e preconceitos das pessoas ainda são praticamente os mesmos. A exploração da ignorância do povo e a briga maniqueísta entre o bem contra o mal abre espaço para a demonização seja em um simples bombom a coisas maiores.

“A sensação que tenho é que estamos voltando aos tempos de treva na forma de se relacionar e se entender como uma sociedade humana em nome da ignorância  e de mercantilistas e oportunistas da fé que usam a fé para proferir esse tipo de coisa”, finaliza Pai Alberto.

Assista ao vídeo

(Reprodução/Twitter)

Edição: Carolina Givoni